segunda-feira, 8 de agosto de 2022

Celso Rocha de Barros - Propostas para um crescimento justo

Folha de S. Paulo

Ideias de especialistas merecem ser discutidas com atenção pelas forças democráticas

Na semana passada, um grupo de especialistas que representam o que o debate público brasileiro tem de melhor lançou um documento com propostas para o Brasil.

O texto se chama "Contribuições para um governo democrático e progressista" e tem como autores Bernard Appy, Carlos Ari Sundfeld, Francisco Gaetani, Marcelo Medeiros, Pérsio Arida e Sérgio Fausto.

Arida foi um dos criadores do Plano Real, Appy foi um dos melhores nomes da equipe econômica de Lula, Medeiros é um dos maiores especialistas brasileiros em desigualdade de renda. É um grupo politicamente heterogêneo e altamente qualificado.

O documento propõe um "Programa especial de gastos", que autorizaria o governo a gastar 1% do PIB por fora do teto de gastos. Desse dinheiro, 60% deveriam ser gastos com a área social, com ênfase nas famílias mais pobres e em programas focados na primeira infância, que poderiam ter sido descritos com mais detalhe. Os 40% restantes seriam divididos em programas de desenvolvimento científico e tecnológico e na sustentabilidade ambiental.

Na área social, os autores defendem um programa de complementação de renda, a renda básica de cidadania (RBC), combinado com uma espécie de seguro (Poupança Seguro Família) que poderia ser sacado pelo trabalhador duas vezes por ano para compensar flutuações na sua renda, muito comuns entre os trabalhadores informais.

Falando francamente, não sei se, no quadro atual, uma rediscussão do Auxílio Brasil é politicamente viável: Bolsonaro, que planeja reduzir o auxílio a zero se for reeleito, acusaria os defensores da proposta de tirar dinheiro dos pobres. Seria mentira, mas ele faria isso.

Entre os autores está Bernardo Appy, autor de uma proposta de reforma tributária muito elogiada pelos especialistas, que já virou proposta de emenda constitucional (a PEC 45). A ideia central é a substituição de diversos impostos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um imposto sobre consumo, o IVA.

Além de tornar os impostos brasileiros mais simples e eficientes, os autores também defendem uma série de mudanças que poderiam torná-los mais justos.

Entre as propostas nesse sentido está a redução da carga de tributos pagos pelos trabalhadores mais pobres e seus empregadores: por exemplo, uma redução da alíquota de INSS cobrada na parcela dos salários equivalente ao salário-mínimo: a contribuição do empregado seria reduzida de 7,5% para 3% e a contribuição do empregador de 20% para 6%. Os sistemas de contribuição previdenciários —Simples, MEI, etc.— seriam unificados, e o limite de isenção do IRPF seria elevado de R$ 1.903,98 para R$ 2.500.

Para taxar mais e melhor os mais ricos, o texto defende a criação de nova faixa no IRPF, com alíquota de 35%, e o que é mais importante: a correção de diversas distorções como a "pejotização", a utilização de fundos fechados e a baixa tributação de rendimentos obtidos em empresas offshore.

Tenho expectativas baixas sobre o quanto é possível discutir políticas públicas em uma campanha com Jair Bolsonaro disseminando fake news e usando pesadamente a máquina pública para se reeleger. Mas as ideias defendidas em "Contribuições para um governo democrático e progressista" merecem ser discutidas com atenção pelas forças democráticas.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Nenhuma palavra sobre aumento real do salário mínimo? Não há "crescimento justo" sem isto!