O Globo
É muito alentador que líderes do Senado e
ministros do Supremo tenham, finalmente, começado a se mexer para reagir aos
ensaios de golpe que Jair Bolsonaro pratica em praça pública todos os dias. Que
bom que aconteceu a tempo.
A dúvida é que instrumentos esses entes
institucionais terão para atuar na contenção. A chave, quando se conversa com
esses atores, é entender até que ponto as Forças Armadas estão embarcadas na
teoria conspiratória que Bolsonaro inventou para desacreditar o processo
eleitoral brasileiro.
Nesse aspecto, próceres do Senado se
sentiram mais confortáveis nos últimos dias por informações que receberam do
Alto-Comando, de generais que deixaram claro em conversas recentes que não
darão apoio a nenhuma tentativa de empastelar o pleito.
Também têm sido medidos os humores do
presidente da Câmara, Arthur Lira, e dos ministros políticos dos partidos que
estarão na aliança de Bolsonaro. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, tem
sido firme em incluir Lira no rol dos que não aceitarão nenhuma tentativa de
quebra de normalidade democrática nem de questionamento do resultado das urnas.
Ouvi de um dos participantes das cada vez mais frequentes e graduadas conversas sobre os possíveis caminhos pelos quais Bolsonaro pode tentar tumultuar o ambiente eleitoral que ninguém que vá disputar o voto em outubro —a não ser aqueles cuja existência política depende exclusivamente do bolsonarismo — aceitará questionar a própria eleição.
Lira, segundo essas forças, tem deixado
claro que o limite da aliança do Centrão com o presidente é a aceitação, pelos
dois lados, de que o “contrato” entre eles vale para administrar agora e para
disputar as eleições, não para depois, nem para a hipótese de Bolsonaro tentar
melá-las, o que representaria “quebra” desse acordo.
Num certo sentido, o fato de essas forças
da velha política terem dominado boa parte da execução do Orçamento seria um
“lastro”, no entendimento dos que têm conversado sobre a necessidade de fazer
frente aos planos golpistas do presidente, de que ele será abandonado e contido
caso decida ir além da bravata cotidiana e intolerável.
Desembarcados os generais do Alto-Comando
(ainda que uma parte das Forças Armadas esteja perigosa e irremediavelmente
disposta a caminhar com Bolsonaro), afastada a hipótese de amparo político do
Centrão, resta a incógnita de como reagiriam o mundo e o dinheiro caso o
presidente estique a corda.
Esses senadores e ministros do STF têm
sondado os humores de embaixadas, empresas e bancos em busca da resposta. Têm
ouvido que, diferentemente de 1964, não há clima possível para que qualquer
país democrático aceite uma tentativa de ruptura num país do tamanho do Brasil.
Da mesma forma, bancos, investidores,
empresas, mesmo parte da imprensa, que de alguma forma assistiram à tomada de
poder pelos militares em 64 e aceitaram algumas das premissas, por mais falsas
que fossem, não se coadunarão com a balela de que urnas que vêm elegendo
presidentes, governadores, senadores, deputados e vereadores desde 1996,
inclusive toda a família Bolsonaro, seriam suscetíveis a fraudes só porque ele
teme perder a eleição ou ver a si e/ou aos filhos julgados e presos.
A contenção, portanto, está em curso. Nas
necessárias falas de repúdio, mas também nas mais estratégicas conversas em que
cenários são traçados e limites pactuados.
Nada disso nos livrará do calvário de aguentar por mais de quatro longos meses que nos separam do dia da eleição os ataques de Bolsonaro ao direito supremo do povo de escolher quem vai governá-lo. Mas significa que parecem estar chegando ao fim os dias em que ministros, empresários e generais seriam plateia silente desse golpismo que a cada dia tentava ganhar uma casa no tabuleiro. Parece haver democratas em Brasília.
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