Negar dados sobre aumento dos focos de incêndio na Amazônia não resolverá os graves problemas ambientais
Em agosto do ano passado, depois de o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelar aumento de 88% no desmatamento da Amazônia Legal em junho, a solução encontrada pelo presidente Jair Bolsonaro foi exonerar o presidente do órgão, Ricardo Galvão. Além de questionar os dados, classificados como “estranhos”, Bolsonaro insinuou que Galvão poderia estar a serviço de uma ONG.
Tem sido assim. Os dados não agradam? Detonam-se os dados, não os motivos que levaram a eles. A agonia ambiental da Amazônia, traduzida em queimadas, desmatamentos e extração ilegal de recursos naturais, tem chamuscado a imagem do Brasil no exterior. Prejudica o agronegócio e põe em risco acordos comerciais, como o Mercosul — União Europeia, propenso a fazer água. Mas a visão do governo continua embotada pela fumaça.
Em 11 de agosto, ao participar de uma videoconferência com presidentes de países da América do Sul, Bolsonaro disse que “essa história de que a Amazônia arde em fogo é uma mentira”. Atribuiu as críticas ao fato de o Brasil ser uma “potência no agronegócio”.
Num discurso alinhado com Bolsonaro, o vice Hamilton Mourão, presidente do Conselho da Amazônia, também tem posto panos quentes no debate. Em 27 de agosto, relativizou os focos de incêndio cada vez mais frequentes, alegando que, dada a extensão territorial, são como “agulha no palheiro”.
No mais recente desatino, Mourão e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, publicaram nas redes sociais um vídeo produzido por pecuaristas do Pará para dizer que a Amazônia não está em chamas. As imagens apresentam uma floresta onírica, onde não há fogo, motosserras ou mercúrio dos garimpos ilegais. Incluem até um mico-leão-dourado, espécie da Mata Atlântica que vive a milhares de quilômetros.
Longe do universo paralelo do Planalto, a realidade está em combustão. Dados do Inpe revelam que, em agosto, foram registrados 29.307 focos de incêndio na Amazônia, o segundo pior número em dez anos, atrás apenas do recorde batido no mesmo período do ano passado (30.900).
Em vez de questionar os dados sobre desmatamento e queimadas na Amazônia, repetindo o negacionismo de outras áreas como a Saúde, o governo deveria rever sua antipolítica para o Meio Ambiente. Que inclui o desmonte de órgãos de fiscalização, como Ibama e ICMBio; a desqualificação de institutos de competência reconhecida, como o Inpe; a manobra de aproveitar a pandemia para “passar a boiada” sobre normas ambientais; e o indisfarçável afago a madeireiros e garimpeiros ilegais. Pode-se alegar que, pela extensão do bioma, é um problema difícil de resolver. Quando se negam os fatos, aí fica impossível.
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