O Globo
Presidente teve que lidar com diagnóstico
de pneumonia e adiamento da viagem à China. E com as consequência da declaração
lamentável sobre plano do crime organizado
A sensata decisão do presidente Lula
de adiar
a viagem à China não tira a força da diplomacia presidencial que ele
tem comandado desde que voltou ao governo. É impressionante como mudou o nível
das relações internacionais, depois de encerrado o projeto país pária. A agenda
de visitantes no Brasil e de viagens do presidente ao exterior em três meses é
mais movimentada do que em qualquer ano do governo Bolsonaro. A China é o nosso
maior parceiro comercial, houve preparações dos dois lados para uma visita com
resultados concretos, e tudo isso será retomado assim que for possível.
A semana em que terminou diagnosticado com pneumonia, e com viagem cancelada, não foi boa para Lula. E é bom que a cúpula do governo entenda que ajudam os que alertam para os erros e não os que dão tapinhas nas costas, como o presidente alertou.
Ao fim de três meses do governo Lula, o país
já mudou. Só para citar um detalhe, na próxima sexta-feira, não acordaremos com
os quartéis ofendendo os fatos e comemorando a ditadura militar. Diversas áreas
mudaram para melhor, da política externa à proteção dos indígenas, da ação
ambiental à política cultural. Um evento da semana passada poderia entrar na
coleção das boas novas. Forças de segurança, federal e estaduais, frustraram um
plano terrível do crime organizado de ataque e morte de agentes públicos. Uma
das autoridades era o senador Sergio Moro, que um dia foi juiz, e naquela
função condenou Lula.
As declarações de Lula sobre o assunto
foram lamentáveis. Até seus aliados admitiram. Depois de quatro anos ouvindo
falas levianas e chulas, acusações sem prova, negações de evidências, o país
quer outro estilo de presidência. Na quinta, mesmo diante das provas abundantes
trazidas pela investigação, da qual participou a Polícia Federal, Lula criou
uma teoria da conspiração. E o fez naquele estilo de dizer que não ia dizer o
que estava dizendo, que era tão comum no governo anterior. “Eu
não vou atacar ninguém sem provas” mas “é visível que é uma armação do Moro”.
No passado, Moro foi algoz de Lula. Hoje
não tem esse poder. É um senador de um partido dividido, no qual há apoiadores
de Lula, que agora é presidente da República. Não tem cabimento Lula estar
ainda em briga com Moro. Lula o venceu. Nos tribunais e nas urnas. Moro foi
considerado parcial pelo STF e viveu a contradição humilhante de apoiar, na
última eleição, o presidente que o demitira e que ele acusara de usar a Polícia
Federal para defender interesses particulares.
O crime organizado é o inimigo. As facções
cresceram, fizeram alianças interestaduais e passaram a atuar nacionalmente. Na
Amazônia, bandidos se consorciaram e o crime ambiental passou a monetizar o
narcotráfico. Nas cidades, aterrorizam os cidadãos. Uniram-se a gangues de
outros países, suas finanças são operadas globalmente. As facções viraram
multinacionais do crime. Agora, querem acuar o próprio estado brasileiro. A
única resposta possível é a atuação suprapartidária do estado contra esse
inimigo comum.
O presidente Lula é um estadista e tem que
permanecer nesse lugar. O país precisa disso, depois de tudo o que viveu em
quatro anos terríveis. As duas declarações de Lula sobre Moro foram insensatas.
Numa delas, ele usou um dos muitos palavrões que Bolsonaro proferiu na reunião
ministerial de 22 de abril de 2020. O país se fartou de ver um presidente
falando assim. Esse modelo foi gasto pelo seu antecessor e não deveria ser
usado por Lula.
Bolsonaro levava o debate para o bizarro,
para desviar a atenção de assuntos relevantes. O presidente Lula tem o que
mostrar em temas importantes. Naquele mesmo dia em que disse que a investigação
era “armação de Moro”, Lula fez um belo evento no Theatro Municipal para
retomar a política cultural. Bolsonaro vivia das frases polêmicas por falta de
capacidade de governar, Lula só tem a perder com declarações que atrapalhem a
visibilidade das ações de governo. Deveria evitar o modelo de capturar a
atenção do país com falas imprudentes e agressivas. Elas animam auditório mas
azedam o clima e o apequenam.
Neste momento, há muitos problemas reais assombrando o país. A eles, Lula deve dedicar sua atenção quando estiver prontamente recuperado. Bons conselheiros poderiam dizer a Lula que ele foi eleito, não para fazer um acerto de contas com o passado, mas para governar. Até porque ele venceu o passado.
5 comentários:
A jornalista domina conteúdo e escrita de forma brilhante !
Estadista kkkkk. Cala a boca, Porcona.
Excelente análise! Parabéns à autora e ao blog que divulga seu trabalho! O bolsonarista acima apenas demonstra o nível rasteiro dos apoiadores do GENOCIDA.
Lula estadista é piada de mau gosto. E Lula sempre disse montes de fezes, sempre foi tosco como Bolsonaro. Mas a sra Leitoa, como boa parte da mídia mainstream, tem dupla moral na análise das duas faces da mesma moeda do atraso brasileiro.
Míriam Leitão continua sendo ótima.
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