A vida é o nosso bem mais precioso. No entanto, no Brasil, a matança de pessoas é generalizada e já faz tempo se transformou em banalidade.
A violência generalizada atualmente
incentivada tira não só a vida de pessoas, mas o direito de ir e vir, faz
crescer a intolerância, incita o ódio, desarmoniza as famílias, cria novas
regras nas comunidades e desconhece princípios e valores como a ética, o
respeito, a humildade, o caráter, o amor, a compaixão, a solidariedade, entre
outros, cultivados pela sociedade de acordo com sua cultura.
A violência no nosso país denuncia o mal
funcionamento das instituições responsáveis pela garantia da lei e da ordem e
aponta os males que afligem a população. A nossa sociedade há muitos anos
padece de doenças sociais malignas, decorrentes dos poderes intolerantes, das
ações desumanas, dos desempenhos medíocres, das consciências desvirtuadas e da
precariedade institucional.
O Atlas da
Violência 2021, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revela
que a taxa de homicídios em todos os estados brasileiros apresentou queda, com
exceção do Amazonas que, entre 2018 e 2019, aumentou 1,6%. Entretanto, o número
de mortes violentas por causas indeterminadas cresceu nos dois últimos anos.
De acordo com o estudo, o Brasil registrou um crescimento de 35,2% no número de mortes violentas por causas indeterminadas entre 2018 e 2019. Os maiores aumentos foram registrados no Rio de Janeiro (232%), no Acre (185%) e em Rondônia (178%).
No ano de 2018, o país registrou 57.956
homicídios. Já em 2019 foram 45.503, o que representa uma queda de 21,5%. De
2014 a 2019 a queda na taxa de homicídios é ainda maior: 24,8%.
Os dados apresentados, embora indicando que
há um declínio, assusta a todos, dado o estado de intolerância e beligerância
existente, vivenciado no dia a dia.
A agressividade vem se tornando uma marca,
sobretudo nas redes sociais.
A violência no Brasil sempre foi usada como
instrumento de repressão, desde o período colonial, por isso se reveste de
certa complexidade, enraizada nas forças responsáveis pela proteção e
repressão, em várias modalidades.
Sem dúvida, na atualidade o aguçamento da
violência se dá pela grande desigualdade social vigente, quando os direitos
fundamentais são negados à grande maioria da população, gerando um terreno
fértil para tomar assento o tráfico de droga e o crime organizado.
A política de combate ao crime infelizmente
tem sido equivocada, o que vem produzindo verdadeira guerra entre as facções do
tráfico e entre essas facções e as polícias nos estados. Sem falar no
surgimento das milícias, subproduto da desigualdade social e da ausência de
políticas públicas.
Na semana que passou podemos contar algumas
histórias de vida e morte de pessoas que convivem diariamente conosco e, mesmo
quando ocorrem no nosso cotidiano, tão logo são esquecidas.
É a banalização da vida!
No Recife, a imprensa noticiou o assalto a
uma mulher de 65 anos, avó que diariamente acompanhava o neto de sete anos de
idade à escola. Dois assaltantes, para tomar a bolsa da idosa, arrastaram o seu
corpo no meio da rua, na frente da criança, até tirarem a bolsa e fugir de
bicicleta, com tranquilidade, num bairro de classe média, a Tamarineira.
Posteriormente os assaltantes foram presos, mas apesar da televisão ter
mostrado a monstruosidade da ação criminal cometida, e tendo a confissão dos
criminosos na delegacia, os mesmos foram soltos por uma questão burocrática: o
BO feito pela internet não havia sido validado pelo sistema de segurança.
No município de Glória do Goitá, duas
adolescentes foram estupradas e mortas por um mesmo homem que já havia passado
pelo sistema prisional e se encontrava na região em busca de praticar crimes
semelhantes, como denunciaram algumas mulheres que foram ameaçadas.
No Rio de Janeiro, um imigrante, Moïse
Kabagambe, natural da República Democrática do Congo, África, residindo e
trabalhando na “Cidade Maravilhosa” com sua família, foi espancado até a morte
no momento em que foi cobrar o pagamento pelo trabalho realizado num quiosque
de uma das praias mais movimentadas do país, Barra da Tijuca. Observando o
vídeo apresentado pela imprensa, foram muitas pauladas denunciantes da
intolerância e da raiva que circunda os crimes cometidos contra aqueles que
mais padecem por não terem seus direitos garantidos. Os criminosos foram presos
após o vídeo mostrar a barbárie, homens de cor negra espancando e matando um
homem também negro, de origem do mesmo país, o Congo, que mais enviou escravos
para produzir riquezas no Brasil Colonial. Também produziram cultura.
Além dos marginais, dos traficantes, as
polícias também matam. Quem não se lembra da chacina motivada por soldados do
exército contra uma família que se dirigia para uma festa de aniversário no Rio
de Janeiro? E as outras chacinas: Jacarezinho, Padre Miguel? E muitas outras…
Tem sido comum em alguns estados brasileiros, pessoas, sobretudo crianças e
jovens serem vítimas das chamadas balas perdidas, oriundas das armas dos
militares no combate ao tráfico.
Algumas crianças mortas foram atingidas por
balas dentro das escolas ou dentro de suas casas.
Diariamente, as barbaridades são cometidas
em vários lugares do território nacional, inclusive linchamentos ou
justiçamentos. Segundo o sociólogo José de Sousa Martins, “os
linchamentos expressam o pavor de uma sociedade do medo, de uma sociedade
deteriorada”.
A sociedade brasileira está muito doente. O
que fazer contra a suposta falta de controle que gera a violência e ao mesmo
tempo o medo?
*Mirtes Cordeiro é pedagoga.
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