Derrota de Renan e vitória de Alcolumbre repetem situação só vista na era FH e com Lula
Na democracia, vale o poder do convencimento, o que também deriva do poder político. Este o governo Jair Bolsonaro conquistou nas urnas, mas isso não significa que as reformas, imprescindíveis, conquistem os votos necessários pela simples força da gravidade ao caírem sobre o Congresso. Não é assim que funciona, e ainda bem. Se não, estaríamos em um regime autoritário, sob o tacão do Executivo.
Consciente das regras do jogo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, faz bem ao arregaçar as mangas e entrar no campo da política para conversar com lideranças de partidos, sem mesmo se esquecer de estabelecer contatos com o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, Corte a que certamente chegarão muitas reclamações, devido ao forte caráter de justiça social da proposta que o governo encaminhará ao escrutínio de deputados e senadores. As corporações, principalmente do funcionalismo público, as mais privilegiadas no atual regime previdenciário, tentarão manter, de todas as formas, as vantagens de que usufruem há décadas. Também é do jogo.
Paulo Guedes descer do suposto Olimpo da economia para a disputa democrática, em defesa do que o país necessita, é um reforço imprescindível. Foi importante sua aproximação com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afinação demonstrada na entrevista que concederam juntos, na tarde de terça. Precavido, o ministro também se aproximara do senador Renan Calheiros (MDB-AL), tido como favorito na corrida pela presidência do Senado, disputa afinal perdida para outro parlamentar do DEM, Davi Alcolumbre (AP). Tudo para o bem das reformas — a derrota do velho cacique e o fato de o mesmo partido aliado do governo comandar as Mesas do Congresso.
Abre-se importante espaço — talvez só visto no primeiro mandato de FH e com Lula, mas este, por vícios ideológicos e compromissos políticos e sindicais com o funcionalismo, não quis reformar a Previdência para valer. É um espaço a ser ocupado sem perda de tempo, mas também sem atropelos e ansiedades que atrapalhem as negociações.
O debate sobre a Previdência que transcorre desde Temer já acumulou muitos argumentos consistentes sobre a imperiosidade das mudanças. A crise previdenciária não se trata de uma etérea questão fiscal, mas de uma oportunidade histórica de a sociedade corrigir o desvio estrutural do Estado brasileiro de concentrar renda em algumas castas, e não só do funcionalismo.
Enquanto transcorrem as conversas, ressurge a ideia de pacto entre os poderes para as reformas, levantada pelo ministro Toffoli. Voltamos à década de 70, quando o Pacto de Moncloa, firmado entre as forças políticas espanholas em 77, sem Franco e com o rei Juan Carlos à frente das negociações, retirou a Espanha de um atoleiro semelhante ao brasileiro atual. Assim como Sarney, inspirado por Moncloa, tentou lançar nos anos 80 um pacto e não deu certo, também não dará agora. São situações muito diferentes. No Brasil, basta que os poderes republicanos cumpram seu papel. Os três poderes precisam manter sua independência, para não desestabilizarem o sistema de freios e contrapesos da democracia brasileira.
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