- O Estado de S.Paulo
O que se viu no primeiro debate foi um deserto de homens, mulheres e ideias
A Lava Jato sacudiu a política brasileira, dragou seus principais expoentes e deixou no lugar um deserto de homens, mulheres e ideias. Muitas análises podem ser feitas sobre estratagemas mais ou menos eficientes sobre o primeiro debate presidencial, mas nenhuma vai superar o fato de que o que se assistiu foi um desfile miserável de frases vazias, por vezes desconexas e que não enfrentam nenhuma das gravíssimas e urgentes questões nacionais.
O eleitorado descrente, raivoso e desesperançoso que viu no curso de menos de quatro anos um ex-presidente ser preso, uma presidente recém-reeleita ser apeada do cargo para o qual já não tinha condições mínimas de exercício, o segundo colocado nas últimas eleições se autoincinerar ao vender a alma para um açougueiro em troca de dinheiro vivo e um presidente da República virar um zumbi depois de ter de parar de governar para salvar o próprio pescoço não encontra nas opções colocadas na praça alguém com atributos necessários para assumir o comando.
Quem declara voto em Jair Bolsonaro e professa essa decisão como os seguidores de algum culto lisérgico de um líder messiânico ou um curandeiro televisivo não o faz porque entenda que ele é preparado para o cargo. E sim porque quer professar seu desalento e seu ódio pelo que está aí da maneira mais estridente.
Quem olha para Geraldo Alckmin e pensa em votar nele não o faz porque vê no tucano um líder capaz de conduzir o País a um novo ciclo de desenvolvimento, mas sim porque teme os extremos e vê em seu discurso anódino, monocórdio e burocrático a opção menos pior.
Aqueles que ainda apontam Marina Silva como possível recebedora do seu sufrágio não manifestam empolgação pelas ideias "nem lá nem cá" da ex-senadora nem sua postura de vestal diante dos malfeitos, mas sim movidos pelo recall de suas aparições anteriores, há quatro e oito anos atrás, e o fato de que ela não apareceu em nenhuma lista de indiciados nesse período.
Quem indica Ciro Gomes nas pesquisas não está em busca de uma opção desenvolvimentista de esquerda, mas enxerga na retórica incisiva do ex-ministro uma alternativa à ausência de Lula na chapa.
Por fim, os espantosos quase 30% que ainda falam que votariam num condenado em segunda instância a mais de 12 anos em regime fechado por corrupção e lavagem de dinheiro o fazem fechando os olhos para o fato de que seu partido comandou um esquema de pilhagem sistemática e orgânica do Estado. Iludidos pela volta de uma certa bonança econômica artificial que também ela foi demolida por Dilma Rousseff, essa invenção pela qual Lula parece também ter sido absolvido pelos seus defensores.
Na ausência absoluta de um debate acerca de quais serão as tarefas urgentes do futuro presidente - que nada têm a ver com banir a ideologia de gênero das escolas ou limpar o nome dos endividados no SPC - os candidatos vagam diante dos eleitores como autômatos que não têm coragem de dizer a que vieram. Ou apostam nessas pautas pseudo-populares, mas que são na verdade poções de devaneio perigosas diante da tal dança à beira do precipício fiscal.
Para serem considerados líderes, os presenciáveis precisariam ter coragem de dizer com todas as letras que, se eleitos, tentarão de toda forma barrar o indecente reajuste do Judiciário e do Ministério Público, por serem insultos imorais a um País já encalacrado do ponto de vista fiscal. Teriam de dizer como vão compor sua maioria, sem o blábláblá de que vão "governar com os melhores" porque isso é ficção ruim.
Nenhum tem tônus muscular para falar o que precisa de forma clara. Diante dessa flacidez política, o eleitor desalentado pode ser seduzido a flertar com o populismo. Não terá sido culpa dele.
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