Folha de S. Paulo
Inflação explode e recessão já começa,
apesar da alta do rublo e do dinheiro do petróleo
A moeda russa vale tanto quanto na semana
anterior à do início da guerra. Um dólar comprava 77 rublos nesta quarta-feira,
20 de abril, ante 75 rublos nos dias que antecederam a invasão da
Ucrânia. O dólar chegou a custar 120 rublos em março. Os dados são do Banco
Central da Rússia (BCR),
A taxa básica de juros do BCR, a Selic deles,
passou de 9,5% para 20% no dia 28 de fevereiro. No dia 11 de abril, baixou a
17%.
O superávit das contas externas da Rússia não era tão bom fazia anos. As vendas de bens e serviços, as exportações, superaram as importações em US$ 66,3 bilhões no primeiro trimestre deste 2022. No primeiro trimestre de 2019, eram de US$ 41,1 bilhões.
É tudo verdade. Mas a Rússia vai à breca.
Quase desapareceram do noticiário
"pop" as imagens
de filas no caixa eletrônico e de rapas do que havia de bens nas
lojas, por medo de escassez. Mas a economia afunda.
A taxa do câmbio do rublo é meio uma
ilusão. Não há quase mercado para a moeda russa e o governo impôs controles de
capitais (isto é, diz o que se deve fazer com a moeda forte, dólar, euro, que
entra no país). A Rússia tem saldo enorme nas contas externas por causa das exportações
de petróleo e gás e porque importa menos.
O dinheiro entra, mas não sai, pelos piores
motivos.
A inflação em março foi de 7,6% (em relação
a fevereiro), maior que a alta de preços do ano de 2021 inteiro (6,9%).
A indústria encolhe desde fevereiro. Em
março, regrediu no ritmo mais rápido desde o choque da epidemia, segundo um
levantamento de condições do setor (PMI da S&P).
Em fevereiro, segundo uma estimativa de PIB
(de cinco principais setores), a economia já encolhia 1,3% em relação ao
fevereiro de 2021, diz a empresa que dá consultoria oficial para o ministério
das Finanças. A indústria caiu 3% em fevereiro. Não há dados oficiais para
março.
Segundo o chute do FMI, o PIB russo deve
cair 8,5% neste 2022. Bancões e grandes consultorias financeiras do mundo
chutam algo em torno de 11%. No acumulado da Grande Recessão de 2015-16, o PIB
do Brasil caiu 6,7%.
Ainda estamos para ver estimativas de PIB
acertarem o alvo, mas a Rússia tem e terá problemas, a não ser em um mundo de
fantasia em que Vladimir
Putin ou o sistema político russo se rende ao "Ocidente"
rapidinho. Além do choque brutal de confiança, da inflação, da
alta de juros, da debandada de empresas ocidentais, da queda do
investimento e do crédito externos, vão faltar peças, tecnologias e insumos
para a indústria.
A Europa vai diminuir as importações de
energia russa. Mesmo que queira, a China não vai dar conta de tapar esses
buracos. Etc.
No curto prazo, acontecem essas coisas
esquisitas, valorização do rublo e superávit maior nas contas externas. A
Rússia ganha dinheiro mesmo com o petróleo russo (o tipo Urais) sendo vendido
com grande desconto em relação ao tipo Brent. A diferença era de US$ 28 em março
deste ano (24%), segundo o governo, e de cerca de US$ 37 na última semana. Em
março de 2021, a diferença era de menos de US$ 2 (3%).
As reservas russas em moeda forte e ouro
caíram apenas de US$ 643,2 bilhões (em 18 de fevereiro) para US$ 604,4 bilhões
(8 de abril). Cerca de metade foi confiscada pelo ato de guerra Ocidental.
Pode ser que, dado o saldo nas contas
externas, a Rússia recomponha a perda do confisco em pouco mais de um ano,
"tudo mais constante". Não vai adiantar grande coisa, em termos de
desempenho econômico real.
O dinheiro entra, mas não sai, por motivos políticos (sanções), de economia desesperada (controle de capitais) e por causa da recessão (importa-se menos por pobreza).
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