- Nas entrelinhas | Correio Braziliense
“São dois problemas: um é genético, como as bactérias, os coronavírus estão em permanente evolução; o outro, a escala demográfica da China, com quase 1,386 bilhão de habitantes”
Radicado em São Paulo, o médico chinês Peter Liu, em vídeos postados nas redes sociais, afirma que a China perdeu o controle sobre a epidemia do coronavírus. Atribuiu a informação a sua irmã, deputada estadual em Pequim, no mesmo dia em que a capital chinesa registrava a primeira morte devido à doença. Segundo ele, as autoridades da cidade de Wuhan falharam pela demora em fechar as fronteiras: “Quando decidiram fechar, já haviam saído 300 mil pessoas de Wuhan para o mundo, para a China inteira”, afirmou. “A minha irmã falou que na China todas as cidades estão infectadas, em todas as cidades têm pessoas que já têm o problema”, completou.
Ontem, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou como “elevado” o risco internacional de contaminação pelo novo coronavírus. Retificou a avaliação feita anteriormente pela própria instituição, que assumiu o “erro de formulação” ao apontar o risco como “moderado”. Até o começo da tarde, os dados oficiais apontavam 81 mortes e mais de 2,7 mil pacientes infectados. A epidemia de coronavírus na China gerou drásticas restrições ao transporte de pessoas e mercadorias, paralisia do turismo e queda do consumo,e já ameaça agravar a desaceleração da economia chinesa.
Pequim adotou medidas de confinamento sem precedentes: em plenas festividades do Ano Novo chinês, o governo suspendeu as viagens organizadas na China e para o exterior, um duro golpe para o turismo. Wuhan virou “cidade proibida”, embora seja um “hub logístico” e centro de produção de automóveis da província de Hubei. Nela está instalada a Dongfeng, segunda fabricante automotiva chinesa, que tem parcerias com as francesas Renault e PSA, com fábricas instaladas na região. Produz 1,7 milhão de veículos. O setor automotivo gera negócios de mais de 58 bilhões de dólares por ano.
Os coronavírus (CoV) são uma grande família viral, conhecidos desde meados dos anos 1960, que causam infecções respiratórias em seres humanos e em animais. Infecções por coronavírus causam doenças respiratórias leves e moderadas, semelhantes a um resfriado comum. Alguns coronavírus, porém, podem causar síndromes respiratórias graves, como a que ficou conhecida pela sigla SARS ( Severe Acute Respiratory Syndrome). SARS é causada pelo coronavírus associado à SARS (SARS-CoV), sendo os primeiros relatos na China em 2002.
Evolução
O SARS-CoV se disseminou rapidamente para mais de doze países na América do Norte, América do Sul, Europa e Asia, causando em torno de 800 mortes, antes da epidemia global de SARS ser controlada em 2003. Em 2012, foi isolado outro novo coronavírus, distinto daquele que causou a SARS, na Arábia Saudita e, posteriormente, em outros países do Oriente Médio, na Europa e na África. Por isso, a doença passou a ser designada como síndrome respiratória do Oriente Médio, cuja sigla é MERS (Middle East Respiratory Syndrome). Agora, surgiu outro coronavírus na China.
De acordo com as investigações em andamento, o novo coronavírus pode ter origem em serpentes ou morcegos, porém não existe consenso entre os cientistas sobre isso. Coronavírus diferentes podem sofrer mutações e se recombinar, dando origem a agentes inéditos. Pulando entre espécies animais (os hospedeiros), eles eventualmente chegam aos seres humanos. É um processo que tem semelhanças com o que acontece na gripe. Na gripe suína, um porco pegou o vírus de aves e, na recombinação de vírus diferentes dentro do animal, surgiu um H1N1 que conseguiu migrar para os seres humanos.
São dois problemas: um é genético, como as bactérias, os coronavírus estão em permanente evolução; o outro, a escala demográfica da China, com quase 1,386 bilhão de habitantes, o que faz de qualquer erro de planejamento econômico ou de políticas públicas uma tragédia nacional. O governo chinês corre contra o tempo para evitar que a epidemia se alastre ainda mais e se torne uma pandemia, mas o coronavírus já afeta os negócios e a imagem dos chineses. Enquanto tenta encontrar uma vacina eficaz, a China se fecha novamente para o mundo.
Um exemplo de como a escala da China pune o erro de forma dramática foi o Grande Salto para Frente (1958-1962), um programa de profundas reformas de Mao Tsé-tung, cujo objetivo era acelerar a marcha para o comunismo. As Comunas Populares reuniam cerca de 20 mil a 30 mil pessoas, criando uma unidade social, agrícola, industrial, administrativa, cultural, médica e militar. O resultado dessa estratégia, porém, foi a desorganização da economia e a fome em massa, que matou pelo menos 18 milhões de chineses. Alguns estudos, porém, sugerem que o número de mortos foi mais próximo de 55,6 milhões.
Nenhum comentário:
Postar um comentário