Sem participar dos debates na reta final de campanha e com tempo ínfimo de TV, o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, deu uma impressionante demonstração de força e quase encerrou a eleição presidencial no primeiro turno. Com mais de 48 milhões de votos, Bolsonaro abriu uma dianteira confortável de 18,1 milhões de votos sobre Fernando Haddad, do PT, o segundo colocado. Os dois candidatos mais rejeitados, representantes de pontas opostas do espectro político, serão obrigados a se confrontar em um saudável segundo turno.
A campanha radicalizada do primeiro turno não foi produtiva para o debate dos programas políticos. O segundo turno terá forçosamente de sê-lo, porque o eleitor moderado, tradicional apoiador de um centro político que foi arrasado nas urnas, terá de ser conquistado.
A largada para a segunda etapa da disputa é mais favorável a Bolsonaro, mas é uma outra eleição, na qual o candidato do PSL terá tempo igual a seu rival petista no horário eleitoral gratuito. O capitão reformado obteve mais de 3 milhões de votos do que os de toda a esquerda e centro-esquerda reunidas - Haddad, Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) e Guilherme Boulos (Psol). Há, porém, 10 milhões de votos distribuídos entre os candidatos de centro - Geraldo Alckmin (PSDB), João Amôedo (Novo), Henrique Meirelles (MDB) e Álvaro Dias (Podemos). É este contingente de eleitores, que deverá definir o próximo presidente.
O vendaval Bolsonaro foi forte a ponto de mudar o quadro desenhado nas pesquisas em Estados importantes, como Minas, Rio de Janeiro e São Paulo. Em disparada de última hora, Romeu Zema (Novo), que declarou apoio ao candidato do PSL, deixou para trás o favorito Antonio Anastasia (PSDB)e o ultrapassou por 13 pontos percentuais, levando a disputa ao segundo turno e dela excluindo o governador petista, Fernando Pimentel. A ex-presidente Dilma Rousseff, até então primeira colocada para a disputa do Senado por Minas, terminou na quarta colocação.
No Rio de Janeiro, reduto eleitoral dos Bolsonaro, Wilson Witzel (PSC), que apoia o PSL, chegou da noite para o dia em primeiro lugar, com mais que o dobro da votação do então franco favorito, Eduardo Paes (DEM) e com uma vantagem de 22 pontos percentuais. Em São Paulo, Major Olímpio, do PSL, foi o senador mais votado, quando até há pouco não parecia ter chances de vitória.
Bolsonaro catalisou a enorme rejeição ao PT e sua possível volta ao poder, com o avanço rápido e constante de Fernando Haddad. A propaganda petista poupou Bolsonaro, escolheu-o como o rival mais fácil de ser vencido e agora terá de enfrentá-lo muito mais forte do que supôs seu errôneo cálculo eleitoral. No fim, os dirigentes do PT temeram a derrota já no primeiro turno, o que quase ocorreu.
O primeiro turno acabou antecipando as opções do segundo, com vantagem para Bolsonaro. Ele conseguiu avançar em redutos que lhe seriam contrários, como o das mulheres e dos eleitores com renda de até dois salários mínimos, reduzindo a vantagem de Haddad em um público fiel ao PT. O PT, por seu lado, conseguiu manter grande dianteira no Nordeste, onde ganhou em todos os Estados, e no Pará. Bolsonaro venceu em todos os demais Estados.
Sem liquidar a fatura no primeiro turno, Bolsonaro terá tempo de sobra para esclarecer o que pretende fazer caso conquiste a Presidência. Pelo estilo de campanha agressivo, sabe-se bem o que Bolsonaro não quer e pouco o que ele quer. Esboços de ideias econômicas ventilados em plateias fechadas, como a da criação da CPMF em substituição a outros tributos, foram rejeitados pelo candidato. Haddad, por seu lado, atribuiu toda a culpa da situação econômica do país a seus adversários do PSDB e a Michel Temer. Terá de detalhar como vai recuperar o estrago feito pela gestão petista de Dilma Rousseff.
Nenhum dos dois apresentaram propostas viáveis para atacar o principal e mais urgente problema do país: o endividamento crescente e insustentável do Estado. Há agora tempo para que sejam claros a respeito.
Não houve cheque em branco para Jair Bolsonaro pular quase sem interrupção de um leito de hospital para o Planalto. O segundo turno o obrigará a polir suas propostas e buscar alianças que facilitem a vitória e um eventual governo. O PT, que dinamitou as pontes com a esquerda e o centro, terá de reconstruí-las com argumentos e não palavras de ordem. O debate de ideias substantivas será profícuo para os eleitores, que foram até agora mal servidos delas.
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