O Globo
Em 2015, o francês Michel
Houellebecq escreveu um livro de ficção em que mostra como seria a França num
futuro não muito distante em que a maioria dos eleitores fosse de origem
muçulmana e elegesse um líder do seu grupo com muitas das crenças
fundamentalistas de seus ancestrais do Oriente Médio. Seria um desastre, claro.
O país descrito pelo escritor regrediu no tempo, sobretudo nas áreas de
costumes e cultura em razão da nova ordem instalada. “Submissão”, considerado
na França como o livro mais polêmico daquele ano, foi coincidentemente lançado
em Paris no mesmo dia do atentado à sede do jornal satírico Charlie Hebdo, que
resultou em 12 mortes.
Mas o islamismo francês
proposto por Houellebecq não se parece em nada com o dos radicais do Estado
Islâmico. A transformação da França se dá por dentro, aos poucos, até se
consumar. Claro, como toda ficção, o livro não tenta descrever uma nova
realidade, mas uma realidade possível, embora improvável. Ainda assim, não se
pode negar que há uma lógica no romance. Segundo projeções oficiais, até 2040 a
maioria dos eleitores da Bélgica será de origem muçulmana. Muito provavelmente,
as cabeças dos jovens muçulmanos belgas de hoje que forem eleitores daqui a 18
anos serão mais arejadas e modernas do que as de seus pais e avós imigrantes,
mas ainda assim estarão assentadas na tradição islâmica.
No Brasil de Bolsonaro não foram necessários imigrantes muçulmanos para fazer deste um país mais conservador do que era há quatro anos, do ponto de vista moral, cultural e político. O componente religioso sempre importa numa transformação dessa ordem, e não foi diferente aqui. A comunidade evangélica ajudou a consolidar este quadro de retrocesso no Brasil, mas não é a única responsável. Se fosse um romance, a História do Brasil desde a eleição de 2018 seria mais improvável do que aquela contada em “Submissão”. Mas, por aqui já se pode visualizar as mudanças comportamentais provocadas pelo bolsonarismo.
Para onde quer que se
olhe é possível ver os sinais do retrocesso. De tal forma materializado, o
recuo na educação e na cultura é quase palpável. Na educação, o Brasil deu um
passo gigantesco para trás, não apenas no seu financiamento, mas também no seu
método. A cultura no país sobrevive graças à sua pujança, mas a ausência da
indução do Estado inviabiliza criações e inibe o surgimento de novos talentos
nas favelas, nas periferias, no interior, além de solapar iniciativas que não
tenham o selo do bolsonarismo. Os seguidos ataques e deboches perpetrados ao
politicamente correto criaram uma casca em torno do tecido social que embrutece
o brasileiro. Não é por outra razão que crescem no país os crimes de homofobia,
misoginia e racismo.
Ainda mais grave é o consumo
desenfreado de armas produzido por leis, portarias e decretos aprovados nos
últimos três anos e meio. Estamos virando um novo EUA, não em razão da nossa
potência, econômica, cultural, tecnológica e militar, obviamente não, que não a
temos. Mas pelo uso indiscriminado de armas, pela facilidade na sua compra,
pelo acesso praticamente ilimitado à munição. Pela proliferação de clubes de
tiros, de falsos colecionadores e caçadores espalhados pelo país. A violência
provocada pela intolerância política, que tem índices elevados no Brasil, tende
a explodir na campanha deste ano diante do número de pessoas armadas do lado
bolsonarista. Um assassinato já foi produzido em Foz do Iguaçu.
Em todos os aspectos,
somos hoje um país muito mais atrasado do que éramos em 2018. Todo o declínio
que vivemos nesses anos foi causado pelo homem instalado no Palácio do Planalto
e sua política de confronto permanente com as instituições, o estado
democrático de direito, os opositores políticos e o bem-estar comum. Mesmo
diante desse quadro, que parece um retrato desfocado do livro de Michel
Houellebecq, Bolsonaro tem ainda cerca de 30% dos votos, segundo as pesquisas
eleitorais. Com mais quatro anos, o Brasil pode se tornar igual ao país
imaginado pelo autor francês. Só que pior.
Desastre
Foi tão errada e inadequada a reunião de
Bolsonaro com diplomatas estrangeiros que lembra a pior campanha de marketing
da História, feita em 1992 pela Pepsi nas Filipinas. A empresa colocou números
de 001 a 999 no interior das tampas das garrafas. Alguns números davam pequenos
prêmios em dinheiro, outros o direito de beber uma nova unidade de graça. Um
número, que seria “sorteado” ao final da campanha, daria o equivalente a US$ 1 milhão ao sortudo portador.
A ideia era imprimir apenas duas tampas com o número 349. Por engano, foram
produzidas mais de 800 mil tampas com o número vencedor. Foi um desastre. A
Pepsi nunca pagou os prêmios, que chegariam a quase US$ 1 bi, houve protestos
em todo o país, quebra-quebra e três funcionários da empresa acabaram mortos
por uma granada lançada contra a companhia.
Happy pensa melhor
Será que o sujeito que teve a ideia de
fazer a reunião do Alvorada (coronel Mauro Cesar Cid, segundo Lauro Jardim)
imaginou que a mentirada de Bolsonaro seria engolida assim, sem mais nem menos,
pelos diplomatas? Deve ter imaginado que são todos tolos, que não leem jornais,
que não conversam com ninguém, que estão aqui para fazer presença, bebericar em rodas sociais e
eventualmente agilizar um negocinho aqui e outro ali em favor de empresas de
seus países. Afinal, deve ter concluído o militar, eles não falam português
mesmo. Há seres mais inteligentes no planeta terra. A elefanta Happy do
Zoológico do Bronx foi o primeiro animal a se autorreconhecer num teste feito
em 2005. Desenharam um X na sua fronte e a colocaram diante de um espelho. Ela
imediatamente levou a tromba à testa.
Tá duro
A cada dia fica mais difícil para sites,
blogs, podcasts, tvs, rádios e outros veículos bolsonaristas explicar as
barbaridades do presidente. Desta última, nem a TV mais amiga conseguiu bons
argumentos. O papa do bozismo, chamado de mestre pelos demais bozinhos, saiu-se
com essa: “O presidente é candidato, e como candidato ele pode dizer o que
quiser, dar a sua opinião sobre o que quer que seja”. Não falou mais do que
isso, nem a sua enorme boa vontade com Bolsonaro conseguiu encontrar alguma coisa
melhor.
O que nos falta
Para afastar Bolsonaro pelos crimes de
responsabilidade que cometeu aos quilos é necessário um (1) presidente da
Câmara. Não temos. Se tivéssemos, ainda seriam necessários outros 342 deputados.
Não temos. Precisaríamos também de 54 senadores. Não temos. Para afastar o
presidente pelos crimes comuns que também cometeu aos montes, é necessário um
(1) procurador-geral da República. Aí é que não temos mesmo.
Falou em dinheiro
Um dos vereadores mais apagados e menos
produtivos da Câmara do Rio, Lindbergh Farias voltou a aparecer no noticiário
político. Mas de maneira enviesada, numa disputa por posição no diretório
nacional do PT para ter acesso a mais dinheiro do fundo partidário para sua
campanha a deputado federal. Lindbergh não aprovou nenhuma (0) lei em dois anos de mandato.
Para efeito comparativo, Chico Alencar (PSOL) aprovou uma (1) emenda à Lei
Orgânica do Município, quatro (4) leis complementares, 60 leis ordinárias e
sete (7) decretos legislativos. Laura Carneiro (PSD) aprovou três (3) emendas,
três (3) leis complementares, 52 leis ordinárias e 18 decretos legislativos.
Sabão de glicerina
Já se fala no voto Luzema em Minas Gerais,
que seria obviamente a junção de Lula e Zema. Mesmo dentro da campanha do
governador de Minas ninguém admite que o candidato à reeleição apoie Bolsonaro.
Dizem que ele aceita o suporte do presidente, mas oficialmente não vai lhe oferecer apoio de volta.
O que Zema vai fazer é falar em cada palanque de acordo com a sua audiência. Se
o público for Lula, usará o lulês. Se for Bolsonaro, falará as barbaridades que
aquela turma gosta de ouvir. Na TV e nas redes sociais será mais neutro que
sabão de glicerina.
Aquela coisa
No malfadado discurso aos embaixadores, Bolsonaro falou também da floresta brasileira, referindo-se a ela como “uma coisa enorme chamada Amazônia”. Não podia ser mais ralo e ligeiro. O texto deve ter sido escrito pelo mesmo coronel que bolou a patacoada toda.
Um comentário:
Bozo,bozinho e suas bozices.
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