- Folha de S. Paulo
A história deveria ensinar: usar a mentira como arma eleitoral cobra um preço caro
Direto e reto, o estado da coisa é o seguinte: mães estão deixando de vacinar seus filhos contra poliomielite e sarampo, por exemplo, por causa de notícia falsa que se alastra pelo WhatsApp. A Secretaria de Comunicação da Presidência da República tenta agora fazer frente ao fenômeno com uma publicidade digital comovente.
Chamados a uma sala para supostamente responder a uma pesquisa, mulheres e homens explicam que são contra a vacinação porque ouviram falar que faz mal, que não presta, que tem efeitos colaterais. Receberam a informação pelas redes sociais e pronto.
A “entrevistadora”, então, entrega a eles um envelope fechado. Dentro, fotos dela de quando tinha cinco anos e andava. Só ali as pessoas descobrem que desde então ela está em uma cadeira de rodas porque não foi imunizada pela família. A peça encerra com um alerta: fakenews matam.
Os brasileiros que vão às urnas no domingo (7) nunca foram tão bombardeados com boatos dos mais variados tipos, alguns que beiram o absurdo. A sanha por disseminar “informação” —entre aspas mesmo, porque se trata de uma ironia—, seja qual seja, já é uma das marcas dessa eleição.
Algumas invenções detectadas pelos institutos de checagem atentam contra a própria democracia.
Um panfleto digital com as fotos de Lula, Fernando Haddad e Manuela D’Ávila diz que eleitores do PT devem evitar ir às urnas no domingo (7), porque há risco de conflito. A orientação, diz o texto, é votar no dia seguinte, 8. Fala sério, pode pensar o leitor. Alguém acredita nisso? Sim. Aliás, não custa ressaltar: é mentira.
Quem faz campanha para aumentar a abstenção e ganhar por W.O. não tem apreço pelo Estado de Direito. Não, não é exagero. Disseminar informações de que o PT quer distribuir mamadeiras com bico em formato de pênis não é só bizarro. É desonesto. Não faltam motivos para criticar o partido. Precisa recorrer a isso? Mas tem dos dois lados, para todos os gostos.
Os institutos de checagem detectaram mensagens que atribuíam a Flávio Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro, a seguinte frase: “Se um pai tira a vida de um filho gay, é uma questão familiar. Não acho que o Estado deva se intrometer”. Não há qualquer registro de que ele tenha proferido tal sentença. A Agência Lupa cravou: é falsa.
É inegável, porém, que bolsonaristas, apoiadores do candidato do PSL, têm utilizado fake news para impulsionar o presidenciável. A revista Veja publicou em janeiro longa reportagem sobre o assunto e detectou, em levantamento, que enquanto PT e PSDB, por exemplo eram atacados com fake news, a maioria das invenções sobre Bolsonaro, àquela época, era favorável a ele.
Em 2014, o PT usou expediente parecido, espalhando boatos sobre corte de programas sociais para eleger Dilma Rousseff. Aqui, infelizmente, a história não ensina. Derrotar o adversário usando a mentira como arma pode cobrar um preço caro.
Na bolha virtual, os que pensam igual se sentem abraçados, protegidos, em boa companhia. O problema é que, um dia, invariavelmente, a realidade bate à porta. Não tem boato que bote comida no prato de quem tem fome.
Independentemente do resultado deste 7 de outubro, é forçoso reconhecer que é triste o destino de um país que busca um reencontro com os dias de glória alicerçado na mentira.
O mandatário que for ungido pelas urnas terá pela frente um cenário difícil, de aperto fiscal, filas nos hospitais, estados em situação pré-falimentar e milhões de desempregados nas ruas. Serão dias de muita luta, de verdade, venha quem vier.
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