Folha de S. Paulo
O presidente Lula executou suas acrobacias
habituais destinadas a legitimar as tiranias
"A esquerda brasileira permaneceu
estagnada no tempo, ficou presa a um mundo que mudou", diagnosticou o
ex-presidente uruguaio "Pepe" Mujica, antigo líder Tupamaro e ícone
da esquerda latino-americana. A cúpula da Celac deu-lhe razão. Nela, um Lula
fossilizado celebrou a democracia com uma face enquanto celebrava seus
ditadores de estimação com a outra.
A palavra democracia pairou sobre o encontro. Os líderes repudiaram o ensaio golpista do 8 de janeiro em Brasília e a declaração final destacou o dever "para com a democracia e os direitos humanos". Mas um Lula sempre igual a ele mesmo desperdiçou a oportunidade de levantar a voz por eleições livres na Venezuela, uma abertura política em Cuba e o fim da selvagem repressão do regime de Ortega na Nicarágua.
Pior: o presidente executou suas acrobacias
habituais destinadas a legitimar as tiranias. "Os cubanos não querem
copiar o modelo do Brasil, eles querem fazer o modelo deles". Emilio
Médici utilizou frases similares para atribuir à vontade dos brasileiros o
"modelo" da ditadura militar. Que tal declarar que "os sauditas
querem fazer o modelo deles"? Ou "os iranianos"?
Lula empregou as senhas rituais cunhadas
por Díaz-Canel e Maduro. Falou em "bloqueio" a Cuba no lugar de
"sanções", macaqueando o manjado álibi castrista. Falou numa
inexistente "ameaça de ocupação" da Venezuela, imitando os discursos
do falido regime chavista. Finalmente, quando produziu a frase que devia
terminar com "democracia", perpetrou o truque preferido pelas
ditaduras, invocando a "soberania".
Foi assim: "o que eu quero para o
Brasil, quero para a Venezuela: respeito à minha soberania". No passado,
soberania foi atributo dos monarcas; hoje, é atributo das nações. Inexiste
verdadeira soberania nacional num país onde surrupiam do povo o direito de
escolher seus governantes.
Durante seus mandatos anteriores, Lula
contribuiu para a preservação das ditaduras de esquerda na América Latina,
operando como escudo diplomático dos regimes de força. Criticar ditaduras que
ofendem os direitos humanos não é "ingerência", mas dever —como,
aliás, está escrito na Constituição brasileira.
O apartheid sul-africano começou a morrer
quando, tardiamente, os EUA e as democracias europeias isolaram o regime de
minoria branca. Um dos fatores históricos que deflagrou a abertura no Brasil
foi a mudança de rota determinada pelo americano Jimmy Carter, que se engajou
na condenação dos abusos promovidos pelo regime militar. Há pouco, a palavra
nítida do governo de Joe Biden ajudou a secar a agitação bolsonarista nos
quartéis. Melífluo, Lula mencionou um indefinido "problema da
Venezuela" e insistiu em "diálogo" —mas recusou-se a apontar sua
finalidade.
O tempo passou na janela e só Carolina não
viu. A declaração da Celac enfatizou o "respeito às instituições". No
9 de janeiro, repudiando os ataques golpistas, Jaques Wagner, líder do governo
no Senado, explicou que o STF é o intérprete insubstituível da Constituição.
Lula, porém, exime a si mesmo da exigência de respeitar as instituições, algo
que parece valer apenas para os adversários: no site oficial do governo, o
impeachment de 2016, um processo presidido pelo STF, foi classificado como
"golpe de Estado".
A mesma qualificação surgiu, na voz do
próprio Lula, em Buenos Aires e Montevidéu. "Vocês sabem que, depois de um
momento auspicioso, houve um golpe de Estado que derrubou a companheira Dilma
Rousseff", disse o presidente, ao lado do argentino Alberto Fernández.
Simetria específica: Bolsonaro acusa o STF de patrocinar um golpe ao anular as
condenações de Lula; Lula acusa o STF de patrocinar um golpe ao avalizar o
impeachment.
Democracia? Instituições? Perdido nos
labirintos do passado, o líder da esquerda brasileira não enxerga nessas
palavras mais que artifícios retóricos oportunos.
10 comentários:
Lula adora a viúva negra da Argentina, Cristina encrencada com justiça.
Papo ruim desse demétrio
Depois ele se desculpa.
Melífluo e tão danoso quanto seu antecessor
A maior falácia de todas, defender a democracia para depois negar ao povo sua liberdade. Que direito tem um tirano de ditar o que a pessoa pode ou não pode fazer? Vai contra todos os princípios humanos. Na China o ditador proibiu mais de um filho que a pessoa podia ter, agora viu a burrada repercutindo na economia.’Na monarquia julgavam com poderes comparáveis ao de Deus. Liberdade é um bem inviolável na nossa existência, a escravidão uma agressão a qualquer princípio terreno. Com que direito?????
Precisa ser muito idiota em aceitar o domínio sobre a sua pessoa,’liberdade ou opressão é você que decide.
Prisão é fisicamente intolerável imagina estar espiritualmente também.
''Escravidão''?
Adorador do mercado? Divulgador das narrativas facistas? Texto recheado de análises semãnticas distorcidas e opiniões facistas e de vira-latas tupiniquim. Tenha orgulho da democracia, e da importância da liturgia de um cargo. è raso, destila odio, não vê o obvio. Teremos uma grande nação, a partir do esforço e grandeza de grandes homens e instituições. è hora de paz, de temperança, de acreditar e ver que há sim, uma grande movimentação e orquestra de bons e não tão assim, na busca de um Brasil de paz e harmonia, com respeito. Faltou isso na sua trajetoria até hoje, respeito ao contraditório. Sua opinião é conhecida Demétrio, bem conhecida!!!
Demétrio, é verdade que Lula continua defendendo a ideia de que Dilma sofreu o impeachment como parte de um golpe de estado, que teria partido do vice Temer. Na época tomei posição a favor do impeachment. A gestão de Dilma no segundo governo, especialmente, foi um desastre. Mas é um fato também que Lula teve gestões melhores do que as de Dilma e ele atualmente é o maior líder democrático que temos, o único capaz de vencer Bolsonaro e toda a máquina governamental. Lula teve a grandeza e a ousadia de formar o ministério mais democrático e representativo da história do Brasil, a partir da frente ampla. Lá estão vários que se posicionaram a favor do impeachment de Dilma. Isso não conta? Ora, isso vale mais do que muitos discursos ambivalentes sobre regimes autoritários como o da Venezuela. De que adiantaria ele condenar o Maduro e assim afastar-se de qualquer negociação, desconsiderando os interesses mútuos que Brasil e Venezuela têm, na fronteira entre os dois países, em relação a questões de meio ambiente, terras indígenas e energia? Em relação a qualquer país é preciso saber aproximar-se e negociar. Fazer o contrário com bravatas é o que fez Bolsonaro em relação à China, prejudicando o Brasil. Por que o Brasil deveria bater nos governos autoritários da América Latina e silenciar diante da falta de democracia na China? Veja que a mídia valoriza em geral o pragmatismo em relação à China, mas reclama de Lula que critique Cuba etc. Falta coerência nessa oposição. É preciso distinguir os interesses da nação na área comercial, cultural, científica, etc. Lula é, na prática, para além dos discursos, um líder democrático, reconhecido em todo o mundo. Nenhum ressentimento antilulista pode apagar este fato. Nunca houve tantas mulheres, indígenas, negros e políticos de várias posições ideológicas no governo brasileiro. Isso diz muito mais do que discursos grandiloquentes, com a superficialidade que lhes é típica. É cedo para analisar as políticas públicas do governo Lula e é um terrível erro desconsiderar a oposição da extrema direita cultivada pelo bolsonarismo.
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