O Globo
Confinar mulher, afrodescendente e indígena
a pastas temáticas ou sem peso político chega a ser constrangedor
Mais uma semana, e Lula,
finalmente, descobrirá o que é uma herança maldita de verdade. Um país dividido
e endividado, ainda mais devastado e injusto que o de praxe. Pode chamar de
carma, se quiser: as sementes desta calamidade foram plantadas nos últimos
governos de seu partido, resultando na onda antipetista que levou à eleição de
Bolsonaro.
Lula não há de alimentar ilusões de que sua
vitória tenha sido mais que uma reação a esse que foi, possivelmente, o pior
governo desde Tomé de Souza. Não, não é por saudade do mensalão, do petrolão e
das saudações à mandioca que sua estrela voltou a brilhar.
Houvesse ali um campo para profissão, a certidão de nascimento de todo brasileiro poderia vir pré-preenchida com “Esperança”. É ela que nos move, mesmo nos gestos de desespero. Como eleger, em 2018, quem quer que fosse —desde que tirasse o PT do poder. Ou fazer o que tivesse de ser feito para mandar Bolsonaro embora, ainda que à custa de trazer o PT de volta.
A vacina contra um novo bolsonarismo (com
ou sem Bolsonaro) em 2026 era uma frente ampla, isolando os radicais e
fortalecendo o campo democrático. Em vez disso, o que veio, até agora, foi mais
do mesmo — a hegemonia do partido vencedor, dando sobrevida à polarização sem a
qual o PT não respira.
Lula disse estar “tentando fazer um governo
que represente, no máximo que a gente puder, as forças políticas que
participaram conosco da campanha”. Esse máximo está muito aquém do mínimo que o
mais cético poderia esperar.
Deu para ver que importa menos que o Bolsa
Família chegue a quem precisa e mais que isso seja feito pelas mãos do PT.
Menos que a pauta ambiental seja retomada e mais que o protagonismo seja do PT.
Menos que o país cresça e mais que se dobre aos dogmas econômicos do PT. O
combate à miséria, a preservação do meio ambiente etc. interessam na medida em
que rendam dividendos eleitorais ao partido. Só isso explica o alijamento de
apoiadores como Simone Tebet, Marina Silva e
os economistas liberais.
Uma das boas consequências do ministério
anunciado até aqui é o desmonte da falácia da representatividade como um valor
em si. Governo não é filme da Disney nem anúncio da Benetton, mas confinar
mulher, afrodescendente e indígena a pastas temáticas ou sem peso político
chega a ser constrangedor.
E qual a lógica de um Ministério da Justiça
que não cuide dos direitos humanos? De um Ministério dos Direitos Humanos
aparentemente voltado só para humanos brancos do sexo masculino — afinal, para
os demais, existem os ministérios das Mulheres, da Igualdade Racial, dos Povos
Indígenas. De o Ministério dos Transportes só ter jurisdição sobre o que se
move no seco e no chão, porque há um ministro específico para portos e
aeroportos? De um para a Agricultura e outro para Desenvolvimento Agrário e
Agricultura Familiar? A ideia deve ser dividir, multiplicando cargos, para
governar. O Planejamento e a Gestão que lutem para fazer essa geringonça
funcionar.
Com este quinto mandato, o PT já é penta.
Se mantiver a tática do desenvolvimentismo do atraso (contra o marco do
saneamento, a reforma trabalhista, as privatizações), há o risco de ficar como
o Brasil, correndo 20 anos rumo ao hexa. Em vão.
5 comentários:
Importa muito menos o que um imbbecil como esse affonso diz e escreve a soldo, do que é capaz de fazer um presidente eleito com 60 milhões de votos lúcidos
Olhando por aí, realmente Bolsonaro só existiu por causa do Pt e da facada. É obrigação do Lula e do Pt consertar.
Parabéns, Eduardo Affonso, análise irrepreensível do contexto das nomeações petistas.
Rogamos a Deus pra você e família um natal com paz e saúde.
"Eduardo Affonso - Novo governo rumo ao hexa — ou não"
Típica linguagem bolsonarista. Lembram a pérola dos milicos dizendo q "não foi comprovada fraude mas também não foi comprovado q não há fraude"?
Pois é, igualzinho, rumo ao ou não. Pode dar certo mas pode dar errado.
Puts, sabe tudo esse Affonso!
Nova coluna com novas mentiras! Ou nova coluna com velhas mentiras... O colunista é sempre o mesmo, as mentiras são sempre mentirosas, resta saber se são novas ou velhas, e se isto é importante ou não!
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