Folha de S. Paulo
Governo Lula adota pragmatismo em estado
bruto e abandona meio ambiente e povos indígenas
Um bom político é um ser medularmente
pragmático, mas que conserva a capacidade de manipular os simbolismos a seu
favor.
Na parte do pragmatismo, Lula dá sinais de que entendeu os últimos recados. É a curva do aprendizado. A correlação de forças entre Executivo e Legislativo não é mais a mesma de 20 anos atrás. Depois de algumas barbeiragens, em que amargou derrotas vistosas, há indicações de que o governo se conformou com o fato de que sua base parlamentar programática é diminuta e aceitou a ideia de que, nas votações importantes, é refém de Arthur Lira e seu centrão, o que envolve acertos "ad hoc", projeto a projeto.
Mais do que isso, a administração parece
ter decidido centrar toda sua atenção na pauta econômica. A avaliação, da qual
não discordo, seria a de que, se as coisas desandarem nessa seara, o mandato de
Lula ficaria irremediavelmente comprometido. Mobilizou-se até para enquadrar os
parlamentares da esquerda do PT e os fez
votar a favor do arcabouço
fiscal.
No que diz respeito aos simbolismos, porém,
a trajetória foi a oposta. O governo que fizera de sua cerimônia de posse uma
apoteose de alegorias, com Lula subindo a rampa ao lado de minorias, agora não
parece dar muita trela para temas emblemáticos como meio ambiente e povos
indígenas. Eu pelo menos não vejo outra maneira de interpretar as votações dos
últimos dias que, entre outros retrocessos, esvaziaram
significativamente os dois ministérios responsáveis por essas questões.
Era mais ou menos inevitável que a
administração sofresse reveses impostos
por bancadas poderosas como a ruralista. Mas ver parlamentares do PT votando a
favor de pautas
reacionárias só para acelerar os trâmites foi para mim chocante.
Governo e partido deveriam ter demonstrado alguma contrariedade, nem que fosse
só para constar. Símbolos, afinal, importam.
Marina Silva tem
todos os motivos para sentir-se traída e abandonada.
Um comentário:
Fato.
Postar um comentário