O Estado de S. Paulo, 6.2.2022
Se na sua construção não houver um processo
de fortalecimento institucional com um projeto de País, então nada terá mudado
As eleições de 2022 têm muitas
particularidades, uma delas é o complexo cenário político em que vivemos.
Exigirá muito do eleitor – especialmente que compareça à urna e vote
consciente. Mas, em termos de legislação, por conta da reforma eleitoral de
2021 instituída pelo Congresso – é preciso lembrar dela num país jogado na
catarse da pandemia –, será a primeira vez que os eleitores vão contar com a
possibilidade de candidaturas apoiadas por federações partidárias. Isso será
muito importante na sua escolha.
Primeiro é preciso entender que essa nova modalidade de associação entre partidos, as federações, não pode ser tratada como espécie de cloroquina partidária – para fazer um paralelo com a propaganda de um remédio supostamente milagroso, mesmo contra todas as evidências. No mundo partidário também não se deve vender ou comprar ilusões.
Num país pluripartidário, como o nosso, com
partidos em excesso e com pouca identidade programática, as federações vieram
com o objetivo de permitir às legendas uma atuação unificada nacional, como um
teste para eventual fusão ou incorporação, em especial pela obrigatoriedade de
permanecerem num mesmo bloco por pelo menos quatro anos. As federações, em uma
democracia jovem como a nossa, podem diminuir o risco de elegermos candidatos
de ideologia oposta a quem votamos, como ocorria muitas vezes nas coligações em
eleições proporcionais, que uniam partidos ideologicamente diferentes.
Surgem também como uma solução para o alto
volume de candidaturas de 2020, que resultou numa campanha extremamente
pulverizada, beneficiando quem já tem mandato e reduzindo a renovação
expressada em 2018.
Porém, para que as federações, criadas com
nobres objetivos, não corram o risco de servir apenas para a manutenção de
cartórios partidários, inibindo o surgimento de novas lideranças, é preciso que
sua formação envolva integralmente cada partido. Os Estados têm seu cenário
político, sua realidade própria e a aliança com determinados partidos pode fazer
ruir esse trabalho. A decisão de federar terá também consequências nas eleições
de 2022, 2024 e 2026. Diálogo e escuta são essenciais para que as federações
sejam criadas, provocando o fortalecimento mútuo dos partidos envolvidos, e não
meras incorporações.
Aqui lanço outro ponto de reflexão. As
federações não podem ser reduzidas a “botes salva-vidas” para partidos
pequenos, que temem não bater cláusula de barreira ou que já possuem baixa
representação na Câmara dos Deputados e, por consequência, recebem uma fatia
menor dos recursos públicos. Ao federar, o partido que não teria condições de
fazer uma campanha cara – nos moldes tradicionais – passa a ter indiretamente
um volumoso orçamento para trabalhar.
Não podemos tirar os fundos eleitoral e
partidário da equação das federações partidárias. E não estamos falando de
ninharia. Só o Orçamento público para que os partidos gastem em campanha, o
chamado Fundo Eleitoral, é uma fortuna – recurso de difícil fiscalização, como
também são as prestações de contas dos partidos e candidatos. Governo federal e
Congresso passaram os últimos meses debatendo qual seria o montante desse
pacote bilionário que fechou na casa dos R$ 5 bilhões. Sempre me posicionei
contra este aumento. No País que voltou ao mapa da fome e em que o governo
alega falta de recursos para atender os mais pobres, é um absurdo não discutir
como baratear campanhas e reduzir custos. Ao contrário, os partidos se
estruturam cada vez mais e funcionam como grandes empresas de captação de
talentos, apresentando gráficos de retorno de investimento a partir dos votos
conquistados para ajudar a bater a tal cláusula de barreira.
Para quem já quer pular no bote salva-vidas
da federação para garantir seu recurso para fazer campanha ou facilitar a
construção de chapas, um alerta: se o processo não for participativo e envolver
todos os diretórios, a divisão do recurso, mesmo que em maior montante, não vai
considerar as necessidades locais, equidade ou diversidade. O recurso seguirá
nas mãos dos caciques, privilegiando quem já tem mandato e dificultando a
renovação política nos Parlamentos estaduais e federal.
As negociações, como já perceberam os
eleitores, estão em pleno vapor. É preciso ampliar as discussões na sociedade e
nos partidos e envolver todos os diretórios para que as decisões não sejam
tomadas com pouca informação e debate restrito.
As eleições de 2018 e 2020 mais do que
comprovaram que precisamos de uma reforma eleitoral, mas vai demorar ainda para
conseguirmos reduzir os vícios de um processo político que elege oportunistas e
teima em manter o sistema de capitanias hereditárias em vigor.
Se na construção das federações não vier
junto um processo de fortalecimento institucional e com a consolidação conjunta
de um projeto de País, mesmo que mínimos, então nada terá mudado. E estaremos,
mais uma vez, apenas discutindo a divisão de recursos partidários e de campanha
para manter uma velha estrutura de poder.
*Senador (Cidadania - SE)
Um comentário:
É como eu já disse,partido político funciona como uma empresa que só pensa no lucro.
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