segunda-feira, 27 de maio de 2019

Governo precisa redefinir o papel do BNDES: Editorial / O Globo

Há ideias para redirecionar o banco, mas elas têm de ser colocadas em prática

Reserva de capital humano acima do padrão do setor público, o BNDES mantém uma dinâmica de resultados financeiros apreciáveis. Encerrou o primeiro trimestre, por exemplo, com lucro líquido de R$ 11,1 bilhões. É um crescimento de 436,7% em relação a igual período anterior, alavancado pela venda de ações que possuía da Petrobras e de grandes empresas privadas.

Seus ativos somaram R$ 835,1 bilhões, com aumento de 4,1% em decorrência da valorização das participações societárias. E a qualidade da sua carteira de crédito se manteve acima da média de 90,7% do Sistema Financeiro Nacional.

Sob lupa, verifica-se que ela reflete uma diretriz questionável, prevalecente na última década e meia: empréstimos baratos, com garantia do Tesouro Nacional, basicamente concentrados (95%) em grandes empresas, algumas eleitas por governos anteriores para a privilegiada posição de “campeãs nacionais”.

Coloca-se a questão: é isso o que se pretende para o banco de investimentos da União? Por óbvio, não. Para mudar, o BNDES precisa ser repensado a partir da autonomia institucional.

É necessário reforçar seus mecanismos de vigilância para evitar a manipulação política, como ocorreu nos governos do PT, que induziram o banco a cumprir o papel de agente estatal concentrador da renda, ao privilegiar interesses de empresas amigas de governantes no Brasil, na Venezuela e em Cuba, Angola e Moçambique.

E para impedir, igualmente, interferências injustificáveis como a do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na semana passada, na gestão do Fundo da Amazônia— patrocinado pela Alemanha e Noruega, que estranharam e atestaram a correção do banco na gestão do fundo.

Evidências das fragilidades se espraiam, ainda, na recorrência de casos como o do final do ano passado, quando o banco aprovou crédito de R$ 300 milhões a uma empresa de cadastro financeiro, cujos acionistas eram nada menos que os cinco maiores bancos do país —três privados e dois estatais.

A operação não foi concretizada, mas sua tramitação sugere algo estranho na rotina de um banco público, não comercial, que se autodescreve com a missão de fomentar o desenvolvimento regional, socioambiental e a inovação entre médias e pequenas empresas.

O governo está diante da oportunidade de uma transformação qualitativa na ação do BNDES. O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do banco, Joaquim Levy, têm enunciado ideias numa direção correta, com reconhecimento da autonomia do banco, pautada pela independência institucional e foco em projetos de utilidade pública, nas áreas de saneamento, saúde, educação, energia, logística e inovação tecnológica. É preciso consolidá-las, o mais rapidamente possível.

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