Folha de S. Paulo
E na Casa Civil de um presidente que
prometera enterrar o toma-lá-dá-cá
Ciro
Nogueira na Casa Civil. Interessante. Nogueira não é um representante
qualquer do centrão. Ele é o tipo ideal mesmo do político sem apego a nenhum
ideário e que apoia qualquer governo, desde que receba contrapartidas em cargos
e verbas. Quando acha que já extraiu tudo o que poderia extrair, não hesita em
abandonar o dirigente ao qual fazia juras de amor eterno.
A Casa Civil tampouco é um ministério
qualquer. Ela é a coluna vertebral do governo. Por ela passam todos os atos da
administração, para avaliação técnica e política. Quando seu ocupante é
habilidoso, torna-se também o lugar de costura dos acordos que sustentam o
governo.
Ver Nogueira num ministério nem é tão surpreendente. Ele é um político bem típico daquilo que eleições costumam produzir e é com esses parlamentares que é preciso compor. Mas fica um ruído quando alguém como Nogueira vai para a Casa Civil da gestão de um presidente que prometera enterrar o toma-lá-dá-cá e que pusera seu general de estimação para cantar que todos os membros do centrão eram ladrões.
Para aqueles que, como eu, nunca esperaram
nada de bom de Bolsonaro, temos mais uma confirmação de sua pusilanimidade.
Mas, para aqueles que levaram a sério a campanha do capitão reformado, o
convite a Nogueira deve soar como uma traição.
Momentos como esse podem ser didáticos. O
cérebro tolera mal dissonâncias cognitivas, isto é, informações que vão de
encontro a nossas expectativas. Quando elas ocorrem, há duas soluções
possíveis. Ou o cérebro se pendura num pretexto qualquer para ignorar o dado
que provoca a dissonância ou aproveita a ocasião para rever suas crenças,
aproximando-as da realidade, num processo que alguns chamam de amadurecimento.
Digo isso com conhecimento de causa. Foi uma dissonância dessas, 16 anos atrás, que me fez ver que o partido pelo qual eu tinha simpatias não era essencialmente diferente dos outros.
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