- Folha de S. Paulo
Cinismo considera 'liberdade de expressão' o gabinete do ódio instalado dentro do governo
Ao longo de 50 anos de jornalismo, 30 deles atuando como comentarista político, Carlos Castelo Branco, o Castelinho, enfrentou duas ditaduras —a de Vargas e a dos militares— e nunca ouviu do presidente da República, mesmo que este fosse um general de maus bofes, gritos de “Cala a boca!” e “Acabou, porra!”. Em compensação, em mais de 8.000 colunas publicadas no Jornal do Brasil, ele jamais tratou de Bolsonaro. Ô sorte!
O centenário de nascimento de Castelinho, no dia 25 de junho, coincide com mais uma grave crise institucional no país, que envolve diretamente a imprensa. Não é novidade que déspotas agem para controlar a mídia. Quando não conseguem, espumam de ódio e usam todo tipo de método para alcançar seu objetivo: intimidação, censura, estrangulamento financeiro, prisão e até assassinato.
A morte do filho de Castelinho, Rodrigo, num acidente de carro em Brasília, em 1976, gerou no jornalista a desconfiança de que o desastre fora premeditado pelo Serviço Nacional de Informações, um aviso e uma vingança contra seus artigos de opinião.
A mentira —que no Brasil dos macaqueadores de Trump foi rebatizada de fake news— é outra poderosa arma de controle. O cinismo atual considera “liberdade de expressão” o funcionamento, dentro do Palácio do Planalto, de um bunker digital, comandado pelo filho do presidente, Carlos Bolsonaro, e financiado por empresários e pelo próprio governo —o qual se especializou em produzir e espalhar ameaças, ofensas e calúnias contra políticos, autoridades, jornalistas, artistas e ministros do STF.
Nos mais duros períodos do regime militar, Castelinho não tinha liberdade de expressão. “Procuro dizer as coisas que estão proibidas de maneira que eu as possa dizer”, ensinava ele. A verdade era lida nas entrelinhas de seus textos. Ao contrário de hoje, quando a mentira é escancarada com todas as letras.
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