sábado, 5 de outubro de 2019

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

Esperando Guedes – Editorial | Folha de S. Paulo

Com diretrizes corretas e boa equipe, titular da Economia tarda em decisões

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem lá seus dons de oratória. Calcado em convicções liberais, conseguiu mobilizar segmentos do empresariado e do mercado financeiro em torno de seus diagnósticos para o sofrível desempenho brasileiro das últimas décadas.

Chegou ao governo Jair Bolsonaro (PSL) com poderes e autonomia inéditos desde a redemocratização. Sob a direção do “Posto Ipiranga” —aquele que tem as respostas, segundo o presidente— reuniram-se as pastas da Fazenda, do Planejamento, do Trabalho e da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

Guedes e sua equipe alimentaram a expectativa de avanços rápidos em medidas de modernização, muitas das quais, aliás, já bem mapeadas e debatidas.

Os resultados, ao menos por enquanto, mostram-se decepcionantes, algo que não pode ser atribuído apenas à notória aversão de Bolsonaro à articulação política.

O avanço da reforma da Previdência, o grande feito até aqui, só ocorreu porque o Congresso se convenceu de que sem ela o país cairia num abismo. Ainda assim, notam-se problemas na reta final da tramitação da proposta.

Mas outras medidas importantes da agenda dificilmente terão avanço sem o protagonismo do Executivo. Para tanto, é essencial que o governo diga o que quer e em qual ordem de prioridade, o que até agora não fez com clareza.

Guedes limitou-se a lançar numerosos balões de ensaio, que mais confundem o público do que explicam as intenções do governo.

Tome-se o caso da reforma tributária, de grande complexidade e que abarca vários temas. O principal deles, do ponto de vista da eficiência da economia, é a simplificação da cobrança de impostos sobre bens e serviços. Trata-se, pois, do ponto de partida natural.

Em vez de aproveitar as propostas em tramitação no Congresso, a pasta da Economia perdeu tempo precioso com a tola ideia de ressuscitar a CPMF. Não se conhece, até hoje, a proposta do governo.

Quanto a um muito especulado novo pacto federativo, tampouco está claro se Executivo e Legislativo falam do mesmo assunto. Enquanto Guedes promete desvincular o Orçamento e reforçar a autonomia regional, os parlamentares só querem saber de abocanhar mais dinheiro da União.

Ao abrir a possibilidade de mais dinheiro para estados e municípios sem contrapartidas claras de ajuste, o ministro enfraqueceu sua posição na negociação política.

Por fim, também se aguarda alguma definição de reforma administrativa para enxugar carreiras do funcionalismo e conter a folha de pagamento do setor público.

À diferença da maioria de seus colegas de primeiro escalão, Guedes trabalha com diretrizes corretas e uma equipe qualificada. Causa mais estranheza, assim, a escassez de providências concretas.

Receita cassa voz de contribuinte em comitê – Editorial | O Globo

Apenas representantes da Fazenda darão a palavra final sobre conflitos tributários

O peso da mão da Receita Federal passou a ser sentido pelo contribuinte em seu bolso quando a inflação descontrolada foi colocada nos eixos, a partir do Plano Real, em 1994, e os governos — tucanos e petistas — trataram de financiar os gastos crescentes pelo aumento da carga tributária.

Ela subiu cerca de dez pontos percentuais do PIB em uma década, ficando na faixa dos 35%, a mais elevada entre todas as economias emergentes, rivalizando com alguns países desenvolvidos. Mas sem que se ofereçam à população os mesmos serviços na quantidade e qualidade disponíveis nas nações ricas. Ou seja, carga tributária de rico, serviços de periferia.

A Receita, cujo símbolo, bem escolhido, passou a ser o leão, modernizou-se, mas nunca demonstrou a agilidade do felino quando se trata de atender o contribuinte. Herdou do Estado brasileiro, de que é parte, uma postura distante da sociedade. Quase sempre se mantém à margem de problemas objetivos do pagador de elevados impostos, quando não age para concentrar ainda mais poder a fim de cumprir sua missão a qualquer custo de coletar impostos para cobrir gastos descontrolados.

Um caso exemplar apareceu no Diário Oficial da União que circulou quinta-feira, em que foi publicada a Portaria 531, do Ministério da Economia. Por ela, foi instituído o Comitê de Súmulas da Administração Tributária Federal (Cosat), que havia sido criado pela Medida Provisória da Liberdade Econômica, editada sob aplausos, porque se destina a melhorar o ambiente de negócios no país.

Pois, por ironia, a criação do Cosat vai em sentido oposto. Pagamento e cobrança de impostos são, por tradição, atos envoltos em controvérsias. Por isso, no passado, no período colonial, divergências neste campo estiveram por trás de insurreições e revoluções. Devido a isso, a Receita mantém conselhos dos quais participam representantes dos contribuintes, para ajudarem na normatização consensual da coleta de impostos.

Principalmente no caso das pessoas jurídicas, a existência desses conselhos permite que se discutam regras e dispositivos que, aplicados, podem subtrair bilhões de um setor. Porém, a Portaria 531 instituiu o Cosat acima do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), e sem representação dos contribuintes. Incumbido de aprovar súmulas — a serem seguidas no julgamento de conflitos tributários —, com a participação apenas de representantes da Fazenda Nacional. Algo tão sem sentido numa democracia que deverá ser discutido na Justiça. No Carf, devido à distribuição dos conselheiros e pelo fato de ser necessária a maioria de três quintos dos votos (60%) para a aprovação de qualquer matéria, os representantes da Fazenda não conseguem conduzir os veredictos sozinhos. Mas no Cosat farão isso, como se voltássemos à ditadura.

É bastante provável que o gabinete do ministro Paulo Guedes, conhecido e autoproclamado liberal, não tenha acompanhado a tramitação do surgimento do novo conselho.

Adubando o agronegócio – Editorial | O Estado de S. Paulo

Boas notícias para o setor mais competitivo da economia brasileira, o agronegócio, foram anunciadas no começo de outubro pelo governo. Crédito mais farto e mais barato poderá resultar da MP do Agro, Medida Provisória assinada no dia 1.º de outubro. No mesmo dia foi lançado o AgroNordeste, programa de apoio a pequenos e médios produtores nordestinos. São resultados tangíveis, produzidos por um Ministério empenhado em ampliar e aperfeiçoar políticas bem-sucedidas em administrações anteriores. A ministra Tereza Cristina vem trabalhando com base numa herança acumulada durante décadas. Essa herança é visível no bom abastecimento interno e no sucesso comercial do agronegócio. Com exportações de US$ 64,57 bilhões entre janeiro e agosto, o setor acumulou superávit de US$ 55,34 bilhões em oito meses, garantindo ao País o excedente comercial de US$ 31,76 bilhões nesse período. O comércio de mercadorias continuou superavitário em setembro, graças principalmente à eficiência da agropecuária.

As duas novidades anunciadas no começo do mês devem contribuir para a continuação dessa história de sucesso. A MP do Agro deve possibilitar, na primeira etapa, a adição de R$ 5 bilhões ao crédito rural, segundo o subsecretário de Política Agrícola do Ministério da Economia, Rogério Boueri. Os produtores terão melhores condições de garantia, com a criação do Fundo de Aval Fraterno (FAF) e do patrimônio de afetação da propriedade rural. O FAF dependerá da formação de associações para sustentação do aval. Poderão participar produtores agropecuários, integrantes da cadeia produtiva, fornecedores de insumos e beneficiadores.

O acesso ao financiamento poderá ocorrer em condições mais fáceis e mais equilibradas com a adaptação do conceito de patrimônio de afetação. O candidato ao crédito poderá desmembrar sua propriedade para comprometer apenas uma parte como garantia. No velho sistema tem sido observada, com frequência, uma desproporção entre o bem imóvel apresentado pelo tomador e o valor do empréstimo. A pequena propriedade, os bens de família e os direitos de terceiros continuam preservados.

A MP do Agro também estende a empresas cerealistas o acesso a financiamento para construção e expansão de silos e armazéns, permite a emissão de títulos do agronegócio referenciados a moeda estrangeira e inclui novas instituições no sistema de crédito subvencionado. Esse tipo de financiamento, com equalização de taxas de juros, só era realizado por meio de bancos federais, bancos cooperativos e cooperativas de crédito. Com a MP do Agro, poderão participar do sistema todas as instituições envolvidas no crédito rural.

Todas as medidas voltadas para a melhora do sistema de garantias e ampliação da rede financiadora devem resultar, segundo a justificação oficial, em dinheiro mais barato e mais farto para o agronegócio.

O outro grande programa, o AgroNordeste, deve ser implantado neste ano e no próximo em 230 municípios de 9 Estados nordestinos e de parte de Minas Gerais, numa área com população rural de 1,7 milhão de pessoas. Esses municípios serão divididos em 12 territórios. A agenda inclui assistência técnica, facilitação de acesso a mercados diversificados, maior organização de produtores, garantia de segurança hídrica e desenvolvimento de produtos com qualidade e valor agregado. O trabalho, com apoio de entidades privadas e públicas, como o Sebrae e bancos oficiais, deve partir da análise da produção, da vocação produtora e das possibilidades de agregação de valor de cada área selecionada. Será, assinalou a ministra, uma expansão do conjunto de ações já executadas pelo Ministério.

Em vez de atacar os governadores e falar em restrição a recursos para o Nordeste, a ministra da Agricultura decidiu cuidar de um plano para fortalecer a região. Depois atribuiu a iniciativa a uma solicitação do presidente da República e o chamou para lançar o plano. Ela se tem especializado nesse tipo de ação. Já o havia realizado ao conversar com governantes muçulmanos irritados pela diplomacia trumpista do presidente Jair Bolsonaro no Oriente Médio.

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