O Estado de S. Paulo
Bolsonaro depõe na PF sobre a PF, fala o que quer e Moro não pode questionar
O “depoimento” do presidente Jair Bolsonaro
à Polícia Federal sobre interferência política na própria PF contém histórias
mal contadas e os fatos desmentem a versão de Bolsonaro e confirmam a do
ex-ministro Sérgio Moro. Ele saiu do governo atirando e gerou o inquérito
contra o presidente, mas nem ele nem seus advogados foram sequer avisados do
depoimento.
Segundo o ex-delegado Jorge Pontes, que se
formou no FBI, foi representante do Brasil na Interpol e fala o que os colegas
da ativa não podem, o presidente apresentou uma “denúncia vazia” contra Moro,
ao acusar o ministro de tentar chantageá-lo por uma vaga no Supremo.
É a palavra de um contra o outro, mas Moro
tem um trunfo: gravou no celular a proposta da deputada bolsonarista Carla
Zambelli de que, se voltasse atrás, teria o STF. Sua resposta: “Cara, eu não
estou à venda”. Por que diria uma coisa para o presidente e outra para a
deputada, de quem foi padrinho do casamento?
Bolsonaro disse que chamou o delegado
Carlos Henrique Souza para “conhecê-lo melhor”, antes de mandá-lo para a PF no
Rio, justamente onde corre o inquérito das rachadinhas contra a família. E
alegou “falta de produtividade” para trocar a PF em Pernambuco, apesar de não
ter a ver com isso e a gestão da delegada Carla Patrícia ser muito elogiada.
Moro acusou Bolsonaro de mexer no Rio e no diretor-geral, Maurício Valeixo, por questões políticas. Agora, às vésperas de se lançar ao Planalto, ele lembrou a reunião ministerial de 22 de abril de 2020, quando o presidente exigiu acesso a informações sigilosas e disse que não admitia investigações de pessoas próximas a ele.
Desde então, muita coisa mudou na PF, a começar
do perfil do diretor-geral. Se Valeixo era um quadro interno, de operação,
inteligência e administração, o escolhido para sucedê-lo, Alexandre Ramagem,
era amigo dos Bolsonaro e o atual, Paulo Maiurino, fez carreira entre
Judiciário, Legislativo e governos estaduais.
O perfil político se expande na cúpula e
nas mudanças polêmicas no DF, no Amazonas e, novamente, no Rio. E com um
hábito, que não é de hoje, de compensar os “próximos” com cargos e gordos
salários em dólares no exterior. Exemplos: o ex-diretorgeral Fernando Segovia
em Roma, Eugênio Ricca em Washington, Sandro Avelar em Londres.
Com todos os defeitos da era Lula, a PF
teve autonomia para investigar mensalão e petrolão e indiciar o irmão do
presidente, Vavá, por tráfico de influência. Agora, a “boiada” passa, para
proteger os amigos do rei e recompensar “delegados políticos”. Mas governos vêm
e vão, a PF fica. E é uma corporação sólida e orgulhosa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário