sábado, 12 de setembro de 2020

Centenário da UFRJ reforça que é preciso apoiar a Ciência e as Artes – Editorial | O Globo

A ideologia anti-intelectualista do governo é o pano de fundo para o corte nas verbas das universidades

Os 100 anos da fundação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), completados nesta semana, merecem uma comemoração especial. São uma afirmação da sociedade brasileira em defesa da Ciência e das Artes, num momento em que professores, artistas, pesquisadores e tudo o que se relaciona ao conhecimento acadêmico e à produção intelectual é desvalorizado pelo governo de turno em Brasília.

A história da UFRJ remonta à vitória sobre outra pandemia. Em 1920, ano da sua fundação, o Brasil acabara de se livrar da Gripe Espanhola, que deixara 35 mil mortos no país (segundo algumas estimativas, 100 milhões no mundo). A Faculdade de Medicina, de 1808, foi decisiva para enfrentar aquele outro vírus, que transformara o Rio de Janeiro numa usina de cadáveres. Foi um dos embriões da UFRJ ao lado da Politécnica (1792), a primeira escola de engenharia das Américas, e da Faculdade de Direito (1891).

Que os cientistas precisavam estar preparados para um embate que transcende as fronteiras da academia, estava claro desde pelo menos 1904, ano da Revolta da Vacina. Na ocasião, políticos ajudaram a criar uma onda negacionista violenta contra a determinação — correta e essencial — de Oswaldo Cruz para que todos fossem imunizados contra a varíola. Havia intenções golpistas contra o presidente Rodrigues Alves, numa campanha que manipulava a ignorância do povo contra o avanço da Ciência.

Era uma prévia do que aconteceria mais de um século depois. Enquanto a universidade completa o centenário, as redes sociais se tornaram um manancial de desinformação sobre a Covid-19. É nelas que o presidente Bolsonaro e seus seguidores defendem medicamentos inócuos e combatem medidas preventivas. Se em 1904 politizaram a vacina, hoje politizam a doença.

Novamente, a UFRJ desempenha um papel central na defesa das luzes contra as trevas, em particular por meio de seus laboratórios e centros tecnológicos. Entre as várias atividades voltadas para o novo coronavírus, cientistas desenvolveram o protótipo de um respirador pulmonar de baixo custo, trabalham em testes para aplicação em massa e aperfeiçoam um soro para tratar pacientes da Covid-19, obtido a partir de pesquisa com cavalos.

Passa um século, e persiste a miopia de políticos diante da Ciência. Um subproduto do anticientificismo reinante no governo são os cortes que o Ministério da Educação tem promovido nas universidades federais, a UFRJ entre elas. Um erro derivado de ignorância e ideologia.

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