Folha de S. Paulo
Sistema não serviria para defender a
democracia de inimigos autoritários
A mudança do sistema de governo voltou à
agenda pública pelas mãos do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur
Lira (PP-AL). Ele criou um grupo de trabalho, formado por nove
colegas, para discutir o semipresidencialismo, sob a liderança de Samuel
Moreira (PSDB-SP), que assina o plano de trabalho no qual se justifica a
iniciativa.
A seu ver, trata-se de encontrar mecanismos para lidar com crises políticas que oponham de forma irremediável Executivo e Legislativo e incentivar os parlamentares da coalizão situacionista a assumir efetiva responsabilidade pelas políticas adotadas pelo governo que apoiam.
Finalmente, argumenta, um tanto enigmático,
que o debate pode ser útil para o país "não se expor ao risco de uma
decisão impensada no futuro". Parece inequívoco o propósito de ter no
bolso um remédio institucional para crises que possam surgir das próximas
eleições.
O semipresidencialismo é uma espécie de
meio caminho entre o sistema presidencialista e o parlamentarismo. Nele, as
tarefas executivas são compartilhadas pelo presidente vitorioso nas urnas, como
nos sistemas presidencialistas, e pelo primeiro-ministro escolhido entre os
membros do Legislativo, como é norma no parlamentarismo.
Na verdade, o semipresidencialismo constitui
uma família. Seus membros se distinguem de acordo com os poderes enfeixados
pelo presidente, sobretudo para indicar e demitir o primeiro-ministro.
Entre especialistas, a discussão sobre os
sistemas de governo e a superioridade de uns sobre outros para dar estabilidade
à democracia tem uma longa história, e seus resultados não são conclusivos. Não
há evidências de que sistemas semipresidencialistas de qualquer tipo tornem as democracias
mais sólidas ou eficientes. Foram semipresidenciais muitos dos sistemas
implantados na Europa Central e do Leste com o fim do comunismo —inclusive a
Rússia—, e a involução autoritária nesses países é patente.
Por outro lado, tudo parece indicar que,
para além das regras formais, a prática política faz com que tendam a funcionar
como sistemas presidenciais —como na França ou na Argentina— ou como
parlamentarismos, como em Portugal e na Áustria. Quem sabe o nome do
primeiro-ministro da França?
O ex-presidente Temer, admirador do
sistema, gosta de dizer que sob o semipresidencialismo governos sem maioria
parlamentar caem, mas "com muita naturalidade. Forma-se um novo governo
com muita naturalidade e até com razoável elegância política". Elegante,
talvez, mas não há indício de sua utilidade para enfrentar o problema da hora:
defender a democracia de inimigos autoritários.
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