Valor Econômico
Só estímulo à competição, redução da
inadimplência e simplificação tributária e regulatória podem derrubar juros ao
consumidor
Roberto Troster, em artigo neste Valor (“Métricas bancárias”, 15/07/22, pág. A-8), sugeriu acertadamente uma padronização no conceito e na convenção da aplicação de juros. Diz ele: “No Brasil, é desnecessariamente mais complexa, usando várias medidas de juros em vez de uma, como no resto do mundo. Um mesmo número pode representar valores muito díspares dependendo se a taxa vier expressa em taxa mês ou taxa ano, o ano com 252 dias ou com 365 dias, com e sem o IOF, que tem uma alíquota efetiva que varia de acordo com o dia do mês”. Acho que é meritório, a partir de sua sugestão, ampliar o debate.
O matemático José Dutra Vieira Sobrinho
classifica as taxas de juros considerando: (a) o regime de capitalização:
simples (ou linear) e composto (ou exponencial); (b) o valor do capital inicial
tomado como base de cálculo: nominal, efetiva e real. Não se desconhecem os
inúmeros problemas jurídicos que daí decorrem - especialmente no que diz
respeito a juros reais, usura etc. desde o Decreto-Lei n. 22.626/33.
Contudo, já existe entre nós regulação
sobre o cálculo e a informação do Custo Efetivo Total (CET) relativo à
contratação das operações de crédito e de arrendamento mercantil (Resolução
4.881, de 23 de dezembro de 2020). Trata-se de dar ao consumidor maior
transparência sobre o que se cobra dele, apesar de alguns problemas de
divulgação, pois, muitas vezes, só se informa as taxas de juros e não os demais
custos envolvidos no crédito, tais como tarifas, tributos, seguros e outras
despesas vinculadas à operação, especialmente as relativas ao pagamento de
serviços de terceiros.
O CET é um avanço: o Sol ainda é o melhor
desinfetante, como já disse Louis Brandeis, juiz da Suprema Corte Americana,
mas a convenção do conceito de taxas de juros não é tema distinto e
inconfundível.
Desde os tempos de inflação alta, em que
havia a cultura do overnight, o Banco Central do Brasil adotou o sistema de 252
dias úteis para aplicações financeiras, baseado nos vencimentos de títulos
públicos e que permeia muitos de seus regulamentos (por exemplo, a Circular
3.850, de 26 de setembro de 2017). Em resumo: entre nós, há o conceito de juros
exatos, ou seja, o do calendário civil de dias úteis. O conceito de juros
comerciais, com o mês de 30 dias e o ano de 360 dias, impera no imaginário
popular, mas nem sempre dialoga com a prática bancária.
O tema é especialmente relevante quando se
comparam taxas de juros de diferentes instituições bancárias ou fintechs, dando
ao consumidor poder de escolha, especialmente relevante nestes tempos de open
banking. É sempre importante lembrar que só se pode comparar coisas
semelhantes, e, para isso, talvez fosse importante contar com a participação de
todos os agentes interessados, a fim de criar um padrão universal de mercado,
que pudesse ser usado como convenção e métrica de fácil compreensão.
Curiosamente, o Executivo tem se
movimentado para tentar padronizar e simplificar coisas desnecessariamente
complexas, como se refere Troster. O Decreto 10.139, de 28 de novembro de 2019,
estabelece a obrigatoriedade de os órgãos e entidades da administração pública
federal direta, autárquica e fundacional de revisarem, atualizarem,
simplificarem e consolidarem atos normativos “a fim de racionalizar o estoque
regulatório”.
E, realmente, não deve ser difícil criar
uma nova convenção sobre juros. Por exemplo, quando se pensa em rentabilidade
na indústria de fundos, está se tratando de rentabilidade bruta, mas já sem
taxas ou custos de administração e performance, e todos, aplicadores,
administradores e gestores, usam e aceitam o mesmo critério. A Anbima publicou
um Guia para publicidade e divulgação de material técnico de fundos de investimentos,
e há ali capítulo específico sobre “Divulgação de rentabilidade, comparação,
simulação e qualificação”.
O tema “juros” nunca sai de moda, ocupando
espaços no debate nacional. Mas além dos conhecidos argumentos de que, para
muitos, nossos juros são escorchantes, abusivos e apenas alimentam lucros
exorbitantes de banqueiros inescrupulosos, há um micro-universo operacional que
é preciso enfrentar. Só existem três fatores para determinar a redução no juro
ao consumidor na economia brasileira: o estímulo à concorrência, a redução da
inadimplência e a simplificação tributária e regulatória.
Como qualquer mercadoria - e o juro não passa de uma mercadoria - ele sofre os efeitos da oferta e da demanda - lei imutável da natureza econômica: se há mais gente querendo comprar “juros” o preço sobe, caso contrário, ele cai. Mas além das três questões mais macroscópicas citadas acima, é preciso olhar o detalhe, o particular. É importante avançar com a medida e a ideia deve ser melhor debatida e desenvolvida.
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