sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Fed indica que ciclo de alta dos juros não será longo: Editorial | Valor Econômico

Com um par de palavras, o presidente do Federal Reserve Bank, Jerome Powell, mudou a direção esperada da política monetária americana e animou os mercados financeiros globais. Ao discursar no Clube Econômico de Nova York para apresentar o primeiro "Relatório de Estabilidade Financeira", Powell disse que a taxa de juros determinada pelo Fed estava apenas "um pouco abaixo" da neutra - a que não estimula nem contrai a economia -, indicando que o banco central americano pode estar se aproximando de uma pausa no seu ciclo de aperto monetário. Da última vez em que comparou as duas taxas, Powell dissera que elas ainda estavam muito distantes uma da outra, sugerindo a necessidades de vários aumentos futuros.

A trajetória indicada pelo Fed em reunião de setembro, e ao lado dela, pelos gráficos de pontos sobre o caminho futuro dos juros, apontou que o cenário mais provável visto pelos membros do Fomc era de mais uma alta em dezembro, seguida de mais três ao longo de 2019. O Fed deve elevar o juro novamente em dezembro, para 2,25% a 2,5% e talvez um par de vezes mais, até atingir 3%.

Não foram explicitados os motivos para que o ritmo de alta dos juros possa ser agora menor, embora existam boas razões para que, na visão do Fed, ele não precise ser acentuado. Powell, com base no relatório, afirmou que não há, por exemplo "excessos perigosos no mercado de ações". Ele listou quatro riscos que, de ponto de vista da estabilidade financeira, são os mais importantes. Não viu grandes problemas em nenhum deles. "Não detectamos nenhum crescimento anormal generalizado ou excessiva alavancagem", disse. O nível de dívida das empresas está "aonde deveria estar após uma década de expansão econômica". A causa maior de preocupação, para ele, é que as empresas que já estão com maior alavancagem são as que continuam se endividando mais. Além disso, o Fed não vê " nenhuma classe de ativos em que a valorização esteja muito além dos padrões".

A mudança de tom da política monetária decorre ainda de uma avaliação do ciclo econômico. O período de expansão é o mais longo da história recente, mas os efeitos do pacote fiscal expansionista de Donald Trump estão se esvaindo, embora isso ainda não apareça com força nas estatísticas. Ontem foram divulgadas várias delas, com o consumo avançando em novembro mais que o esperado (0,6%), assim como a renda pessoal (0,5%). Por outro lado, o que é tranquilizador, os gastos pessoais de consumo (PCE), medida preferida do Fed, recuou de 2% para 1,8%, o menor valor desde fevereiro.

Ou seja, é possível que as pressões inflacionárias que poderiam se materializar em um período de aquecimento da economia, que cresceu 4,2% no segundo trimestre, não ocorreram com força significativa ou esperada. Agora, haverá desaceleração da economia, para mais perto de sua tendência de longo prazo, próxima a 2%, e é possível que a inflação, com mais motivos ainda, também se mostre bem comportada. Com isso, o ritmo de aumento dos juros poderá ser moderado e dependente dos dados correntes da economia.

A ata da reunião do Fed do início de novembro, divulgada ontem, corrobora o discurso suave de Powell sobre o trajeto futuro dos juros. Membros do Fed apontaram a necessidade de rever a comunicação das próximas reuniões, em especial a que se refere "às expectativas em relação a novos e graduais aumentos da meta para a taxa dos federal funds", registra a ata. Vários participantes consideraram conveniente já começar a transição para uma "maior ênfase" na avaliação dos dados que forem surgindo para a determinação das perspectivas econômicas e de política monetária. Foi o que Powell começou a fazer na quarta-feira.

O Fed considera que os riscos para o crescimento, emprego e inflação estão balanceados. No caso do crescimento, ele "continuará acima da tendência histórica até aproximar-se dela a médio prazo". As condições financeiras se mostraram mais apertadas em outubro, permanecem "acomodativas", segundo a ata.

A guerra comercial com a China, para o Fed, pode reduzir o crescimento dos EUA ou, ainda, dado o desempenho forte do consumo, ser transmitida mais facilmente aos preços dos insumos e do varejo, criando "pressões altistas indesejáveis na inflação".

A perspectiva de o ciclo de aperto monetário dos EUA ir além do previsto, prejudicando Brasil e países emergentes, parece mais distante. O Brasil ganha mais tempo para fazer os ajustes necessários.

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