- Revista Veja
Jair Bolsonaro testou negativo para o exercício da Presidência
Os testes a que o presidente constantemente submete a República não têm apresentado bons resultados para ele. Jair Bolsonaro vem sendo reprovado numa prova atrás da outra. Obtém notas baixíssimas em matéria de relações institucionais, respeitabilidade, credibilidade, confiabilidade, civilidade e demais quesitos que atinge com suas afrontas, resultando em danos irreparáveis definidores de seu destino.
Para usar expressão da circunstância atual, Bolsonaro testou negativo para o exercício da Presidência da República. Quis o bom senso que repetidas derrotas mostrassem o diagnóstico de falso positivo na expectativa de alguns temerosos, e outros tantos esperançosos, de que a passagem dele pelo cargo levaria o país às trevas do retrocesso.
Do fracasso da chamada pauta conservadora, no começo do governo, à recente condição de alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal, passando pela perda de mais de 20 pontos no porcentual de apoio do eleitorado original, só acumulou passivos sem ganhar nenhum ativo consistente. Concretamente, seus desafios aos limites têm sido limitados pela indisposição das Armadas em fazer uso da força, pelas balizas da Constituição nas mãos do STF, por um frágil respaldo no Congresso e pela carência de sustentação em maioria popular.
Não obstante a necessidade de estreita e constante vigilância, que de resto tem sido exercida, se alguém tem algo a temer é o presidente. O ambiente de veneno e turbulência que Bolsonaro cria com suas exorbitâncias é passageiro. Perdemos momentaneamente a estabilidade, mas ele, se não perder o cargo antes do prazo regulamentar, pode desde já perder as esperanças de ser reeleito.
“Atualmente, o esforço dele não é o confronto com a esquerda. Imprescindível para Bolsonaro é brigar com o centro”
Falava no início sobre os testes que o presidente aplica à República e de como vem sendo reprovado em todos eles. No meu tempo de colégio chamava-se segunda época. Hoje o conceito é o de “recuperação”. Vamos adotá-lo, então, para exercitar hipóteses de cenários pós-pandemia, entre os quais a possibilidade de Bolsonaro se recuperar dos reveses e conseguir chegar politicamente vivo a 2022.
Atualmente, o esforço dele não é o confronto com a esquerda. Não se afasta desse embate, dada a utilidade do PT na condição de plantonista na antessala do bicho-papão, mas por ora vê outros inimigos a ser enfrentados com urgência: os que formam nas fileiras da legalidade e da normalidade. Olhando com percepção adequada da realidade à volta vê-se a inexistência da chance de os petistas ganharem uma eleição.
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Entre outros motivos porque aos 42 milhões de brasileiros adeptos da ausência e dos votos nulos ou em branco em 2018 juntaram-se outros cerca de 20 milhões que já desembarcaram da canoa bolsonarista. A estes acrescentem-se os eleitores de Fernando Haddad por exclusão, com má vontade, e teremos um contingente enorme de gente convencida de que extremos, ainda mais quando já testados, não produzem boa coisa.
Imprescindível, portanto, para Bolsonaro é brigar com o centro. Isso ele tem feito ao apostar no sentimento de descrédito (apontando fraudes nas eleições, por exemplo) para tentar manter acesa a chama da ilusão em soluções tão drásticas e instantâneas quanto inexequíveis por equivocadas.
É difícil convencer a seguir por aí um eleitorado farto de batalhas vãs travadas no campo das falsas esperanças.
Publicado em VEJA de 13 de maio de 2020, edição nº 2686
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