Editoriais / Opiniões
Atentar contra a democracia é crime
O Estado de S. Paulo
Neste 7 de Setembro, há uma novidade
importante. Aprovada no ano passado, a Lei de Defesa do Estado Democrático de
Direito está vigente
Diante da informação, revelada pelo jornal Metrópoles, de que empresários bolsonaristas se articulam para, em caso de derrota nas urnas, impedir a posse de quem o povo eleger, é preciso lembrar que, nestas eleições, há uma novidade importante. Aprovada pelo Congresso no ano passado, a Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito (Lei 14.197/2021) está vigente. O País conta agora com uma nova proteção jurídica para fazer respeitar o regime democrático, o que pode e deve servir de alerta a todos aqueles que tentam burlar as regras do jogo democrático, bem como às autoridades competentes. Polícia e Ministério Público têm o dever de proteger o Estado Democrático de Direito.
Além de revogar a antiga Lei de Segurança
Nacional (LSN, Lei 7.170/1983), a Lei 14.197/2021 criou no Código Penal uma
seção específica para os tipos penais contra o Estado Democrático de Direito,
incluindo crimes (i) contra a soberania nacional, (ii) contra as instituições
democráticas, (iii) contra o funcionamento das instituições democráticas no
processo eleitoral e (iv) contra o funcionamento dos serviços essenciais.
Continuam vigentes todos os direitos e garantias fundamentais, como as
liberdades de expressão, de opinião e de associação, mas atentar contra a
democracia é agora um crime previsto no Código Penal.
Trata-se de importante aperfeiçoamento da legislação penal, cuja finalidade é precisamente proteger os bens essenciais de uma sociedade. Por exemplo, não fazia sentido o Código Penal punir o ato de desacatar um funcionário público e, ao mesmo tempo, deixar impune um atentado contra o regime democrático.
Com a entrada em vigor da Lei 14.197/2021,
é crime “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado
Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes
constitucionais”, com pena de reclusão de quatro a oito anos, além da pena
correspondente à violência. Vale frisar que o Código Penal pune não apenas a
extinção do Estado Democrático de Direito, e sim sua tentativa, “impedindo ou
restringindo o exercício dos poderes constitucionais”.
O Congresso traçou uma linha nítida. Ações,
com emprego de violência ou grave ameaça, para impedir ou restringir o
exercício do Legislativo, do Judiciário ou do Executivo não são mera expressão
de opinião. Não são gestos políticos aceitáveis. São crimes, a exigir a atuação
da polícia e do Ministério Público.
É também crime, com pena prevista de três a
seis anos de reclusão, “impedir ou perturbar a eleição ou a aferição de seu
resultado, mediante violação indevida de mecanismos de segurança do sistema
eletrônico de votação estabelecido pela Justiça Eleitoral”. Essa disposição do
Código Penal é muito significativa nos tempos atuais, expressando e reiterando
que a paz nas eleições é um bem de grande relevância para a sociedade. A
punição não está reservada apenas a quem impedir a votação ou a apuração dos
votos, mas também a quem “perturbar a eleição”.
Corretamente, a Lei 14.197/2021 definiu de
antemão que não constitui crime a manifestação crítica aos Poderes
constitucionais, assim como a “reivindicação de direitos e garantias
constitucionais por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações
ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais”.
Num país livre, a manifestação política é livre. O importante é, como a nova
lei o faz, diferenciar entre o que é crítica e manifestação de pensamento e o
que é ameaça, violência ou perturbação do livre funcionamento das instituições
democráticas, em especial das eleições.
Não é segredo que, tal como houve no ano
passado, bolsonaristas pretendem utilizar o 7 de Setembro para intimidar o
Judiciário e o Legislativo. A diferença é que, no ano passado, a Lei de Defesa
do Estado Democrático de Direito ainda não estava vigente. Agora ela está, o
que confere um caráter criminoso a todas as movimentações que visam a impedir a
validade do resultado das urnas. Não há nenhum patriotismo na prática de
crimes.
Apesar do superávit, quadro fiscal é frágil
O Estado de S. Paulo
O rápido crescimento da receita resultará no primeiro superávit desde 2013, mas tende a perder força em 2023, quando as despesas serão pressionadas por decisões já tomadas
A previsão da Instituição Fiscal
Independente (IFI) de que as contas do governo central fecharão este ano com
superávit primário, o primeiro desde 2013, aponta para uma mudança na tendência
das contas públicas e sugere uma situação financeira confortável para o atual
governo federal e um quadro fiscal favorável para o que tomará posse em 1.º de
janeiro de 2023. Mas será um resultado efêmero. Uma análise mais criteriosa da
evolução das receitas e das despesas indicará a persistência de fortes riscos
na área fiscal.
A nova projeção da IFI, apresentada em
seu Relatório de
Acompanhamento Fiscal de agosto, é baseada em dados conhecidos
e previsões bastante fundamentadas sobre a evolução de importantes indicadores
econômicos até o fim do ano. Até julho, a IFI, órgão vinculado ao Senado,
projetava déficit primário (de R$ 40,9 bilhões) nas contas do governo central.
No documento de agosto, a projeção foi revisada para um superávit primário de
R$ 27,0 bilhões em 2022. Nos 12 meses até julho, o resultado foi um superávit
primário de R$ 110,0 bilhões.
O forte descompasso entre a evolução da
receita e a das despesas explica a nova projeção. Ao longo do ano, a
arrecadação cresceu 15% em valores reais, enquanto as despesas primárias
apresentaram redução real de 1,9%, na comparação com 2021.
A recuperação da economia em ritmo mais
intenso do que o previsto (a IFI reviu de 1,4% para 2,0% sua projeção para o
crescimento do PIB em 2022), a inflação (que faz crescer mais depressa a base
de arrecadação dos tributos) e a alta dos preços das commodities vêm
impulsionando as receitas. Também o aumento do emprego formal, que amplia o
número de contribuintes do sistema previdenciário, ajuda na arrecadação.
Do lado das despesas, apesar do aumento
expressivo de gastos com abono e seguro-desemprego, houve redução no total dos
sete primeiros meses do ano, por causa da queda do custo do pessoal e,
sobretudo, do corte de 52,3% nos pagamentos decorrentes de sentenças judiciais
e dos precatórios. Entre janeiro e julho de 2021, foram pagos R$ 18,1 bilhões a
título de sentenças judiciais e precatórios; neste ano, com base na emenda dos
precatórios que autorizou o parcelamento da dívida da União reconhecida pela
Justiça em sentença definitiva, o volume pago foi reduzido para R$ 8,2 bilhões.
Cidadãos e empresas com dívida a receber do governo continuam sendo deixados
para trás.
O parcelamento dos precatórios se estenderá
até 2026, mas outros fatores que pesam na geração do projetado superávit
primário das contas do governo central em 2022 estão perdendo força e talvez
não se repitam no ano que vem. E fontes de pressão sobre as despesas surgirão
ou se intensificarão no próximo governo.
Dos três principais grupos de receitas de
acordo com a classificação da IFI (receitas típicas, receita previdenciária e
receitas não administradas), um deles, justamente o das receitas não
recorrentes da União, foi o que apresentou o maior crescimento neste ano. Nos
sete primeiros meses do ano, saltou de R$ 147,2 bilhões em 2021 para R$ 248,7
bilhões em 2022. É receita decorrente de eventos especiais, que podem não se
repetir. Além disso, a atividade econômica deve se desacelerar no próximo ano,
de acordo com projeções dominantes no momento; o preço das commodities não deve
crescer como cresceu nos últimos tempos; e a inflação tende a se desacelerar.
Já do lado das despesas, a
irresponsabilidade com que o governo federal utiliza recursos públicos para
tentar conquistar votos para o presidente-candidato, Jair Bolsonaro, já levou à
projeção de um buraco de cerca de R$ 147 bilhões no Orçamento de 2023. São
promessas como o aumento para o funcionalismo, a manutenção de R$ 600 nos
benefícios do Auxílio Brasil e a preservação das emendas do relator conhecidas
como orçamento secreto.
O Executivo não planeja e ignora os limites
para suas despesas. Outros Poderes agem de modo semelhante quando se trata de
assegurar benefícios para si mesmos. O cenário fiscal é reflexo desse
comportamento.
O necessário apoio à pequena empresa
O Estado de S. Paulo
Embora o governo tente usar eleitoralmente o apoio do BNDES aos pequenos, medida é bem-vinda
Apesar do explícito e confessado interesse
eleitoral do governo na iniciativa, a ampliação da atuação do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no apoio a médias, pequenas e
microempresas tem muitos aspectos positivos. Fortalecer financeiramente esses
empreendimentos significa fortalecer o segmento responsável pela maior parte
dos empregos criados no País e dar-lhe melhores condições para crescer e,
assim, por seu peso na economia nacional, estimular a retomada do
desenvolvimento.
O banco está reativando o Programa
Emergencial de Acesso a Crédito (Peac) avalizado pelo Fundo Garantidor para
Investimentos (FGI) e poderá, no futuro, utilizar parte dos recursos levantados
com a venda de sua participação em grandes corporações para investir na
capitalização de empresas de menor porte.
Ao se referir ao que chamou de “sonho” de
utilizar recursos que o BNDES pode obter com a venda de participações em
companhias como Petrobras, Eletrobras, Vale e JBS para capitalizar empresas
menores por meio de participação societária, o presidente do banco, Gustavo
Montezano, observou que apoiar essas empresas pode resultar em mais
desenvolvimento social e mais desenvolvimento. E pode também resultar em “mais
voto no fim do dia”, completou. Dito em plena campanha eleitoral na qual seu
chefe, o presidente Jair Bolsonaro, busca avidamente uma reeleição que as
pesquisas indicam ser difícil de alcançar, Montezano deixa explícito o objetivo
político do apoio do BNDES aos pequenos empreendimentos.
Esse condenável vício eleitoreiro de origem
não tira da iniciativa, porém, algumas de suas características mais
importantes. Ela simboliza, em primeiro lugar, uma necessária mudança da
filosofia de atuação do BNDES. Nos governos lulopetistas, o banco colocou seus
recursos a serviço dos chamados “campeões nacionais”, com resultados
desastrosos em alguns casos e pouco expressivos em outros. Agora o BNDES, como
vem fazendo também a Caixa Econômica Federal, está focado na redução de sua
participação no capital de grandes companhias e no apoio aos empreendimentos de
menor porte. Assim, aumenta seu campo de atuação, estendendo-o para um universo
muito maior de empresas, e apoia empreendimentos com maior poder de influir na
vida da comunidade. Reduz-se a presença de grandes empresas.
Em junho, o banco anunciou a retomada da
linha FGI Peac, antes limitada a pequenas e médias empresas, mas agora ampliada
para microempresas e microempreendedores individuais. O programa foi lançado em
2020 para combater os impactos negativos da pandemia sobre a economia e vigorou
até o fim daquele ano. Segundo dados do BNDES, o programa propiciou a concessão
de mais de R$ 90 bilhões em créditos.
Montezano tem se referido aos
microempreendedores como “heróis nacionais”. A sobrevivência desses
empreendimentos em ambiente tão hostil como tem sido o da economia brasileira e
mundial em razão da pandemia e do conflito na Ucrânia mostra que, de fato, seus
responsáveis demonstram heroísmo que precisa ser apoiado.
Otimismo em alta
Parcela dos que esperam melhora econômica
tem salto; impacto no pleito é incerto
A evolução recente dos indicadores
econômicos já se reflete nas pesquisas sobre a confiança da população. O Datafolha
revela que o otimismo do eleitorado atingiu o patamar mais
elevado desde 2019.
A parcela dos que esperam que a situação do
país vá melhorar passou de 33% na sondagem anterior, de junho, para 48% agora.
O grupo dos brasileiros pessimistas com o futuro caiu de 34% para 18%.
Também mudou sensivelmente a percepção em
relação às perspectivas individuais. Os que esperam melhora de sua própria
condição são 58%, numa alta de 11 pontos percentuais; pensam o oposto apenas
8%, queda de 7 pontos.
Os humores, tudo indica, são influenciados
pelos dois fatores mais críticos para o bem-estar econômico —emprego e custo de
vida.
Depois de quase dois anos de alta acelerada
dos preços de produtos essenciais, como alimentos, combustíveis e energia,
agora há sinais de arrefecimento da inflação.
Apesar de a alta acumulada em 12 meses do
IPCA, índice de referência para o Banco Central, ainda ter ficado em 10,07% até
julho, houve finalmente uma redução material —com a deflação de 0,68% no último
mês da pesquisa.
O barateamento dos combustíveis, resultado
de intervenção nos impostos, foi o principal motivo, mas houve também
acomodação em preços industriais, que já respondem às menores pressões do
mercado internacional e à valorização recente do real.
Entretanto ainda não caíram os preços dos
alimentos, grupo que mais pesa na cesta de consumo dos mais pobres —o que ajuda
a explicar o menor otimismo entre os que ganham até dois salários mínimos (R$
2.424 mensais).
Quanto ao emprego e à renda, o desempenho
também tem sido benigno. No trimestre encerrado em junho, a taxa de desocupação
caiu para 9,3%, a menor desde o final de 2015, e tem sido surpreendente a
rapidez da criação de vagas, formais e informais.
Mesmo com o rendimento ajustado pela
inflação ainda cerca 5% abaixo do patamar do ano passado, a última pesquisa do
IBGE revela que a massa salarial (a remuneração média multiplicada pelo número
de ocupados) está em alta.
Mais incerto é o impacto desses números nas
pesquisas de intenção de voto. Embora Jair Bolsonaro (PL) tenha
reduzido a distância em relação a Luiz Inácio Lula da Silva, o
petista ainda lidera com folga.
Embora expressiva, a melhora das
expectativas é recente, bem como o aumento eleitoreiro dos valores do Auxílio
Brasil. E estão frescas as memórias dos dias difíceis —42% dos brasileiros
aptos a votar consideram que sua situação pessoal piorou nos últimos meses,
ante 26% que viram avanço.
Demônios eleitorais
Folha de S. Paulo
Bolsonaro lidera busca por voto evangélico;
perigo é violar laicidade do Estado
O cabo eleitoral mais disputado neste
início de campanha eleitoral é o Deus dos evangélicos. Não por acaso.
Calcula-se que os evangélicos, um grupo plural com diversas vertentes internas,
representem 25% do eleitorado, conforme o Datafolha; católicos são 53%.
Seja pelo peso numérico, seja pela
influência das lideranças religiosas, o fato é que os candidatos não podem
ignorar os anseios deste eleitorado. Nesse terreno, Jair Bolsonaro (PL) sai à
frente.
O mandatário ampliou de 10 para 17 pontos
percentuais a vantagem nesse estrato sobre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) —em
levantamento deste mês, surge com 49%
a 32%. Entre os católicos, Lula lidera com o dobro de intenções de
voto de seu adversário (52% a 27%).
Era de esperar que Bolsonaro liderasse
entre os evangélicos, dada a história de uso da pauta de costumes e de
aproximação com pastores. "Somos contra o aborto, contra a ideologia de
gênero, contra a liberação das drogas e somos defensores da família
brasileira", disse o presidente na Marcha para Jesus no Rio de Janeiro, em
julho.
Tampouco é novidade que o bolsonarismo
propaga fake news a esse público. A mais recente foi a afirmação do pastor e
deputado Marco Feliciano (PL-SP) de que Lula fechará igrejas se eleito.
Bolsonaro também mira os evangélicos como
meio de reduzir sua rejeição no eleitorado feminino. Para tanto aposta em sua
mulher, Michelle, adepta da crença e cada vez mais atuante na campanha.
A máquina do governo também tem seu papel.
Uma indicação ao Supremo Tribunal Federal contemplou os religiosos. Na semana
passada, a Receita ampliou a isenção de contribuições previdenciárias sobre a
remuneração de pastores.
Já o campo petista mostra que até
recentemente deixava de lado a necessidade de estabelecer uma comunicação
direta com esse público. Apenas no sábado (20), Lula informou ao
Tribunal Superior Eleitoral a criação de perfis nas redes sociais direcionados
a evangélicos.
Como já ocorreu em pleitos anteriores, é
provável que candidatos abandonem bandeiras que desagradem ao eleitorado
religioso mais conservador —como a descriminalização das drogas ou do aborto,
defendidas por esta Folha.
Nada há de ilegítimo em adaptar programas
de governo às preferências de parcela expressiva dos votantes. O perigo, como
sempre, está em pôr o Estado laico a serviço de dogmas da religião.
Investir em refino foi catastrófico para
Petrobras
O Globo
Projetos megalomaníacos de governos
petistas resultaram em produção seis vezes mais cara, segundo economistas
A Petrobras voltou a investir em refinarias
a partir do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje
candidato do PT à Presidência. Manteve o programa de investimento até 2014,
quando acabou o primeiro mandato de Dilma Rousseff. Na comparação de resultados
com refinarias congêneres no mundo, a empresa desperdiçou bilhões de dólares em
novas unidades, concluiu uma análise dos economistas Adriano Pires, Samuel
Pessôa e Luana Furtado publicada na semana passada no blog do Instituto Brasileiro
de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas.
A depender do critério estatístico, o custo
de produção de combustível ficou entre 382% e 536% acima dos parâmetros da
indústria petrolífera. A principal evidência do retorno ridículo do programa de
investimento surge quando se constata que, dos US$ 135,5 bilhões investidos
pela Petrobras em refinarias entre 1954 e 2021, 68% — ou US$ 91 bilhões —
correspondem apenas ao período de 2007 a 2014, que abrange o primeiro mandato
de Dilma.
Em sete anos, a Petrobras gastou no refino
dois terços de tudo o que investiu em quase sete décadas, sem obter nenhum
resultado aceitável. Para ser capaz de refinar 2,03 milhões de barris diários,
a estatal investiu, de 1954 a 1999, US$ 24,7 bilhões. Para instalar capacidade
de refino de mais 400 mil barris diários, entre 2003 e 2015 gastou US$ 100
bilhões (em valores de 2012). O descalabro é explicado pela ingerência política
na empresa na época, origem do escândalo do “petrolão”, desmascarado pela Operação
Lava-Jato.
São desse período várias decisões
temerárias, depois objetos de intensa investigação policial. É o caso da
construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, projeto que contaria com
investimento da venezuelana PDVSA, que depois recuou. Ou do Complexo
Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí, para onde foram
planejadas duas refinarias. Ou ainda de mais duas refinarias, uma no Maranhão e
outra no Ceará, que apenas ficaram na terraplenagem.
Dessas cinco refinarias, apenas parte de
Abreu e Lima está em operação. Nada mais saiu da prancheta, embora contratos
tenham sido assinados, equipamentos encomendados e propinas pagas. O que seria
um polo petroquímico às margens da Baía de Guanabara ficou reduzido a uma
unidade de processamento de lubrificantes. Agora, o plano é usar o gás do
pré-sal numa termelétrica. O outrora majestoso Comperj virou o Polo GasLub
Itaboraí, perdido num terreno de 11 quilômetros quadrados. Onde houve a maior
operação de terraplenagem do país hoje existe apenas um enorme descampado.
Numa análise anterior, os três economistas
concluíram que o custo de produção em Abreu e Lima — única refinaria em
operação — equivale a cinco ou seis vezes o de refinarias congêneres nos
Estados Unidos, México, Nigéria, Índia, Coreia do Sul ou Vietnã. Se a Petrobras
fosse uma empresa privada, os acionistas teriam demitido toda a diretoria e
afastado os conselheiros muito antes da catástrofe. Não permitiriam à empresa
acumular uma dívida de US$ 100 bilhões, na ocasião a maior de todo o universo
corporativo mundial. Ou então a empresa teria falido antes.
Analisar esses números é um exercício
recomendado para todos os candidatos a presidente que continuam a insistir em
usar os braços empresariais do Estado para tentar realizar sonhos de poder sem
base na realidade.
Governo tem de reagir ao assédio dos
médicos pela indústria farmacêutica
O Globo
Estudo verificou que 60% dos pediatras
aceitam mimos dos fabricantes de fórmulas infantis
O governo federal e as autoridades
sanitárias precisam reagir de forma enérgica para coibir o assédio de
fabricantes de fórmulas infantis a pediatras e nutricionistas. Reportagem do
GLOBO mostrou dados estarrecedores revelados por um estudo realizado por dez
instituições científicas de renome, como Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e
Universidade de São Paulo (USP), em maternidades das redes pública e privada do
Rio de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto (MG), Florianópolis, João Pessoa e
Brasília.
Seis de cada
dez pediatras e quase 90% dos nutricionistas recebem vantagens da indústria de
substitutos do leite materno durante eventos científicos. O agrado
mais comum costuma ser inofensivo, apenas calendários, bloquinhos ou canetas.
Em vários casos, porém, há pagamento de inscrição, convites para festas,
refeições, passagens e estadias. A prática, também frequente na classe médica e
tolerada pela leniência dos conselhos de ética, é contra a Lei 11.265/2006, que
proíbe patrocínios financeiros ou materiais a pessoas físicas.
É comum ouvir de pediatras ou médicos de
outras especialidades que os “patrocínios” em nada afetam suas decisões em
hospitais e consultórios. É um argumento ridículo. Mesmo que a justificativa
possa ser plausível, o conflito de interesse é óbvio e seria condenado em
qualquer categoria profissional. De um lado, a saúde dos pacientes, que devem
receber recomendações independentes. De outro, o interesse comercial de
fabricantes de produtos, que oferecem agrados para interferir nessas
recomendações. Se o “patrocínio” fosse inócuo, não existiria. Fabricantes de
fórmulas infantis e laboratórios farmacêuticos não são conhecidos por jogar dinheiro
pela janela.
Ao GLOBO, Cristiano Boccolini, pesquisador
da Fiocruz e um dos autores da pesquisa, afirmou haver relação entre a ação das
fabricantes de fórmulas infantis e o avanço insatisfatório do Brasil na
amamentação materna. Nas últimas décadas, o aleitamento materno exclusivo até
os seis meses de idade cresceu, mas ainda está em torno de 46%. Pelos
parâmetros da Organização Mundial da Saúde (OMS), para o desempenho ser
considerado bom, teria de estar entre 50% e 89%.
Governo, Conselho Federal de Medicina e
Conselho Federal de Nutricionistas não podem ser coniventes com as fabricantes
de substitutos do leite materno que desrespeitam a lei, com os profissionais
que fingem acreditar que aquele hotel ou passagem aérea são mesmo de graça e
com essa cultura deletéria, permissiva e leniente, que contribui para
deteriorar a saúde brasileira. Não há distinção ética entre esse comportamento
e o dos políticos e funcionários públicos corruptos que todo profissional de
saúde, como os demais brasileiros, adora criticar.
TSE acerta ao recuar e dar mais
transparência a candidaturas
Valor Econômico
É imprescindível que os eleitores possam
analisar se seus candidatos enriqueceram ou não após chegarem ao poder
Em uma importante correção de rota, o
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu na semana passada voltar a dar mais
transparência à divulgação das posses dos candidatos que disputarão algum cargo
eletivo em outubro. Foi um acertado recuo. Até então, o eleitor não tinha como
saber em detalhes os bens de cada postulante.
Uma boa ideia seria espelhar no sistema
público do TSE a declaração feita por cada candidato à Receita Federal. E isso
se trata de uma medida que vai além da mera curiosidade sobre qual o modelo de
automóvel ou motocicleta cada candidato possui.
Em eleições passadas, era possível
pesquisar, por exemplo, qual tipo de investimento um político possuía. Uma
informação relevante para a imprensa e órgãos de controle, capaz de apontar se
poderia haver algum conflito de interesses entre a atuação pública e as
finanças particulares de um parlamentar ou detentor de cargo executivo.
Mas isso mudou com vigência da Lei Geral de
Proteção de Dados. Aprovada em 2018 e com validade a partir de 2020, a chamada
LGPD alterou a maneira como instituições públicas e privadas coletam, armazenam
e disponibilizam informações de usuários. E diante desse novo contexto, restou
à Justiça Eleitoral estudar o impacto das regras sobre os registros de
candidaturas depois que um suplente de vereador do município de Guarulhos (SP)
pediu a exclusão de dados a seu respeito em razão de ameaças sofridas por ele
durante o processo eleitoral.
Ex-presidente do TSE e relator do tema no
tribunal, o ministro Edson Fachin chegou a defender uma divulgação mais
restrita da declaração de bens. Porém, foi voto vencido.
Ganhou a tese do ministro Alexandre de
Moraes, que horas antes sucedera Fachin no comando do tribunal. Ele foi seguido
por todos os demais ministros que votaram - Ricardo Lewandowski, Mauro
Campbell, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Com isso, de forma acertada, a Corte
Eleitoral reviu sua posição. Agora, serão mantidos públicos os dados dos
candidatos, incluindo informações pessoais e declarações de bens na íntegra e
de maneira individualizada. Ficou definido, também, que não haverá limitação
temporal para a publicidade dos dados fornecidos à Justiça Eleitoral.
Por outro lado, serão ocultados os dados
que possam comprometer a segurança do postulante. Entram nessa lista endereço
completo, número de telefone e e-mail pessoal. Buscou-se um meio termo.
Durante o julgamento, o novo presidente do
TSE argumentou que a LGPD é uma lei geral e a legislação eleitoral deve ser
mais específica, “de modo que legislação eleitoral não se sujeita às restrições
da lei geral”. De acordo com o ministro, as medidas trazidas pela nova norma
“não se aplicam dentro do sistema eleitoral de transparência e publicidade”.
É imprescindível que os eleitores possam
analisar se seus candidatos enriqueceram ou não após chegarem ao poder. “É
importante que os eleitores possam, inclusive, analisar a evolução patrimonial
dos seus candidatos. Que possam analisar o patrimônio dos seus candidatos. As
informações gerais dos seus candidatos. Salvo situações excepcionais, a
administração pública tem o dever de absoluta transparência”, argumentou Moraes
durante o julgamento. E é justamente isso o que determina de forma expressa a
Constituição Federal, que em seu artigo 37 estabelece os princípios da
administração pública - legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência.
Na prática, o julgamento marcou a estreia
de Alexandre de Moraes à frente do plenário do Tribunal Superior Eleitoral. Ele
tomou posse da presidência da corte horas antes, numa sessão que já ficou para
a história pela defesa do sistema eleitoral e da democracia.
Na ocasião, Moraes pronunciou um enfático
discurso a respeito da eficiência da Justiça Eleitoral na realização do pleito,
contabilização dos votos, auditoria e divulgação dos resultados. Isso tudo é
uma verdade reconhecida pela comunidade internacional e pela grande maioria da
população brasileira.
O julgamento da semana passada, contudo, mostrou que também cabe à Justiça Eleitoral zelar por outros aspectos da disputa. A decisão, embora acertada, foi dada a poucas semanas do primeiro turno. Resta agora ao TSE assegurar que ela seja implementada de forma célere, a fim de garantir que o eleitor se apresente em frente às urnas com todas as informações necessárias para fazer a melhor escolha.
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