O Globo
Paulo Freire morreu há 25 anos, mas
continua bem vivo no debate político. Ao lançar sua candidatura ao Planalto, o
ex-presidente Lula citou uma lição do educador: “É preciso unir os divergentes
para melhor enfrentar os antagônicos”.
O petista recorreu à frase para justificar
a aliança com Geraldo Alckmin. Os dois passaram décadas como adversários
políticos. Agora resolveram se unir contra o projeto autoritário de Jair
Bolsonaro.
O dicionário Houaiss define os divergentes
como aqueles que têm opiniões ou pontos de vista diferentes. Os antagônicos são
contrários. Incompatíveis.
Na política, forças divergentes podem se
aliar em nome de valores comuns. Aconteceu nas Diretas Já, quando rivais
históricos subiram no mesmo palanque em defesa da democracia. Eram antagonistas
da ditadura militar, o regime dos sonhos do capitão.
Um dos primeiros atos do golpe de 1964 foi
extinguir o Programa Nacional de Alfabetização, idealizado por Freire. Tachado
de subversivo, o educador teve que partir para o exílio. Refugiou-se no Chile,
onde acompanhou o processo de radicalização política que desembocaria na
derrubada de Salvador Allende.
Anos mais tarde, o educador concluiu que a divisão dos democratas contribuiu para os golpes no Brasil e no Chile. No livro “Pedagogia da esperança”, ele escreveu que só a busca da “unidade na diversidade das forças progressistas”, sem sectarismo, poderia fazer frente “ao poder e à virulência” dos autocratas.
Alckmin não citou Freire, mas mostrou
afinidade com suas ideias. Na estreia como vice de Lula, defendeu a superação
de divergências para barrar a reeleição de Bolsonaro. “Acima das disputas, algo
mais urgente e relevante se impõe: a defesa da própria democracia”, discursou.
O educador não sai da cabeça do capitão. Na
campanha, ele prometeu invadir o MEC com um lança-chamas para “tirar o Paulo
Freire lá de dentro”. No governo, aproveita todas as oportunidades para
enxovalhar sua memória.
Em fevereiro, Bolsonaro extinguiu a Medalha
Paulo Freire, que premiava pessoas e instituições empenhadas na luta contra o
analfabetismo. O decreto foi assinado pelo presidente e pelo então ministro
Milton Ribeiro. O pastor cairia no mês seguinte, em meio a um escândalo de
corrupção e tráfico de influência.
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