- Valor Econômico
Bolsonaro está blefando no pôquer da reforma
Quem tem razão, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ou o presidente da República, Jair Bolsonaro? Não é difícil apontar, depende dos interesses que formam o ponto de vista. Sim, são antagônicos, com linguagens e gestos diferentes um do outro. Mas, principalmente, sua diferença no momento é que o primeiro quer a reforma da Previdência e prometeu ao seu eleitorado da elite financeira realizá-la; o segundo não quer a reforma da Previdência também para agradar ao seu eleitorado, da elite do funcionalismo. Mas faz de conta que apoia. É um blefe alto, para a bolsa não cair e o dólar não subir, além de evitar que a equipe econômica peça o boné por falta de condições de fazer o crescimento.
Eis a equação do tumulto. Por isso a crise política e por isso a sensação de vazio, falta de comando, de ação de governo, que persiste há semanas.
Maia não tem dito nada demais. A essência do seu argumento é óbvia, a de que a formação de maioria no Congresso é tarefa do presidente da República e não do presidente da Câmara, por isso não precisa ficar ouvindo desaforos. Afirma que o presidente deve trabalhar em vez de ficar tuitando. Estava ficando com todo o desgaste para ajudar alguém que não quer ser ajudado, esta a síntese. Levando carão até mesmo do ministro da Justiça, Sergio Moro, que quer o pacote criminal tramitando junto com a Previdência o que, para Rodrigo, só prejudica a Previdência.
E levando bordoada de filho do presidente. Enquanto Maia se explica, a resposta lhe vem atravessada por mensagem na rede de um dos três membros da CUT particular de Bolsonaro, o vereador Carlos: "As pessoas que querem Bolsonaro longe das redes sociais sabem que é isso que o conecta com o povo, foi isso que garantiu sua eleição. O querem fraco e sem apoio popular pois assim conseguiriam chantageá-lo". Chama Rodrigo Maia de chantagista e o acusa de não querer o sucesso do governo.
Os generais também criticam o desgoverno, mas o vereador acusa só os políticos, mais fracos nessa arena eleitoral que não se transforma nunca em governo.
O presidente não só não faz força para levar adiante a reforma, como, por meio de seus associados, ataca quem quer.
Os militares, o Judiciário, o Ministério Público, as corporações, as altas castas do funcionalismo público, não querem e nunca quiseram a reforma da Previdência. Bolsonaro está liderando esse pelotão, era seu lado até eleger-se.
Depois de eleito presidente, se sentiu obrigado a abraçar a tese apresentada como única salvação da pátria, inclusive para garantir as aposentadorias de todos os brasileiros no futuro, uma sobrevivência em risco. Mas não perde chance de provar que discurso é uma coisa, ação é outra.
A revelação de sua realidade fica com os filhos. O mesmo Carlos lembrou, no seu comunicado contra Rodrigo, que foi graças ao Twitter que Bolsonaro foi eleito, e permanecerá assim fiel ao instrumento que alcança seu eleitorado. Esse é o ponto.
São ingredientes que deixam a Presidência, o partido do presidente e seus comandantes, inclusive o quádruplo presidencial que nos comanda, cada vez mais parecidos com os governos do PT.
Bolsonaro, depois de alertado pelas pesquisas que apontaram queda de popularidade, trocou seu assessor oficial de comunicação, providência que não impediu o filho de dizer nas redes que a queda nas pesquisas não existe, foi registrada pelas mesmas pessoas que diziam, na campanha, haver Bolsonaro batido no teto.
É o inconformismo com a realidade, um discurso falso mas ao gosto dos fiéis da seita, método copiado do governo do PT. Bolsonaro fala para 30%, 40% de eleitores, fala para fora, um público bolsonarista, como os 30% a 40% que Lula sempre teve e o seguraram no cargo.
O presidente está bem acompanhado na sua resistência. Os militares não querem a reforma da Previdência, tanto que fizeram, com a maior candura, uma proposta inacreditável, que melhora o soldo da ativa e nada economiza.
Como está valendo tudo nas hostes de Bolsonaro, os seus contrários começam a atribuir a ele e aos seus tudo o que é ofensivo, agressivo e provocador nesta crise. A começar do esfacelamento do MDB. O ex-ministro Moreira Franco estava em Brasília, na reunião da Executiva, na quarta-feira, e foi dormir na casa de Rodrigo Maia, genro de sua mulher, de cujos filhos é avô. Moreira, por pouco, não foi preso na casa da Presidência da Câmara. Isso valeu da família Bolsonaro um comentário irônico e maldoso sobre as razões de Rodrigo estar tão nervoso com o governo.
Para o presidente da Câmara, foi um caso clássico de vendeta de Sergio Moro, com quem havia trocado farpas, porque o ministro queria fazer tramitar o pacote anticrime junto com a Previdência e Rodrigo preferiu separá-los para não prejudicar a Previdência. Estaria Moro representando outro grupo, do Ministério Público, que nunca quis e não quer a reforma da Previdência, já derrubada por eles no governo Temer, às vésperas de entrar em votação, com a desestabilização do governo provocada por denúncias de corrupção. A agenda de Moro é antirreforma, como é antirreforma o presidente largar o circo pegando fogo, ontem, e passar uma manhã no cinema, com a primeira dama.
Atribui-se ao governo também a tentativa de esfacelar o Centrão, desarticulado em parte e agora tentando se erguer já com uma proposta de mudança da reforma que reduz a economia pretendida. Rodrigo vinha reorganizando o Centrão, no qual incluiu o PSL, partido do presidente no momento já rachado e tão perdido na política quanto Bolsonaro no governo. Queria acelerar a possibilidade de votação. Claro que isso o fortaleceria, no confronto com Bolsonaro. Com os ataques, teve que desacelerar e abrir mão de ficar poderoso, mas não deixou de ser o político mais importante, mais bem situado e com mais responsabilidade e instrumentos à mão para enfrentá-las. Outro tiro, o do Centrão, que os experts deixaram sair pela culatra.
Se Bolsonaro estivesse governando, poderia ter a chance de ganhar pontos nessa disputa, mas não está e por isso não tem sido páreo para o Congresso. Bolsonaro não tem um modelo de comportamento ou de governo. Não sabe como enfrentar a necessidade de desenvolvimento. Sua agenda anticrime caminha sozinha, não precisa dele, só precisa dos políticos que ataca. Nenhuma de suas brigas foi armada em torno de ideias, projetos, fatos e atos. O presidente parece estar no meio de uma grande conversa de botequim. Na qual Rodrigo Maia desafina, por estar convicto de que só será um presidente da Câmara relevante se realizar o crescimento.
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