- O Estado de S.Paulo
A governabilidade depende de credibilidade, diálogo, base forte no Congresso
Em uma eleição nada parecida com as anteriores, Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) já falaram mal um do outro até não ter mais jeito. Buscam se mostrar como opostos. E são. Até na forma de divulgar o programa de governo. Bolsonaro libera o dele a conta-gotas, o que é uma prática bastante comum na política de todo o mundo, pois torna possível medir a aceitação ou rejeição de determinada proposta. Haddad apresentou um programa completo, um catatau que aos poucos vai sendo modificado para se adaptar ao pensamento do próprio candidato, visto que o primeiro fora pensado para a eventual candidatura do ex-presidente Lula, como a convocação de uma Assembleia Constituinte.
Como essa é uma eleição carregada de novidades e atipicidades, o brasileiro não deverá ver um debate entre os dois finalistas ao Palácio do Planalto. Pelas redes sociais e pela propaganda no rádio e na TV, os mais de 140 milhões de eleitores tentam entender o que um e outro pensam a respeito de temas que dizem respeito ao cotidiano do cidadão, a exemplo do combate ao desemprego, da melhoria dos serviços públicos de saúde, transporte, segurança, educação e também em relação ao futuro do País. Vamos para a frente ou vamos para trás?
O futuro do País. Essa é uma questão muito importante. Um deles, Bolsonaro ou Haddad, será eleito daqui a oito dias. Terá o escolhido pelas urnas, e essa é a decisão que vale, independentemente de tendências ideológicas, competência para governar o País, pacificar a sociedade? Ou se sentará na cadeira de presidente, no Palácio do Planalto, por um gosto pessoal ou para cumprir uma tarefa partidária?
Eleito em 1989 com uma votação expressiva, Fernando Collor mostrava tanta confiança que, um dia depois da posse, baixou uma medida provisória que confiscou todos os ativos financeiros dos cidadãos que o haviam elegido presidente, o chamado confisco da poupança. Foi uma medida tão drástica e traumática que em 2001 o Congresso aprovou uma emenda constitucional proibindo o presidente da República de editar medida provisória “que vise a detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro”. Collor assumiu o mandato em 15 de março de 1990. Em 2 de outubro de 1992, sem nenhum apoio no Congresso, e com o processo de impeachment contra ele já instaurado no Senado, foi afastado da Presidência. Em seu lugar assumiu Itamar Franco, que fez um governo de pacificação e salvação nacional.
A construção da governabilidade depende de vários fatores. Um deles é básico: a capacidade que o eleito tem para montar uma equipe de credibilidade, ter o comando sobre ela, mas não centralizar tudo em torno de si, uma base forte no Congresso, diálogo com os outros poderes e com os diversos setores da sociedade. Lula, por exemplo, conseguiu montar uma equipe forte e variada. Ante a desconfiança do mercado buscou no PSDB, com o qual havia disputado o segundo turno da eleição, o seu presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que construíra a carreira no BankBoston. Seu ministro da Fazenda foi o médico Antonio Palocci, que durante a campanha tivera uma aproximação muito forte com o mercado e com os empresários.
Já Dilma Rousseff foi apresentada como a gestora das gestoras. Sua gestão, no entanto, foi um fracasso. Ela não tinha jogo de cintura para negociar com o Congresso, não gostava de se reunir com os políticos, centralizava tudo e provocava tanto medo físico em alguns de seus ministros que vários preferiam ficar longe do Palácio do Planalto. Como Collor, Dilma sofreu um processo de impeachment e teve o mandato cassado. Talvez a marca maior dela tenha sido a mudança que impôs ao substantivo comum de dois gêneros presidente, trocando-o por presidenta.
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