Folha de S. Paulo
Bolsonaro, com todos os defeitos, tem a
aprovação de metade do patronato
De volta ao personagem criado pela escrita
cínica de
Michel Temer —cumprido o breve intervalo de autenticidade na ONU—,
Jair Bolsonaro sugere estar agora dedicado ao papel de cômico. Palhaço, mesmo.
Cambalhotas verbais de um lado a outro. Mas, sem sair do roteiro de falsidades
manjadas, não escapa da vaia. O deprimente, para a arquibancada, é que o
Bolsonaro em exibição não é apenas o falacioso visto no comentarismo político.
Tem mais e maior significação.
E aí está o escândalo que não faz escândalo: o Bolsonaro tal qual é, com todos os defeitos pessoais, a destrutividade e as anticivilidades que nenhum país pode suportar, tem a aprovação e o apoio de um em cada dois integrantes do patronato (retomo a nomenclatura abolida já no começo da ditadura, por iniciativa do dúbio Jornal do Brasil). Os integrantes desse segmento bolsonoide perfazem 47% da classe, quando, entre os brasileiros maiores de 16 anos, só 22% de fato batem palmas a Bolsonaro. Ou uma em cada cinco pessoas.
Bolsonaro não
representou na ONU, nem o faz em outro lugar, a população brasileira.
Se, como quer a interpretação divulgada, discursou para os seus apoiadores,
sobretudo falou por metade do numeroso patronato. Foi ali a voz dos objetivos e
dos modos a que esse segmento aplaude pelo que fazem no e com o país.
Só há desvantagens em atribuir
irrepresentatividade a Bolsonaro. Não é verdade, não ajuda a tentar compreender
as realidades e o necessário para o presente e o amanhã, e emburrece. Bolsonaro
e o Brasil por ele descrito são reconhecidos no restante do mundo como fraudes
grotescas. Aqui, porém, o fraudulento e a própria fraude são realidades
aprovadas e apoiadas por metade da força socioeconômica, e portanto política,
que mais tem influído no destino do país.
Dois títulos do noticiário recente bastam
para configurar o presente e sua promessa de futuro. Um, “46
milhões vivem em lares sem renda do trabalho, diz Ipea” (remuneração
de trabalho não é renda, mas vá lá). O outro, “Está
faltando comida na mesa de novo, diz Luiza Trajano”, esse monumento
feminino que emerge do melhor patronato.
OS DE LÁ
O governo Joe Biden tem pressa. A cada
semana, uma negação das expectativas pessoais e políticas que lhe entregaram a
presidência. Mentiras em inglês, no entanto, são mais digeríveis.
A chamada Crise dos Foguetes, que levou o
mundo à beira da guerra nuclear, foi evitada pela admissão do governo Kennedy
de retirar bases de mísseis que circundavam a União Soviética. Em troca, os
soviéticos retiravam seus mísseis plantados em Cuba. A aliança militar com que
Joe Biden avança em novo cerco, dessa vez à China, recriam a Guerra Fria que
ele nega —sabe-se o que esperar daí.
Kamala
Harris, vista pelo mundo como um anteparo de inteligência e humanismo
a eventuais deslizes do governo, fez um
tour nas vizinhanças da China com explícita incitação antichinesa.
Encarregada do problema da imigração ilegal, não deu resposta à violência
cavalariana para bloquear ou prender os haitianos que, desarvorados pela
miséria, tentaram entrar nos Estados Unidos. Por certo, ao menos leu o
pedido de demissão do enviado especial de Biden ao Haiti, Daniel
Foote, recusando-se a “compactuar com a política desumana da Casa Branca” para
o mais pobre país das Américas.
SEMPRE MAIS
O meio bilhão a ser gasto com propaganda
das “realizações do governo” e diferentes pesquisas, já agendada para novembro
a concorrência publicitária, na verdade é um projeto de crime eleitoral. E
ainda desvio criminoso de dinheiro público. Ou rachadinha com o Tesouro
Nacional.
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