Uma ala defende elevar ataques, e outra crê que isso piora situação
Nos últimos anos, ex-presidente sempre deu a palavra final e agiu para unificar o partido
Com o ex-presidente Lula preso, o PT está rachado sobre que estratégia adotar em relação ao Supremo Tribunal Federal e que rumo tomar na eleição deste ano. Uma ala defende aumentar os ataques ao Judiciário, enquanto outra acredita que isso não vai melhorar a situação do ex-presidente. A sigla também não está unida em torno de quem pode substituir Lula na disputa pela Presidência neste ano nem em relação a possíveis alianças eleitorais.
Um dia depois da prisão PT racha sobre próximos passos
Na ausência de Lula, líderes divergem sobre quais estratégias jurídicas e políticas o partido deve seguir
Sérgio Roxo | O Globo
-SÃO PAULO- A prisão do ex-presidente Lula expôs as divisões internas do PT sobre as estratégias que o partido deve adotar a partir de agora com relação ao Judiciário e às eleições de outubro. Nos últimos anos, o ex-presidente se consolidou como única liderança capaz de mediar as diferenças de posições entre as correntes internas e, assim, sempre manteve a legenda unida. Agora, alas que discordam terão que decidir, sem um árbitro, quais serão as suas diretrizes nos próximos meses.
O primeiro tema que terá que ser resolvido é o tom a ser adotado em relação ao Supremo Tribunal Federal. Uma ala, que tem como expoentes a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), e o senador Lindbergh Farias (RJ), é favorável a elevar os ataques para que sejam colocadas em julgamento as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) sobre o cumprimento de pena dos réus condenados em segunda instância. Se o entendimento de 2016 for revisto em algum momento pelo Supremo, Lula poderia ser solto.
Outro grupo, em que estão parlamentares como o senador Jorge Vianna (AC) e o deputado Vicente Cândido (SP), aponta que a postura de ataques à Corte trará ainda mais prejuízos para Lula. Ministros do STF têm afirmado que julgam casos conforme o seu entendimento e que não serão influenciados por manifestações políticas.
PLANO B EM DEBATE
Ao discursar no acampamento montado pelos Movimento dos Sem Terra (MST) ao lado do prédio da PF, onde Lula está preso, ontem, Gleisi deu mostras da sua posição ao se dirigir à ministra Rosa Weber. Em 2016, Rosa foi voto vencido ao se posicionar a favor de esperar o fim dos recursos para iniciar o cumprimento da pena, mas desde então tem seguido o entendimento da maioria do Supremo e votado a favor da prisão após a decisão da segunda instância. No julgamento do habeas corpus de Lula, quarta-feira, ela negou o pedido do ex-presidente:
— Espero que o STF cumpra o seu papel, a ministra Rosa Weber cumpra com a palavra e o STF bote pra votar a questão da decisão da condenação em segunda instância — disse a senadora. A esperança do PT é que, na análise do caso teórico, o Supremo reveja sua posição, com um voto de Rosa, e Lula possa ser solto. A ministra, no entanto, já deu mostras de estar incomodada com a mudança constante de posição da Corte, o que causaria insegurança jurídica e prejudicaria a imagem da Justiça. Seu voto, em um eventual reexame da questão no STF, é tido como incerto.
A questão de como o PT se portará na eleição presidencial também gera discordância. O governador da Bahia, Rui Costa, e o presidente do PT do Rio, Washington Quaquá, já defenderam que o partido discuta um substituto para Lula. Gleisi, porém, mantém o discurso de que o candidato será o ex-presidente, mesmo preso em Curitiba.
Desde que deixou a Presidência da República, em 2011, Lula exerce uma influência direta nas discussões internas do PT. Essa participação aumentou ainda mais, a partir da metade do ano passado, quando Gleisi assumiu a presidência do partido.
A ideia do próprio Lula é manter interlocução com lideranças do partido durante as visitas na cadeia. Há dúvidas, porém, sobre como e a partir de quando as visitas serão permitidas. Um dos nomes escalados para fazer essa interlocução com o mundo político é o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que pretende ir a Curitiba uma vez por semana.
Haddad se consolidou nos últimos dias como plano B do PT para a disputa presidencial deste ano, apesar de ainda enfrentar resistência em setores do partido. O ex-prefeito foi um dos aliados mais presentes ao lado de Lula nos dois dias em que o ex-presidente se entrincheirou no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Já o ex-ministro Jaques Wagner, que também era cotado para substituir Lula, submergiu desde que foi alvo, no final de fevereiro, de uma operação da Polícia Federal sobre irregularidades nas obras do Estádio da Fonte Nova. Wagner fez uma visita rápida e discreta a Lula no sindicato e não chegou nem a subir no carro de som onde o líder petista fez o seu último discurso antes de se entregar à Polícia Federal. O ex-governador da Bahia deve disputar o Senado este ano.
Haddad esteve no Sindicato dos Metalúrgicos ao lado de seu padrinho político, mas foi tratado de uma forma mais discreta do que os dois pré-candidatos a presidente presentes: Guilherme Boulos (PSOL) e Manuela d´Ávila (PCdoB), que foram muito elogiados pelo líder petista:
— Aquilo foi um gesto de agradecimento ao fato de dois candidatos terem ido lá prestar solidariedade. Não tinham obrigação nenhuma de ir. O Boulos ainda foi muito importante na mobilização do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) nos últimos dias. Nada mais do que isso — afirmou um dirigente petista.
A fala do ex-presidente também tinha o objetivo de tentar plantar sementes para uma união do PT com os dois partidos de esquerda. Mesmo que a chance de aliança no primeiro turno seja remota, fica aberta a porta para um acordo no segundo turno e também para uma aliança em torno de sua defesa diante dos processos da Lava-Jato.
De acordo com aliados, Lula também avaliou que qualquer fala mais entusiasmada em favor de Haddad ganharia as manchetes como uma indicação de passagem de bastão, o que não era considerado estratégico pelo ex-presidente no momento.
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