O Globo
Não resta espaço para dúvida de que o
ministro da Defesa, general Braga Netto, mandou o recado ao presidente da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL), ameaçando caso o voto impresso não fosse aprovado.
Lira trucou a ameaça e, como o governo Jair
Bolsonaro tem DNA golpista, mas é eminentemente composto de pessoas
despreparadas e algo covardes, o presidente e seu general recolheram as
ameaças, ao menos por ora, e o resultado foi que o PP e o Centrão avançaram
algumas casas para tomar conta de tudo — se apossando de novo até de espaços
dos militares.
Foi o Centrão que tirou o general Eduardo
Pazuello da Saúde. Mantendo Roberto Dias, o assessor que o general e seu sub, o
coronel Elcio Franco, não conseguiram demitir.
Agora é de novo um alto expoente do PP, seu
presidente, Ciro Nogueira, que faz outro general pegar o quepe. Luiz Ramos,
assim como Pazuello, verga a espinha e aceita ir para um ministério de menor
importância.
O mesmo faz Paulo Guedes, ao bater continência para o capitão e para a ala política que já comanda a maior parte do Orçamento e aceitar perder um naco de seu “superministério” para acomodar outro demitido de luxo.
Para onde esses arranjos por baixo da mesa
levam o Brasil? Para a esculhambação institucional e política a cada dia mais
absoluta e para a constatação óbvia de que não temos um governo, mas uma bodega
tocada à base de muita fisiologia, nenhum trabalho, zero planejamento e uma
única ideia fixa: a reeleição cada vez mais difícil de alguém que nunca poderia
presidir qualquer país.
Quem ameaçou, Braga Netto, e o aliado de
quem foi ameaçado, Ciro Nogueira, dividirão a mesa às reuniões ministeriais
como se nada tivesse acontecido. O resto das autoridades, aquelas a quem sempre
cobro neste espaço, seguirão fingindo acreditar nos desmentidos frouxos, sem se
dar conta de que, de bravata em bravata, vai-se corroendo a democracia a partir
de dentro.
Está claro que Braga Netto não fala em nome
do conjunto das Forças Armadas. Mas também resta evidente que a quantidade de
golpistas que ousam dizer suas ideias em voz alta é maior hoje no meio militar
que em 2018. Isso já é altamente nocivo para o ambiente político e institucional
brasileiro. E nos cobrará um preço enorme.
Também é evidente que Lira, Nogueira e os
demais “progressistas” — ah, as ironias das siglas partidárias — não vão com
Bolsonaro para uma tentativa canhestra de invasão do Congresso, à Trump. Mas
também é cristalino quanto ganharam poder e dinheiro do Orçamento, em múltiplas
frentes, só para blindar o presidente e tentar ajudá-lo a se livrar da CPI da
Covid e a emplacar seus nomes no Senado.
Além dos bilhões das emendas do relator,
nome oficial do orçamento secreto cujo tesoureiro é Lira, agora há o fundão
multiplicado. Será que Bolsonaro, agora que o PP deixou vazar a ameaça de Braga
Netto e que Ciro Nogueira está de mudança para o Planalto, vai mesmo vetar a
farra? Ainda mais diante da possibilidade de fusão de PSL, PP e DEM, partido
que pode ser seu próprio destino numa cara campanha eleitoral no ano que vem?
Difícil de acreditar nisso, hein?
Não espanta que Bolsonaro, diante desse
cenário, declare seu amor filial ao Centrão. Nem mesmo surpreende que os
militares, tirados por ele da caserna, comecem a demonstrar nostalgia da
ditadura.
Mas chama muito a atenção o silêncio
covarde dos que se diziam democratas, iam às ruas pedir o fim da corrupção — e
agora se calam diante da escalada diária de mortes, ruína social e econômica e
autoritarismo.
São industriais, integrantes do mercado, profissionais liberais e outros que apertaram 17 e agora não têm a coragem de admitir que elegeram o pior presidente do Brasil. São tão cúmplices quanto os fardados e o Centrão.
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