terça-feira, 1 de novembro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Brasil tem dever de repudiar ‘Capitólio dos caminhoneiros’

O Globo

Bolsonaristas adotam estratégia de Donald Trump para tentar ganhar no grito eleição perdida na urna

Até o fechamento desta edição, o presidente Jair Bolsonaro não havia se manifestado sobre a derrota para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva no domingo. Mas bolsonaristas — decerto supondo contar com a aprovação tácita de Bolsonaro — já punham em marcha desde a véspera a mesma estratégia de Donald Trump nos Estados Unidos para criar confusão e contestar o resultado.

O primeiro ato foi protagonizado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), ao violar a proibição de blitzes determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A proibição visava a evitar a manobra, comum nos Estados Unidos, conhecida como “supressão de voto”. Trata-se da tentativa de dificultar o acesso às urnas de eleitores mais pobres ou menos instruídos para reduzir a votação daqueles em que esses estratos costumam votar. Quase metade das blitzes da PRF, que causaram engarrafamentos colossais, foi no Nordeste, onde Lula teve melhor desempenho.

O uso da força policial para favorecer Bolsonaro é ato escandaloso, que precisa ser investigado e punido. O diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques, chegou no sábado a pedir voto em Bolsonaro numa rede social (depois apagou o pedido). Só recuou depois de uma reunião em que o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, determinou multa horária de R$ 100 mil em caso de desobediência. Por ver a PRF como uma espécie de milícia bolsonarista, fica evidente que Vasques não tem mais condição de permanecer no cargo.

A rebelião não ficou por aí. Desde que foi proclamado o resultado no domingo, manifestações de caminhoneiros começaram a pipocar pelo Brasil, com bloqueios em rodovias como a Dutra, entre Rio e São Paulo, ou a BR-163, no Norte de Mato Grosso. Tão preocupante quanto o transtorno provocado pelos bloqueios é o desvario dos manifestantes. Em vídeos bizarros, caminhoneiros convocam apoiadores de Bolsonaro a engrossar os protestos, dizem que vão “parar tudo” e pedem intervenção militar. Alguns afirmam que só liberarão as estradas quando as Forças Armadas estiverem no controle. Ameaçam ainda interromper o abastecimento de alimentos no país. Pior: alegam agir “em nome da democracia”.

A devoção dos caminhoneiros a Bolsonaro é conhecida. No uso escandaloso da máquina pública para tentar a reeleição, ele fez de tudo para agradá-los. Em troca, agora colhe essa fidelidade golpista. A ação dos caminhoneiros faz lembrar a invasão violenta do Capitólio nos Estados Unidos, em 6 de janeiro, por baderneiros inconformados com a derrota de Trump. Tudo de que o Brasil não precisa agora é um “Capitólio dos caminhoneiros”.

As eleições acabaram. Lula venceu, Bolsonaro perdeu. É hora de apaziguar os ânimos e seguir em frente. Na transição, espera-se no mínimo a colaboração do atual presidente. Não há espaço para contestação de resultados, muito menos para aventuras golpistas. A vitória de Lula já foi reconhecida pelos demais Poderes, por aliados do atual presidente e por governos estrangeiros. É inconcebível tentar ganhar no grito uma eleição que Bolsonaro perdeu nas urnas. A sociedade não pode ser chantageada por antidemocratas que não aceitam as regras do jogo, a não ser quando vencem. As forças de segurança precisam agir com rigor para impedir o bloqueio das estradas. Da mesma forma, as ameaças golpistas têm de ser investigadas.

Mais uma vez, mesmo sob ataques, TSE promoveu eleição impecável

O Globo

Segurança e confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro voltam a ser reconhecidas pelo mundo todo

Ficou comprovado mais uma vez no domingo que o sistema eleitoral é um patrimônio do Brasil. Com destaque especial para a tecnologia das urnas eletrônicas, para a logística de distribuição e para a segurança e confiabilidade da apuração. As eleições brasileiras são uma das quatro maiores do mundo e a única que divulga resultados no mesmo dia da votação “com segurança e transparência”, nas palavras do ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Menos de três horas após o fechamento das urnas, os brasileiros já sabiam o nome do próximo presidente e dos governadores onde houve segundo turno.

Em mensagem ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente americano, Joe Biden, ressaltou o processo eleitoral “livre, justo e confiável”. O responsável pela política externa da União Europeia, Josep Borrell, elogiou o TSE “pela forma eficaz e transparente como conduziu seu mandato constitucional ao longo de todas as fases do processo eleitoral, demonstrando uma vez mais a força das instituições brasileiras e da sua democracia”.

O segundo turno das eleições deste ano registrou o maior número de votos da história brasileira. Houve queda na abstenção e nos votos brancos e nulos. Com isso, pouco mais de 75% do eleitorado escolheu um dos dois candidatos a presidente, prova de que não falta legitimidade ao sistema de escolha.

Tal nível de eficiência num país de dimensões continentais não é casual. Para se tornar uma realidade, são necessários um planejamento minucioso e uma execução cuidadosa. Foi exatamente isso o que aconteceu mais uma vez no Brasil. Das 472.075 urnas eletrônicas utilizadas, menos de 1% teve de ser substituído. Em contraste com o pleito do dia 2 de outubro, no domingo não foram registradas longas filas, sinal de que deu certo o treinamento dos mesários.

O TSE logrou garantir ao país uma eleição limpa, confiável e rápida mesmo sofrendo ataques sórdidos e mentirosos. Há anos, o presidente Jair Bolsonaro não perde uma oportunidade de levantar suspeitas sem prova alguma sobre o sistema eletrônico de votação. Mesmo sob a pressão dessas investidas e num pleito extremamente polarizado, o TSE cumpriu seu papel.

Um dos pontos a lamentar é o silêncio do Ministério da Defesa. Chamado a participar da fiscalização das urnas com outras organizações, até agora a pasta não se manifestou, numa decisão que só faz levantar suspeitas sobre suas reais motivações. Não que o TSE precise dessa chancela. Quem precisa agora desfazer as suspeitas são as próprias Forças Armadas. Do contrário, só darão mais credibilidade aos indícios de que tenham aceitado fazer o jogo do bolsonarismo.

Força oposicionista

Folha de S. Paulo

Eleições para Legislativo e estados indicam que Lula terá de fazer concessões

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é o primeiro a obter um terceiro mandato por meio do voto, e Jair Bolsonaro (PL) é o primeiro presidente a perder a reeleição. O conjunto dos ineditismos de 2022, porém, não configura situação política favorável para o recém-eleito.

Lula volta ao poder com a maioria mais diminuta de um presidente desde a redemocratização. O incumbente foi derrotado pela repulsa de metade do eleitorado, mas não deixou de obter votação expressiva, tendo a seu favor a queda do desemprego e da inflação.

Dado o resultado das urnas, o petista chega ao poder com menos capital eleitoral e popularidade para queimar. Terá, assim, menos tempo para elaborar um programa de aceitação nacional mais ampla, urgência extremada pela situação social e econômica.

Lula terá de lidar com um Congresso de composição inédita na República de 1988. Partidos do velho centrão, de centro-direita e direita dominam cerca de metade da Câmara, ao menos. O centro e partidos tradicionais como MDB e PSDB perderam peso relativo ou se tornaram diminutos. A esquerda teve o pior resultado desde 1998.

O Senado tem um bloco de 35 parlamentares de PL, União Brasil, PP e Republicanos. Um outro grupo mais centrista, de MDB, PSD e PSDB, tem 24 cadeiras. O PT e seus aliados tradicionais à esquerda, 13. Embora a casa seja mais ponderada do que a Câmara, a negociação ali será também penosa.

Filiações partidárias são maleáveis e sujeitas a condições tais como a popularidade presidencial ou a barganha de poder. O ponto de partida, porém, indica que o custo de convencimento será maior, tanto mais porque parte relevante dos eleitos têm compromissos mais estritos com um eleitorado conservador ou reacionário.

No comando dos estados, a esquerda teve também seu pior resultado desde 1998. A relação dos governadores com o Executivo federal, porém, costuma se dar em termos algo mais construtivos, por interesse de cooperação administrativa e de repartição de fundos.

Registre-se que até o bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos), que conquistou o Palácio dos Bandeirantes, declarou que pretende trabalhar em harmonia com o governo petista de Brasília.

É fácil perceber que Lula terá de negociar cargos e planos a fim de montar uma coalizão parlamentar, conquistar eleitores oposicionistas, manter aqueles que aderiram a sua candidatura por rejeição a Bolsonaro e obter apoios sociais que fundamentem esses movimentos políticos.

O presidente eleito tem reafirmado que seu governo irá muito além do PT. Trata-se um bom ponto de partida, mas a tarefa será árdua.

Crédito perigoso

Folha de S. Paulo

Estimular dívida com Auxílio Brasil não é o melhor caminho para reduzir pobreza

Em mais um caso de uso da máquina pública para fins eleitorais, o governo Jair Bolsonaro (PL) abriu um caminho perigoso ao liberar o acesso de beneficiários do Auxílio Brasil ao crédito consignado.

Cerca de 20 milhões de inscritos no programa poderão obter financiamento que pode chegar a mais de R$ 2.500. A restrição principal é para a parcela mensal do pagamento, que não pode superar R$ 160. O prazo máximo é de 24 meses, com limite de 3,5% ao mês para os juros.

Em que pese o potencial benefício para muitas famílias já endividadas ou em situação de necessidade, o incentivo a que contraiam mais empréstimos é temerário.

A começar pelos juros, que podem ser até 87% mais altos que os cobrados em outras modalidades de crédito com desconto na renda dos assalariados dos setores público e privado ou de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Isso ocorre porque é muito maior a probabilidade de que um cadastrado no Auxílio Brasil deixe o programa e, assim, perca a capacidade de pagamento. A situação é distinta daquela de um servidor público ou aposentado, que tem renda permanente.

Não por acaso, o interesse dos bancos foi baixo. Apenas 12 instituições se cadastraram e foram autorizadas a operar o programa, com destaque absoluto para a Caixa Econômica Federal. Nenhum dos grandes privados se inscreveu.

Além do risco de crédito, há a preocupação com abalos na imagem se for necessário lidar com inadimplência, que certamente será maior que a observada em outros tipos de financiamento consignado.

Outros sinais da precariedade do programa vêm de questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU), que levaram a Caixa a suspender a concessão por alguns dias, e também da objeção de entidades de defesa do consumidor, que veem na iniciativa uma armadilha para as famílias.

O estímulo ao endividamento a partir de um programa de amparo criado às pressas não é uma política das mais promissoras. Muito melhor é garantir renda mínima permanente em montante digno, mas com condicionalidades e foco na pobreza e na primeira infância.

Tais elementos foram enfraquecidos pela ânsia do governo em maximizar o número de beneficiários, sem cuidado em manter cadastro adequado e proximidade com a população pela presença de agentes sociais nos municípios.

Lula não ganhou um cheque em branco

O Estado de S. Paulo

Muitos dos que votaram no petista o fizeram não por apoiar seu programa, aliás inexistente, mas para frear Bolsonaro. Lula precisa entender que sua eleição não é aval à agenda do PT

O discurso da vitória mostrou que Luiz Inácio Lula da Silva conhece as reais circunstâncias nas quais foi eleito, pela terceira vez, presidente da República. “Esta não é uma vitória minha, nem do PT, nem dos partidos que me apoiaram nessa campanha”, disse. Esse reconhecimento é muito importante, pois indica que Lula aparentemente captou o recado das urnas – e não pode, sob pena de inviabilizar seu governo, ignorar esse recado uma vez investido da Presidência.

Uma parte significativa do eleitorado certamente não votou em Lula por concordar com o programa de governo do PT, até porque não foi apresentado nenhum programa de governo. Para esses eleitores, certamente na casa das dezenas de milhões, foi um voto para impedir que Jair Bolsonaro ficasse mais quatro anos no Palácio do Planalto. Foi um voto contra os devaneios autoritários, contra o conflito institucional, contra a irresponsabilidade no cuidado da população, contra a agressividade na vida política e social. Foi um voto, como Lula admitiu no domingo, “para que a democracia saísse vencedora”.

Eis um fato inegável das eleições de 2022. O PT ganhou a eleição presidencial, mas não obteve um cheque em branco da população. Apesar de disputar com o presidente da República mais disfuncional e incompetente desde a redemocratização, Lula não ganhou no primeiro turno. E, a confirmar as imensas reservas que o eleitorado tem em relação ao PT, a distância de votos entre Lula e Bolsonaro diminuiu significativamente no segundo turno. Em relação ao dia 2 de outubro, o candidato do PL conquistou no domingo mais 7,1 milhões de votos (de 51,1 milhões foi para 58,2 milhões) e o do PT, mais 3 milhões (de 57,3 milhões foi para 60,3 milhões).

O resultado estreitíssimo – nunca um candidato a presidente da República havia ganhado as eleições com tão pequena margem de vantagem – confirma a importância de ter havido um segundo turno. Por mais que tenha sido uma campanha sem projetos e sem propostas, na qual as agressões e mentiras foram as grandes protagonistas, essas quatro semanas serviram para que o resultado final das eleições manifestasse, tal como deve ocorrer na democracia, as preferências do eleitorado. Tanto no primeiro turno como no segundo, não houve o menor indício de adesão incondicional da população ao lulopetismo. E essa inequívoca mensagem do eleitor tem de ser respeitada e acolhida pelo candidato eleito não apenas no discurso da vitória, mas ao longo de todo o governo. Trata-se de uma decorrência da própria ideia de democracia representativa. Todo o poder emana do povo, diz a Constituição de 1988 em seu primeiro artigo.

No domingo à noite, Lula assumiu um compromisso importante com o País. “A partir de 1.º de janeiro de 2023, vou governar para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para aqueles que votaram em mim”, afirmou. Depois de quatro anos de um governo que insistiu em dividir a sociedade e em agredir todas as instituições que não lhe foram submissas, aqui está o maior desafio do próximo presidente da República. É preciso promover a paz e a união, distensionar as relações entre os Poderes, respeitar quem pensa de forma diferente. Nada disso ocorrerá se Lula repetir o que foi feito nos 13 anos de PT no governo federal. Os tempos atuais demandam um novo agir. 

Diante da rejeição do eleitorado brasileiro ao PT, Lula, para ganhar as eleições, teve de recorrer ao apoio de lideranças políticas cujo histórico é muito diferente do de seu partido. No discurso de domingo, o presidente eleito reconheceu esse fato, agradecendo, em primeiro lugar, o apoio da senadora Simone Tebet no segundo turno. Essa necessidade de ampliar a base estava explícita já na própria composição da chapa, com Geraldo Alckmin como candidato a vice. Se ter ido muito além do PT foi importante para Lula ganhar as eleições, essa abertura será ainda mais necessária para cumprir o compromisso de governar para todos os brasileiros.

“A ninguém interessa viver num país dividido, em permanente estado de guerra”, disse Lula no domingo. Ninguém mais do que o presidente eleito tem a possibilidade de promover a paz e a união no País. Essa é agora sua responsabilidade, que não pode ficar apenas em palavras. 

Por uma transição pacífica

O Estado de S. Paulo

Finda a disputa eleitoral, lideranças associadas a Bolsonaro deram demonstrações de compromisso com a democracia. Esse é o espírito que deve pautar período de transição de governo

Os resultados não deixam dúvida: a eleição presidencial deste ano foi a mais acirrada da história do País. A diferença entre a votação obtida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) foi de pouco mais de 2 milhões de votos. De um lado, isso expõe um país profundamente dividido entre duas lideranças populares. Por outro, reafirma a força de nossa jovem democracia. Encerrada a disputa eleitoral, é chegado o momento de pacificação, sobretudo nos próximos dias, quando se inicia o período de transição de governo.

Há 20 anos, a Lei 10.609/2002 se tornou um marco nacional ao regulamentar a instituição de uma equipe de transição para o presidente eleito, tradição que o País seguia informalmente desde 1989. Ao futuro presidente, compete o direito de nomear até 50 pessoas para cargos especiais, entre eles um coordenador, para ter acesso a informações sobre o funcionamento de todos os órgãos da administração pública e preparar atos de sua iniciativa a serem editados após a posse. A nomeação formal deste gabinete cabe ao ministro da Casa Civil, cargo hoje ocupado por Ciro Nogueira.

Não se trata da antecipação do fim do mandato de Jair Bolsonaro, o que acontecerá no dia 31 de dezembro deste ano, ou de um gesto de elegância ou gentileza do incumbente para com seu sucessor. É apenas e tão somente o estrito cumprimento da lei, algo que se espera tanto de Bolsonaro quanto de Lula. Uma transição pacífica, no entanto, exige uma maturidade que o presidente não demonstrou na noite de domingo, quando foi incapaz de cumprimentar o adversário ou ao menos agradecer a confiança depositada por mais de 58 milhões de brasileiros que foram às urnas para votar por sua reeleição.

Se não precisa se envolver diretamente com essa passagem, Bolsonaro tampouco pode boicotá-la ou recusar-se a aceitar seus termos. Aceitar derrotas, afinal, é algo intrínseco a todos que optam pela vida pública – e o fato de Bolsonaro e alguns bolsonaristas terem demonstrado dificuldade para formular um discurso para um momento como este diz muito sobre suas convicções democráticas. A despeito desse constrangedor silêncio presidencial, há razões para acreditar que o País atravessará esse período com a conciliação necessária. Da parte de Lula, em seu primeiro discurso após a vitória, ele acertadamente pregou união e prometeu um governo para todos os brasileiros, independentemente de suas escolhas políticas.

Lideranças associadas a Bolsonaro também deram demonstrações de lucidez e compromisso inequívoco com a democracia. Talvez a mais importante delas tenha vindo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Mais do que um mero aliado, Lira foi a garantia de uma estabilidade política sem a qual provavelmente Bolsonaro não teria conseguido concluir o mandato, daí a relevância de suas declarações reconhecendo o resultado das urnas minutos após o anúncio pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “A vontade da maioria manifestada nas urnas jamais deverá ser contestada. Seguiremos em frente na construção de um País soberano, justo e com menos desigualdades”, afirmou.

Da mesma forma, o ex-ministro de Infraestrutura de Bolsonaro e governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas, assegurou que buscará manter uma relação republicana com o presidente eleito. “A partir de agora vamos olhar para frente, olhar para os interesses do Estado de São Paulo”, disse, reconhecendo a importância do entendimento entre Estados e o governo federal. Já o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, deputado federal eleito pelo PL-SP, postou, por meio de sua conta do Twitter, que o resultado eleitoral traz reflexões e a necessidade de buscar caminhos de pacificação de um país dividido ao meio. “É hora de serenidade.”

É por esse espírito democrático que este jornal espera que o período de transição de governo seja marcado. Que a reação do bolsonarismo radical à eleição de Lula, simbolizada pelo deselegante silêncio de Bolsonaro sobre o resultado, pela deputada doidivanas que apontou uma arma para um desafeto no meio da rua e pelos caminhoneiros que promoveram baderna para protestar contra a vitória petista, seja apenas esperneio de mau perdedor. 

O sistema eleitoral orgulha o Brasil

O Estado de S. Paulo

Que a alegada ‘fragilidade’ das urnas volte a ser o que sempre foi: um não assunto, que só interessa a golpistas

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi novamente um dos grandes protagonistas no segundo turno da eleição geral, ao lado dos dois candidatos à Presidência da República, dos candidatos ao governo de 12 Estados e, é claro, dos mais de 156 milhões de eleitores aptos a votar neste ano.

Tratou-se de um protagonismo bem distante do sentido que o presidente Jair Bolsonaro tentou atribuir à atuação do TSE, qual seja, o de “desequilibrar” a disputa em favor do petista Luiz Inácio Lula da Silva. Nada mais longe da verdade factual.

Com tenacidade ímpar para lidar com ataques igualmente inauditos contra o sistema eleitoral – até mesmo no dia da eleição, como as operações da Polícia Rodoviária Federal, no mínimo irregulares, demonstraram –, o TSE garantiu que o pleito transcorresse com total tranquilidade, sem dar azo aos mais tênues indícios que pudessem comprometer a lisura do pleito e, principalmente, a legitimidade dos eleitos.

Tanto foi assim que logo após a confirmação do resultado da eleição presidencial, dignitários do mundo inteiro, como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden; o presidente da França, Emmanuel Macron; e os primeiros-ministros da Espanha, Pedro Sánchez; e da Alemanha, Olaf Scholz, entre outros, vieram a público cumprimentar Lula da Silva por sua inquestionável vitória.

Não resta dúvida, portanto, de que o sistema eleitoral é digno da mais firme confiança dos cidadãos brasileiros. A bem da verdade, essa confiança jamais havia sido posta em xeque com seriedade, ou seja, para além das lamúrias de um ou outro perdedor, até que Bolsonaro resolvesse fazer da mentira sobre a “fragilidade” das urnas eletrônicas uma muleta para seu golpismo escancarado.

Desde que assumiu a Presidência, Bolsonaro pôs-se a atacar a higidez do mesmo sistema eleitoral que permitiu que não apenas ele, mas quase toda a sua prole fizesse da atividade política um negócio familiar. O desiderato do presidente nunca foi sequer escamoteado: disseminar suspeição sobre a segurança das urnas como forma de justificar uma derrota que decorreu primordialmente de um governo ruim. Até as Forças Armadas foram envolvidas nesse ardil. Aliás, o Ministério da Defesa ainda deve à sociedade o relatório da “fiscalização” da votação feita pelos militares.

Desde que as urnas eletrônicas foram adotadas, em 1996, a segurança do sistema eleitoral brasileiro nunca fez parte da agenda do debate público, sempre foi um não assunto. A rigor, quando se tratou do modelo do País para organizar e apurar eleições ao longo desses 26 anos, foi para enfatizar a confiabilidade de um sistema que se tornou referência para os países democráticos e orgulho para o Brasil.

Foi todo esse histórico de sucesso que o TSE se pôs a defender firmemente na eleição de 2022. Não foi uma tarefa trivial, considerando que a principal origem dos ataques ao sistema foi ninguém menos que o presidente Jair Bolsonaro, do alto do cargo que ocupa. Agora, passada a eleição, que a alegada “fragilidade” do sistema eleitoral volte a ser um não assunto, que só interessa a golpistas. 

Urnas abrem leque de opções para disputa em 2026

Valor Econômico

O eixo SP-Minas deixou de ser tucano, mas mantém peso determinante na gestação de alternativas de poder

O fim de uma eleição presidencial é o início da próxima. A disputa de 2026 poderá se dar em bases distintas. Com a saída de Lula da cena política, haverá uma troca de gerações no PT e a ascensão de lideranças que se consolidaram hoje nas urnas. A distribuição do comando político entre os principais Estados da federação tende a colocar novos personagens na disputa pelo Planalto em 2026, insinua uma potencial reordenação de forças em busca da centro-direita perdida e mantém no cenário a possibilidade de Jair Bolsonaro capitanear uma oposição barulhenta e radical.

A sucessão de Lula no PT nunca foi colocada a sério e a dependência do partido de seu líder único deixou a renovação a meio caminho. Fernando Haddad é o político mais próximo do presidente eleito e com mais chances de substituir Lula em eleições presidenciais, como fez em 2018, quando o ex-presidente estava preso em Curitiba. Lula ofuscou outros pretendentes natos do partido. Após seus dois primeiros mandatos, quando teve de escolher quem concorreria ao Planalto pelo PT, Lula ignorou os quadros partidário e optou por uma militante recém-egressa do PDT, Dilma Rousseff, cujo governo foi muito mal-sucedido. O PT tem bons quadros regionais, mas praticamente nenhum de projeção nacional, com exceção de Haddad.

A sucessão petista poderá importar menos se Lula fizer um mau governo ou for impedido de governar por uma oposição generalizada. Esse seria o pior cenário, o status quo da alternância dos dois polos na Presidência, com Lula sucedendo Bolsonaro e depois sendo sucedido por Bolsonaro novamente, ou por alguém com as mesmas posições políticas. Resta, no entanto, saber qual o papel que Jair Bolsonaro desempenhará a partir de janeiro. Pela primeira vez em 32 anos, estará na planície, sem mandato e possivelmente com dezenas de processos o perseguindo na Justiça.

Bolsonaro não teve interesse em criar um partido seu e o atual ao qual é filiado, o PL, pertence a Valdemar Costa Neto, cujos interesses não coincidem sempre com os do clã Bolsonaro. Sem ser formalmente líder de nada, indisciplinado e destrutivo, é duvidoso que Bolsonaro construa, com ou sem o PL, um movimento organizado longevo. Até hoje não teve nenhum interesse nisso.

Com o crescimento dos bolsonaristas no polo extremo, há um vácuo na centro-direita a ser preenchido - a terceira via não conseguiu fazê-lo em 2022 -, e que foi ocupado pelo PSDB. Pelo lado das forças políticas que não se inclinaram para o bolsonarismo, Simone Tebet (MDB), a governadora eleita de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), e o governador reeleito do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), podem galvanizar um reordenamento de grupos centristas que desapareceram do mapa político. Tebet, que fez uma boa campanha presidencial, continuará em evidência, pois deverá fazer parte do novo governo de Lula.

Entre os que ascenderam apoiados na onda bolsonarista, há candidatos naturais a tentar a sorte em uma disputa em que os favoritos do passado, como Lula, se foram e sem outro líder popular, como Bolsonaro, no páreo. O governador reeleito de Minas, Romeu Zema (Novo), é um deles. Zema é conservador, apoiou o presidente no segundo turno, mas guardou prudente distância dele no primeiro turno, quando enfrentou a candidatura apoiada pelo PT de Alexandre Kalil (PSD). Moderação e movimentos em direção ao centro podem posicioná-lo na próxima corrida presidencial.

Ao assumir o comando do Estado mais rico do país e desbancar os tucanos, que governaram São Paulo por 28 anos, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro da Infraestrutura de Bolsonaro, reuniu condições políticas para pensar em voos mais altos em 2026. Mais burocrata que homem de partido, Tarcísio bateu tucanos e petistas e alinhou as forças conservadoras do Estado. Se Bolsonaro naufragar na operação política de comandar a oposição ao governo Lula, algo difícil de se realizar sem cargos públicos ou partidários que lhe deem evidência e publicidade, Tarcísio pode tentar voo em aliança com legendas mais moderadas, como o PSD, de Ratinho Jr, reeleito para o governo do Paraná.

O PSD de Kassab, por seu lado, esteve na operação que engendrou a candidatura de Tarcisio e de Kalil e, ao que tudo indica, fará aliança com Lula. Kassab foi ministro de Dilma Rousseff. Tem a quinta maior bancada na Câmara, com 42 deputados.

O eixo SP-Minas deixou de ser tucano, mas mantém peso determinante na gestação de alternativas de poder. O desempenho do governo Lula determinará, claro, as chances de seus opositores e a de seu sucessor.

2 comentários:

Anônimo disse...

Vergonha nacional! A ação da PRF durante e após as eleições foi realmente vergonhosa, escandalosa! A PRF agiu e age como uma MILÍCIA BOLSONARISTA! Seu diretor tem que ser demitido imediatamente! Já torturaram e assassinaram um cidadão dentro duma viatura, e quase nada aconteceu... Se associam aos caminhoneiros antidemocratas e nada fazem para liberar as rodovias. E os bolsonaristas que se diziam defensores da liberdade absoluta, apoiam estes bloqueios que impedem o ir e vir de todos os cidadãos!

Anônimo disse...

Bolsonaro é um canalha omisso! 2 dias de omissão permitindo que seus milicianos caminhoneiros bloqueiem rodovias federais prejudicando toda a população, e o canalha nada fez para resolver os bloqueios! GENOCIDA INCOMPETENTE!