Valor Econômico
Afora o bem-vindo declínio da inflação, a
chance de o ambiente doméstico em 2022 ser melhor do que o de 2021 é pequena
Em 23 de dezembro do ano passado,
apresentei nesta coluna minhas previsões sobre o que não ocorreria no Brasil
neste ano. Minha esperança era terminar errando ao menos algumas dessas
projeções. Não foi o caso. Apresento agora minhas expectativas do que não
ocorrerá em 2022, em particular para os temas que discuti na última coluna de
2020:
Nenhuma medida relacionada à Reforma
Administrativa foi aprovada pelo Congresso neste ano. A probabilidade dessa
reforma evoluir em 2022 é próxima a zero.
Nenhuma parte da Reforma Tributária foi
aprovada no Congresso em 2021. A Câmara dos Deputados até que aprovou mudanças
da legislação do Imposto de Renda, mas, de tão ruins, não foram adiante no
Senado. A esperança é de que ao menos o tema seja debatido nas duas casas legislativas
e entre os candidatos à Presidência da República em 2022 de forma a aumentar a
chance de aprovação em 2023.
As renúncias tributárias que beneficiam os
principais grupos de interesse não foram reduzidas neste ano. Em 2022, não
haverá alteração desses privilégios.
O Brasil não implementou neste ano nenhuma medida estrutural para sair do grupo de países com os piores indicadores de qualidade da educação. Nada relevante foi feito pelo Ministério da Educação para recuperar a enorme perda de aprendizado provocada pela pandemia. O foco do governo definitivamente não é a educação e, portanto, não haverá nenhum progresso na área em 2022.
A pressão da sociedade, de governadores e
de prefeitos levou o governo federal a acelerar as compras de vacinas contra a
covid-19. Isso permitiu que o país alcançasse patamares significativos de
pessoas vacinadas. No entanto, não houve quase nenhum empenho do governo
federal e muito menos do presidente para estimular a vacinação, ficando o
esforço concentrado nos Estados e nos municípios. Não será diferente no próximo
ano.
Como programado, o Teto de Gastos não foi
cumprido em 2021, com a exclusão de algumas despesas do cômputo total. Como
essa dinâmica não mudará, a incerteza fiscal e a rigidez do orçamento
continuarão presentes em 2022. Apesar de sua indispensável reformulação, o
arcabouço fiscal dificilmente será objeto de discussão mais aprofundada na
campanha eleitoral.
O Executivo não adotou uma política
ambiental responsável nem trabalhou de forma efetiva para reduzir o
desmatamento. Ao contrário, o governo aprovou medidas que beneficiam a extração
de minerais preciosos em regiões que abrangem reservas indígenas. Esse cenário
não mudará em 2022.
O presidente continuou a criar celeumas
desnecessárias com a imprensa e com outros Poderes. Visando evitar o risco de
abertura de processos de impeachment, o governo aliou-se aos partidos do
Centrão e reduziu o embate com o Congresso. É possível que o atrito com o
Judiciário, em particular com a Justiça Eleitoral, aumente com a aproximação
das eleições.
Apesar de não ter havido nenhum
aprimoramento nas políticas de redução da pobreza, o governo elevou
substancialmente o benefício do Bolsa Família - agora Auxílio Brasil - de R$
190 por mês por família para, no mínimo, R$ 400 por mês em 2022. Foi o
principal destaque em termos de políticas sociais. Todavia, além de sua
efetividade para melhorar a qualidade de vida dos beneficiados não ser clara,
os projetos anunciados para integrar o Auxílio Brasil tendem a ter problemas de
operacionalização em 2022.
Em termos específicos para 2022, minhas
principais considerações são:
O crescimento do PIB de 2022, quando muito,
será baixo. A redução das previsões de atividade para o 4º trimestre - números
de outubro muito mais fracos do que os previstos - diminui o carregamento
estatístico para o próximo ano e, consequentemente, leva ao recuo das projeções
para o PIB real de 2022. Essas expectativas, porém, são pouco robustas, com a
probabilidade de uma contração de 1% muito próxima à de uma expansão de 1%.
Após alcançar cerca de 10% em 2021, a
inflação diminuirá em 2022. Os eventos inesperados que promoveram uma forte
alta dos preços - forte expansão do consumo de bens, crise hídrica, expressivo
aumento do preço do petróleo e gargalos na cadeia de suprimentos - tendem a
declinar no próximo ano, contribuindo para a diminuição da inflação. É difícil
precisar a magnitude desse recuo, devido ao provável aumento da persistência
inflacionária motivado pela elevação contínua da inflação e pela maior incerteza
fiscal. O comportamento dos preços no próximo ano também será muito
influenciado pelo cenário global, pela evolução da pandemia e pelo quadro
eleitoral.
A taxa Selic permanecerá bastante elevada
em 2022, com a curva de juros apreçando 12,5% em meados do ano. Essa dinâmica
contribuirá para a redução da inflação e o enfraquecimento da atividade.
A vitória de Lula na eleição presidencial
de 2022, em disputa polarizada com Jair Bolsonaro, é o cenário mais provável,
conforme indicado nas pesquisas. A polarização é facilitada porque é muito
difícil que surja um candidato único capaz de unir parte preponderante da
centro-esquerda à centro-direita. O quadro eleitoral pode se tornar ainda mais
favorável para Lula caso o ex-presidente consiga convencer essa parcela da
população que adotará uma plataforma com perfil moderado. Não obstante, a
popularidade de Lula será afetada com a campanha crescente de outros candidatos
buscando associá-lo a malfeitos. Ademais, a rejeição de Bolsonaro pode
enfraquecer, com sua avaliação positiva aumentando com a ampliação do Auxílio
Brasil, a diminuição da inflação e as vantagens de ser o candidato incumbente,
apesar da fraca atividade e do elevado desemprego.
Em suma, o futuro de curto prazo continua desalentador. Afora o bem-vindo declínio da inflação, a chance de o ambiente doméstico em 2022 ser melhor do que o de 2021 é pequena. Mais uma vez, a probabilidade é enorme de a grande maioria das previsões discutidas aqui se confirmar ao fim do próximo ano.
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