domingo, 13 de agosto de 2023

Míriam Leitão - Amazônia, PAC e joias roubadas

O Globo

Em mais uma semana intensa no Brasil, o país ficou diante de dilemas ambientais e do espantoso esquema de roubo de joias

O que é polêmico do ponto de vista ambiental entrou no PAC, mas com a rubrica “em estudos”. Isso reduz a contradição de uma semana que começou com uma cúpula amazônica e terminou com o lançamento do plano de investimento que tem projetos de petróleo no mar da Amazônia e obras que cortam a floresta. Há polêmicas no governo Lula, mas do lado da velha administração bolsonarista, o que se abriu foi um fosso profundo que começa a engolir os principais articuladores de golpes contra a democracia e contra o patrimônio nacional. Isso tudo em apenas uma semana nesse país intenso chamado Brasil.

Sexta-feira, o governo lançava o PAC no Rio, com a atenção do país presa nas tenebrosas transações reveladas entre o ajudante de ordens de Bolsonaro, seu pai general, outros militares e o advogado do ex-presidente. Todos sob a suspeita de subtrair da Pátria presentes, joias, valores. Notadamente, valores. O escândalo rasgou mais um pouco a imagem das Forças Armadas. Líderes militares se deixaram atrair pela partilha de poder oferecida por um governo desqualificado, em várias dimensões.

A segunda-feira começou com Belém engarrafada. Era o primeiro teste do grande encontro que haverá lá em 2025, a COP 30. Na reunião entre os presidentes, houve um duelo entre os dois mais influentes países amazônicos. A liderança do Brasil foi o suficiente para unir os que querem manter a exploração de petróleo na região. O presidente Gustavo Petro, da Colômbia, colocou o dedo na ferida, mas ficou sozinho. Todos os olhos estavam na Guiana, cujo PIB cresceu 50% graças às descobertas de petróleo. Já na meta de desmatamento zero, a liderança do Brasil não funcionou. Houve muito mais em Belém, além da Carta dos presidentes. Quem conta é o presidente do BID, Ilan Goldfajn.

— Eu posso estar enviesado, mas vi um interesse renovado na Amazônia e desta vez atrás de ações reais. Há uma oportunidade concreta de juntar os dois lados, os países da região e os países doadores. A gente criou um programa, com uma ideia até da Marina, chamado “Amazônia Sempre”, que é uma espécie de guarda-chuva de programas para unificar as milhares de pequenas ações que existem. O objetivo é criar alternativas econômicas, é financiar pequenas e médias empresas que, em algumas cidades amazônicas, são 98% da economia. Há uma grande oportunidade nessa nova realidade política na região e fora dela — me disse, ao encerrar seus dias em Belém.

O BID organizou reuniões estratégicas à margem da cúpula, como o encontro dos bancos de desenvolvimento dos países amazônicos, ao todo 19 instituições. Promoveu o encontro das cidades amazônicas, dos vários países. Antes houve a reunião em São Paulo dos ministros da Fazenda e Planejamento dos oito países.

— Eles voltarão a se reunir em Santiago de Compostela no mês que vem, em 15 de setembro, com os ministros dos países doadores. Dá agora para chegar na Espanha e dizer que há um mandato, uma iniciativa amazônica, de combater o desmatamento e desenvolver alternativas econômicas sustentáveis.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, avisou que falar em “transição ecológica” é negacionismo da esquerda. O PAC trouxe exatamente a ideia da transição ecológica e com o lema “desenvolvimento e sustentabilidade”. Outra fonte que esteve nos eventos de Belém e do Rio avalia que não houve contradição, porque o que é problemático do ponto de vista ambiental entrou na condicional. A Ferrogrão que atravessa a floresta de Jamanxim, duplicando parte da BR-163 está “em estudo”. Outra obra polêmica, a BR-319, que liga Manaus a Porto Velho passando por várias unidades de conservação, entrou apenas uma “adequação da travessia urbana em Porto Velho”. Mas e a exploração de petróleo na chamada Margem Equatorial? O que aparece como certo na apresentação do PAC é a exploração na Bacia Potiguar. Na área conhecida como “Foz do Amazonas” falou-se em aguardar posicionamento do Ibama. “Isso significa que vamos tomar decisão com base em evidências”, ouvi no governo.

É evidente que há contradição entre aumentar a exploração de petróleo e o projeto de descarbonizar. Esses dilemas do governo Lula atravessaram uma semana em que cresceram as evidências de que, no governo anterior, auxiliares diretos do então presidente conspiravam contra a democracia, enquanto surrupiavam bens da presidência para vender e embolsar o dinheiro.

 

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