Revista Veja
Os trabalhadores do país não estão
interessados em luta de classes
Um episódio patético — a invasão da bolsa
de valores por movimentos sociais ligados a partidos políticos — desperta a
atenção para o tema do conflito social no Brasil. Em pleno século XXI, o Brasil
se presta ao ridículo de manifestações desse tipo. Por quê? A desigualdade
social e a precária educação permitem que uma massa de manobra de ignorantes se
preste a esse papel de servir a “Pinks e Cérebros” da política. O evento teve
pouca ou nenhuma repercussão.
O fato de haver manifestações que caem no
vazio da cidadania deve ser observado. Principalmente por não representarem nem
o campo nem a agenda do conflito social do século XXI. Por exemplo, imaginemos
que a solução dos ideólogos comunistas para a agricultura fosse implantada no
país. Quantos milhões de brasileiros morreriam de fome, como morreram na União
Soviética e na China? Longe de ser perfeito, o nosso modelo de agronegócio
trouxe fartura para o campo e, de certa maneira, proteção ao meio ambiente.
Aqui não faço um juízo de valor das ideologias, no entanto não posso deixar de dizer que o grande valor da esquerda foi inserir temas na pauta política que resultaram no aperfeiçoamento do capitalismo. Em compensação, o “reacionário” Bismarck foi introdutor de políticas sociais avançadas. Assim como Vargas, o “pai dos pobres”, que fez a CLT inspirada na Carta del Lavoro, de Mussolini. O mundo, ideologicamente falando, é uma grande salada juliana. As boas soluções não vêm carimbadas por ideologia. São fruto da observação desprovida de preconceitos e com muita reflexão.
“Todos querem ser consumidores e miram,
cada um à sua maneira, uma vida com menos sofrimento”
O campo de batalha para o conflito social
deve estar nas políticas públicas que tragam fartura para a mesa e trabalho
para quem precisa. Nesse sentido, a interminável discussão sobre o aperfeiçoamento
do Bolsa Família é impatriótica.
Em vez de invadir a bolsa de valores, os
movimentos sociais fariam melhor em propor uma mudança radical do sistema
tributário, desonerando investimentos e a folha de pagamentos e promovendo o
emprego e o cooperativismo e lutando para destravar o investimento. Este, sim,
é um conflito social que deveríamos ter no Brasil.
É certo dizer que o Brasil tem problemas do
século XIX. E que nosso modelo de gestão — burocrático, intervencionista e
estatizante — não resolveu nossos problemas. Contudo, lamentavelmente, as
forças que se mobilizam com o discurso da injustiça social não estão
interessadas no aperfeiçoamento do sistema. Não é uma briga de interesses pelos
mais necessitados. É uma briga de poder baseada na vontade egocêntrica de
alguns de querer mudar um mundo que já não existe a partir de ideias que nunca
deram certo.
A ironia em nosso país é que os
trabalhadores não querem mais ser trabalhadores em seu sentido clássico. Não
sabem o que é luta de classes e tampouco estão interessados nela. Porém todos,
sem exceção, querem ser consumidores e miram, cada um à sua maneira, uma vida
com menos sofrimento. As agendas propostas pelos movimentos sociais
partidarizados e pelo mundo político demoram a endereçar tais questões.
Publicado em VEJA de 13 de outubro de
2021, edição nº 2759
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