Folha de S. Paulo
Governo ainda não diz para quem e como vai
pagar benefícios e corre risco no Congresso
O Auxílio
Brasil ainda não existe. O dinheiro para pagar o Auxílio Brasil também
não. Talvez não exista dindim para bancar a aprovação desse e outros gastos no
Congresso. É difícil acreditar que deputados e senadores deixem de aprovar uma
renda básica para pobres, faltando menos de um ano para a eleição. Mas o caldo
político engrossou, há problemas na Justiça e os prazos para entregar o
benefício ao povo miúdo estão quase estourados.
O Auxílio Brasil por ora é apenas uma
medida provisória oca. Ali não se diz quanto será pago a cada família, nem
exatamente para quais, nem como, afora para aquelas que já
estão no Bolsa Família e olhe lá. Faltam poucos dias para definir isso
tudo e muito mais.
O Congresso ainda está longe de chancelar a
contabilidade criativa e o calote que vão financiar (também) o Auxílio Brasil.
Sem isso, dá para pagar benefícios neste ano. Para 2022, só tem dinheiro para
bancar o velho Bolsa Família (cerca de R$ 190 mensais para 15,6 milhões, não R$
400 para 17 milhões, como quer o governo).
Cabalar votos com o dinheiro de emendas parlamentares ficou mais difícil. A ministra Rosa Weber, do Supremo, suspendeu o pagamento das "emendas de relator" (mudanças de destinação de verba do Orçamento definidas pelo parlamentar que redige a proposta final da lei orçamentária. Em geral, beneficiam os escolhidos pelos chefes do centrão).
As "emendas de relator", o
Bolsolão, pagaram muitos dos votos que aprovaram na Câmara, em primeira rodada
de votação, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que formaliza
o calote de parte dos precatórios e muda o reajuste do limite de
despesas federais. Mas falta o segundo turno na Câmara, faltam dois turnos no
Senado.
Na semana que vem, o Supremo deve decidir
se barra de vez as "emendas de relator". Na melhor das hipóteses
(para o governismo), a mera indefinição vai dificultar os negócios na Câmara e
no Senado, já bastante indócil.
Além de reajustar o teto
de gastos, a PEC autoriza o governo a deixar de honrar pelo menos R$ 47
bilhões dos R$ 89 bilhões de precatórios que deveria pagar em 2022, calote que
não cai bem no Senado e pode terminar na Justiça. O reajuste do teto deve
render quase outro tanto de dinheiro para o Orçamento federal.
No entanto, o governo precisa de R$ 47
bilhões extras apenas para pagar o Auxílio Brasil em 2022. Diz que vai precisar
de outros R$ 24 bilhões extras para pagar reajustes de benefícios
previdenciários (pois a inflação será maior do que a prevista pelo projeto de
lei orçamentária).
Vai sobrar pouco para emendas parlamentares
extras, de relator ou outra mumunha que inventem. Se o Supremo derrubar as
"emendas de relator" e se o Congresso não fizer algum acordão de
gastos, Jair Bolsonaro terá mais problemas para sustentar a "velha
política".
Se a PEC dos Precatórios não passar ou for
amputada de modo essencial, o governo terá de improvisar ainda mais, mais do
que fez com o Auxílio Brasil, por incapacidade técnica, negligência e
laborfobia. Teria então de pagar algum auxílio para os pobres com créditos
extraordinários, o que é em tese ilegal. Sabe-se lá como arrumará dinheiro para
bancar o reajuste extra dos benefícios previdenciários etc.
O pessoal do Congresso não nasceu ontem,
quase sempre se arruma. A mutreta fiscal, judicial e política está meio
liberada. Quase ninguém no sistema de poder quer degolar Bolsonaro na Justiça
ou por impeachment, de resto. É verdade que o PIB
de 2022 está sendo dissolvido no ácido dos juros da praça financeira,
mas Bolsonaro e centrão não estão nem aí. No entanto, aumentou o risco de dar
besteira até para a turma da safadagem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário