- O Globo
Nem diante da pandemia o governo disfarça seu desprezo pelos mais pobres. Ontem Bolsonaro disse que o brasileiro mergulha no esgoto e “não pega nada”
Enquanto o resto do mundo faz um esforço de guerra contra o coronavírus, o Planalto quer derrotar a epidemia sem fazer nada. Depois de atacar a política de isolamento social, Jair Bolsonaro disse que a responsabilidade de enfrentar a doença não é do governo. “O brasileiro tem que entender que quem vai salvar a vida dele é ele, pô!”, afirmou ontem, na porta do Alvorada.
Na contramão da comunidade científica, o presidente sustenta que o país deveria relaxar as medidas de distanciamento e confinar apenas a população idosa, mais vulnerável ao vírus. É uma tese furada, contestada por todos os especialistas sérios. Países que retardaram a quarentena obrigatória, como a Itália, produziram milhares de mortes que poderiam ter sido evitadas.
Além disso, não há como separar todos os idosos de seus parentes. Em boa parte dos lares brasileiros, famílias inteiras dividem um único cômodo, em condições precárias de moradia e saneamento.
Diante da omissão presidencial, parlamentares e governadores tentam assumir tarefas que caberiam ao Planalto. Os estados montaram uma frente para negociar diretamente com os ministros da Economia e da Saúde, sem passar por Bolsonaro. A Câmara aprovou o “coronavoucher” de R$ 600 para ajudar pessoas de baixa renda. Pelos planos de Paulo Guedes, o valor da ajuda seria de apenas R$ 200.
Nem diante da pandemia o governo disfarça seu desprezo pelos mais pobres. Neste mês, o Ministério da Cidadania cortou 158 mil benefícios do Bolsa Família, a maioria no Nordeste. A medida foi suspensa na segunda-feira por decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal.
No despejo in natura de ontem, Bolsonaro voltou a chafurdar na lama da demofobia e da ignorância. “O brasileiro precisa ser estudado. Ele não pega nada. Você vê o cara pulando em esgoto ali, sai, mergulha, tá certo? E não acontece nada com ele”, afirmou.
Nos últimos cinco anos, o SUS gastou mais de R$ 1 bilhão para tratar doenças causadas pela falta de saneamento básico. Só em 2017, o problema motivou cerca de 260 mil internações nos hospitais.
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