terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Andrea Jubé - “Fúria de titãs” na tela do Senado

- Valor Econômico

“Erro do MDB é não descer do altar da maior bancada”

”Não tem clima para um nome do MDB [na presidência do Senado]”, sentenciou à coluna um influente dirigente partidário na última semana.

Ressalto que este cacique atirou às cordas a maior bancada da Casa num cenário ainda menos adverso do que o de hoje, quando os seis senadores do PT se perfilaram ao postulante do DEM, Rodrigo Pacheco (MG) - candidato do presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Pacheco também é o escolhido do presidente Jair Bolsonaro, que está em campo na figura do filho, Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). O PP do senador Ciro Nogueira (PI) também já teria selado apoio a Pacheco, mas ainda não tornou pública a aliança.

É com esse enredo que, pela primeira vez em 20 anos, o MDB lança-se na disputa pela presidência do Senado sem o favoritismo histórico. Até a surpreendente vitória de Alcolumbre sobre Renan Calheiros (AL) em 2019, foram 18 anos sucessivos de hegemonia do partido na Casa.

A era emedebista teve início em 2001, com a acachapante vitória de Jáder Barbalho (PA) sobre o senador Arlindo Porto (PTB-MG), o inexpressivo candidato improvisado pelo todo-poderoso Antônio Carlos Magalhães (BA), do então PFL.

A partir de Jáder, sete emedebistas revezaram-se, sucessivamente, na cadeira da presidência, amparados pela “regra da proporcionalidade”, a tradição de que a maior bancada elege o presidente.

Depois do ex-governador do Pará, vieram: Edison Lobão (MA), Ramez Tebet (MS), José Sarney (AP), Renan Calheiros, Garibaldi Alves (RN), Eunício Oliveira (CE).

Essa concentração de poder emedebista transbordou entre 2009 e 2016, quando o partido acumulou a presidência das duas Casas na maior parte do tempo. Nesses sete anos, enquanto Sarney e Renan alternaram-se na direção do Senado, os emedebistas Michel Temer (SP), Henrique Alves (RN) e Eduardo Cunha (RJ) deram as cartas na Câmara, com um petista no intervalo (Marco Maia-RS).

Em 2016, Cunha foi para o cadafalso, Rodrigo Maia (DEM-RJ) sentou na cadeira, e o resto é história. Os fatos mostram que a briga entre PFL/DEM e MDB pelo poder no Congresso é velha como a invenção da roda. Sarney ocupou a cadeira pela primeira vez em 1995, antes que o velho ACM ascendesse em 1997.

Uma liderança do MDB, que fez escola no Senado, disse à coluna que não vê toda essa “antipatia” à legenda entre os senadores. Reconhece, contudo, que as circunstâncias mudaram, e a “regra da proporcionalidade” não se aplica mais, automaticamente.

O que havia no passado era um “acordo de cavalheiros”, de que a maior bancada elegia o presidente porque formava a maioria a partir dessa prerrogativa. Quando Antônio Carlos Magalhães tentou violar essa regra tácita em 2001, mesmo com toda a força política, saiu derrotado. “Hoje essa tradição não basta”, admite este emedebista.

Segundo ele, embora representante do DEM, com cinco senadores, Davi Alcolumbre fez um bom trabalho, construiu uma rede de relacionamentos e laços de confiança. Seria reconduzido sem sustos, se o Supremo Tribunal Federal (STF) não tivesse feito a opção pela Constituição Federal.

Assim, quando derrotou Renan há dois anos, Alcolumbre incorporou o Davi que abateu o gigante Golias, e, ao mesmo tempo, rompeu com a velha tradição.

Quando Jáder derrotou o candidato de ACM em 2001, o MDB tinha uma bancada de 38 senadores. Nos tempos de Jáder, Sarney e Renan, a bancada emedebista oscilava, em média, entre 25 e 30 senadores.

Com o “tsunami” que atingiu o MDB nas urnas em 2018, não se reelegeram gigantes como Romero Jucá (RR), Eunício, Lobão e Roberto Requião (PR). A bancada encolheu e, mesmo majoritária, tem 13 integrantes. Hoje aumentará para 15 representantes, com a volta de Rose de Freitas (ES), que desfalca o Podemos, e o ingresso de Veneziano do Rêgo (PB), ex-PSB.

Em paralelo ao encolhimento do MDB, outros partidos inflaram. A renovação de quadros gerou equilíbrio entre as bancadas: o PSD encostou no MDB com 11 integrantes. Sem Rose, o Podemos ficará com nove.

Nessa nova conjuntura, as demais lideranças do Senado passaram a questionar a hegemonia de um partido imposta exclusivamente pelo tamanho da bancada. Por isso, o recado ao MDB é de que, antes de exercer a maioria, será necessário construí-la.

A contabilidade do grupo de Rodrigo Pacheco indica que o candidato de Alcolumbre e do Planalto larga com 37 votos. Sem abater os dissidentes, é a soma dos votos de DEM (5), PSD (11), Republicanos (2), PL (3), PROS (3), PT (6), PP (7).

Pela mesma matemática, sem excluir dissidentes, o MDB não fica muito para trás, e larga com 31, se conseguir trazer Podemos e PSDB. A soma seria: MDB (15), Podemos (9), PSDB (7).

Há dissidentes notórios, entretanto: Roberto Rocha (MA) é tucano, mas é fechado com Alcolumbre desde o berço.

Em 2001, a prerrogativa de que a maior bancada deveria eleger o presidente do Senado foi confrontada, e prevaleceu. Duas décadas depois, está novamente em xeque.

Em 2001 o MDB tinha um cacique, o então presidente da sigla, Jáder Barbalho, contra um oponente que era considerado um “sparring”. Agora o MDB vem igualmente forte: Eduardo Braga é líder da bancada, e foi governador do Amazonas. Simone Tebet (MS) é presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e filha de ex-presidente da Casa.

O adversário é um senador de primeiro mandato, mas com uma biografia mais encorpada que a de Arlindo Porto. Foi presidente da CCJ na Câmara, e entra em campo carregado nos ombros pelos presidentes do Senado e do Executivo.

Um outro dirigente partidário diz que falta ao MDB humildade para interpretar a nova correlação de forças no Senado. “O erro do MDB é não descer do altar da maior bancada”.

Se em 2019, o filme que passou na tela da TV Senado foi “Davi e Golias”, a programação agora oferece outro clássico: “Fúria de titãs”.

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