- Valor Econômico
O grau de improvisação do governo é muito alto
A grave crise que se instalou no Ministério da Educação, detonada por um fantasma que nem mora no Brasil, uma espécie de exterminador do presente, e amplificada por muitos fofoqueiros discípulos, culminou esta semana com a demissão de quase uma dezena de funcionários do MEC, mas preservou o ministro Ricardo Vélez, que quase foi junto. Ela tem a mesma origem de todas as crises políticas ocorridas nesses 70 dias de governo Bolsonaro.
É a mesma do Itamaraty, que apresentou seu enredo com a demissão do embaixador Paulo Roberto de Almeida, e tem exatamente a mesma motivação da crise do Palácio do Planalto, que resultou na primeira demissão de ministro neste governo, a de Gustavo Bebianno, da Secretaria-Geral da Presidência. A razão de tudo é o desgoverno, o descompromisso, a ausência de autoridade, a falta de comando e completa ignorância em matéria de ideias sobre o que fazer em cada área. Uma fumaça rala, nenhum fato.
Quem souber onde o ministro colombiano, que lotou o ministério com estudantes de teologia do interior de Minas, São Paulo e Paraná, quer chegar, ganha a medalha do mérito educativo. A pasta que está sob sua responsabilidade tem problemas sérios, já diagnosticados e com início de superação, inclusive do ponto de vista legal, deixados prontos pelos antecessores. No entanto, ele não leva adiante o que encontrou. Qual o destino da reforma do ensino médio, há 20 anos em destaque entre os maiores problemas da educação do país? O que Vélez fará do Fies, além de desnudá-lo em uma promessa de Operação Lava-Jato da Educação que tem a pretensão de pegar de jeito os grandes conglomerados da área? O que os teólogos entendem de Prouni, de ensino básico, de aprendizagem infantil?
Não é isso que importa ao governo pelo que se evidenciou neste início.
O presidente Jair Bolsonaro continua a viver, como reiterou ontem, uma situação-fantasia. Diz que mantém um ministério técnico e que dá liberdade aos respectivos ministros para escolher suas equipes. Mas foi ele que determinou ao ministro Vélez a exoneração Ricardo Wagner Roquetti do cargo de diretor de programa da Secretaria Executiva do MEC. E foi por sua determinação também que o ministro da Justiça, Sergio Moro, foi obrigado a cancelar a nomeação da especialista em segurança pública Ilona Szabó para o cargo de suplente no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Ou seja, o presidente participa ativamente das crises de comando que se instalaram na Esplanada a seus pés.
Ainda por cima, falta coragem aos mandatários para assumir seus atos. Alegam, à moda Lula, o contrário de seu propósito, o inverso da realidade, e a culpa vai para o mordomo. No caso, a velha política que os obriga a "assim agir para que o governo faça o que antes faziam".
É retórica a vigilância moral, é alto o barulho das disputas internas, mas o governo não tem planos, está paralisado em seu conjunto. Nem se pode contabilizar a produção do texto da reforma da Previdência e do Programa de Segurança como resultados, são ainda incipientes propostas cuja aprovação pelo Parlamento, onde a governabilidade é ainda uma desconhecida, não está garantida.
De qualquer reunião de investidores de que se tem notícia, realizada com especialistas e consultores brasileiros, vem a pergunta sobre onde isso vai dar, se o presidente será mesmo Jair Bolsonaro, se tem impeachment no horizonte, se o general Hamilton Mourão está pronto para assumir. Ora, o governo mal começou e sua avaliação, nos boatos, já chegaram a esse patamar?
O presidente da República mantém uma postura do deputado federal que foi por vários mandatos. Não caiu na realidade. O porta-voz transformou-se em um conserta-voz, como o apelidou um político que acompanha as idas e vindas das declarações de Bolsonaro e as explicações que seu pensamento exigem.
O infantil apego à comunicação pela rede social pode ter um efeito contrário e colher o governo no contrapé. Um milhão de seguidores que chegam podem se transformar em dois milhões que saem para o ataque quando perceberem o vazio, a falta de respostas da administração.
É assustador o grau de improvisação do governo. As transições foram úteis a Fernando Henrique, a Lula, até a Itamar Franco e Dilma. Quando chegaram lá sabiam minimamente o que queriam fazer. Bolsonaro não, parece plateia do seu próprio personagem. Não dá sinais sobre seus planos, as políticas públicas estão sob cada ministro e, do ponto de vista político, o presidente se esconde sob o quepe dos militares.
Os cinco principais generais que habitam o Palácio do Planalto têm visão estratégica, são poliglotas, muito bem formados e dão suporte ao Presidente da República. Quando as críticas à paralisia começarem a pressionar seu bunker, espera-se alguma reação no sentido de fazer mover a máquina. Constituem o grupo mais estável do governo Bolsonaro não porque sejam uma fortaleza, mas porque simplesmente obrou para eles. São apenas 70 dias de governo, mas repletos de trapalhadas que contaminaram a todos. Só há mais 30 dias para começar a cumprir o plano de 100 dias feito pela Casa Civil da Presidência.
Marielle
A prisão de dois suspeitos do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco motivou análises, ontem, de autoridades do governo federal que acompanharam de muito perto a investigação. Sua opinião é que os fatos de ontem demonstram que um dos principais objetivos dos interventores na segurança pública do Rio foi alcançado: a garantia de proteção absoluta, contra pressões e obstáculos, às investigações. A blindagem estaria agora colhendo frutos com a possível descoberta dos autores do crime, mas afirmam que precisará ser mantida para que as apurações cheguem de fato aos mandantes.
Esta nova etapa dos trabalhos policiais demandará ainda mais atenção das autoridades, justamente por suas potenciais ramificações no poder público.
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