É um contrassenso que imóveis praticamente prontos permaneçam fechados quando país tem um déficit habitacional estimado em 6,3 milhões de moradias
Costuma-se dizer que o Brasil é o país dos absurdos, tantas são as situações que desafiam a razão e o bom senso. Exemplos estão por toda parte. Um deles foi ao ar no domingo passado, em reportagem do “Fantástico”, da TV Globo. Ela mostrou que 186.682 unidades do Minha Casa Minha Vida — todas destinadas a pessoas de baixa renda — estão com 95% ou mais das obras concluídas, mas não podem ser entregues por problemas que vão da falta de infraestrutura a pendências com as empreiteiras. Com isso, os imóveis, apesar de quase prontos, permanecem fechados, expostos à deterioração do tempo e sujeitos a ocupações. No entorno desses conjuntos fantasmas, vivem, de forma precária, algumas das famílias que se inscreveram no programa. Estima-se que o país tenha um déficit de 6,3 milhões de moradias.
Um dos casos citados é o do Conjunto Rio Doce, em Linhares (ES). São 600 casas que estão prontas desde 2012, faltando implantar as redes de água e esgoto. Um ano depois de concluído, o empreendimento foi atingido por uma cheia — não prevista, apesar de o condomínio ficar próximo ao rio que, inclusive, lhe dá nome. Por causa da enchente, que afetou também o conjunto vizinho, Mata do Cacau, com 917 casas, foi necessário construir um dique, que só ficou pronto no ano passado.
Em Feira de Santana (BA), um conjunto concluído em dezembro de 2017 também permanece de portas fechadas. E os 3.500 futuros moradores não sabem quando poderão se mudar para lá. Na hora de entregar os imóveis, percebeu-se que faltava algo essencial: energia elétrica. Nem postes de luz existem.
No bairro de São Tomé de Paripe, em Salvador (BA), um residencial com 500 casas está abandonado há mais de quatro anos. Faltam apenas 20% para concluir as obras, mas a empreiteira desistiu do empreendimento. Agora, a Caixa Econômica Federal deverá contratar outra construtora para terminar o projeto.
O governo federal alega que, na última década, 3,9 milhões de moradias foram construídas com recursos do Minha Casa Minha Vida, representando investimentos de R$ 425 bilhões. De fato, o MCMV tem sido praticamente a única iniciativa nesse campo. Mas, na verdade, o programa tem se prestado mais à publicidade do que a uma real política de habitação. Basta recordar o uso do programa pelas campanhas políticas de Lula e Dilma ao Planalto.
Fora isso, o Minha Casa Minha Vida repete erros do passado, como a construção de grandes conjuntos em áreas isoladas e com infraestrutura deficiente. A qualidade dos projetos também deixa a desejar. Não são raros os casos de rachaduras e inundações em prédios recém-construídos. Sem falar nas empreiteiras que abandonam o empreendimento no meio do caminho, atrasando a entrega das unidades. Talvez pior que tudo isso seja deixar fechados imóveis quase prontos, enquanto o déficit habitacional mora ao lado. Um absurdo.
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