terça-feira, 10 de outubro de 2023

Míriam Leitão - Tremores no tabuleiro global

O Globo

O conflito no Oriente Médio acontece em um momento em que a economia mundial dá sinais de incerteza

A explosão de violência no Oriente Médio ocorre numa hora em que a economia do mundo coleciona pontos de incerteza. Os juros estão altos, a inflação tem sido resistente, o petróleo subiu durante três meses. Na semana passada, havia caído mas, ontem, diante do conflito no Oriente Médio, voltou a subir. Os grandes fornecedores de petróleo são Arábia Saudita, Rússia e Irã. Se o Irã sofrer aumento de sanções pelo apoio que dá ao Hamas, a oferta do produto diminuirá.

A Rússia hoje depende do Irã para o fornecimento de drones usados na guerra contra a Ucrânia, portanto não terá motivo algum para recuar do corte na produção que adotou, após acordo com a Arábia Saudita. Se a violência da reação israelense for alta demais, a Arábia Saudita abandonará a negociação que a aproximava de Israel. Do ponto de vista político e econômico, o ataque do Hamas a Israel está mexendo muitas pedras no tabuleiro ao mesmo tempo.

— O problema do petróleo é quanto tempo essa operação vai durar. Se durar muito tempo, haverá consequências. Se a resposta de Israel for muito dura e longa, a perspectiva do petróleo ficará complicada — avalia o ex-ministro da Fazenda e embaixador Rubens Ricupero.

Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, acha que a grande pergunta é se todo esse ruído pode afetar a trajetória de juros determinada pelo Fed.

— O que eles decidem nos afetam. O Brasil está entrando no momento dessa crise um pouco fragilizado. Os ajustes na área fiscal estão difíceis, a agenda de desenvolvimento não está clara.

A aposta de Armínio alivia um pouco o cenário. Ele não acredita em alta de juros americanos enquanto durar esse momento de extrema incerteza.

— Normalmente nessas horas, os bancos centrais não jogam gasolina no fogo. Então a minha expectativa é que eles vão dar uma segurada —avalia.

Mas o conflito em si como entender? O embaixador Marcos Azambuja descreve o que está acontecendo com imagens fortes.

— Estamos assistindo a uma revolução dentro de um presídio. A explosão de violência em Gaza não é um ato politicamente compreensível. O Hamas não tem condições de vitória. O que há é o desespero levando à violência, sem nenhuma esperança de vitória. Gaza não vencerá. Mas, por outro lado, Israel está vivendo o pior momento da sua história —afirma Azambuja.

Ricupero teme outro resultado desse conflito: a próxima reunião da COP, conferência de cúpula das Nações Unidas sobre o clima.

— A próxima reunião da COP, neste fim de ano, será naquela região, e tudo isso vai reduzir o nível de atenção no encontro. No ano passado, a guerra da Ucrânia desviou atenção do problema climático e, além disso, estimulou o uso de combustíveis fósseis.

Armínio contou que passou os últimos oito meses integrando um grupo de estudiosos que assessorou o G20, a pedido da Índia, e organizado pelo economista americano Larry Summers. Discutiram os grandes problemas do mundo.

— Saí convencido de que o combate à mudança climática não vai sair muito bem. A organização do planeta para lidar com essa questão, esse imperativo, está devagar, os esforços estão modestos. E tudo está pior do que se esperava como essa seca no Amazonas.

Questões graves vão sendo deixadas de lado e o conflito que explodiu após o ataque terrorista do Hamas contra Israel vai drenar as forças de muitos países. O número de vítimas diretas entre palestinos e israelenses atinge patamares assustadores.

— O acordo que estava sendo costurado para que a Arábia Saudita reconhecesse Israel, deixaria os palestinos à margem. O Ocidente poderia ajudar a parte moderada dos palestinos e isolar o Hamas. O grupo não tinha muito a perder, era saber se morreria agora ou depois. O problema para Israel é que para fazer uma incursão por terra ele terá que ocupar a Faixa de Gaza, como já ocupou no passado e, para isso, teria que matar milhares de civis. Seria um banho de sangue — avalia o embaixador Ricupero.

Ricupero avalia que um dos vários erros de Benjamin Netanyahu foi enfraquecer o próprio país com seu projeto antidemocrático.

— Ele cindiu o país ao meio com sua proposta de tirar poderes do Judiciário e, sem dúvida, esse enfraquecimento de Israel foi um fator que pesou na decisão do Hamas de desfechar o ataque.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Alá,Jeová,Maomé e Moisés,todos na causa!