Folha de S. Paulo
Brasil tende a adiar reformas e a perenizar
privilégios
A aprovação da Reforma Tributária pelo Senado deve ser celebrada, mas não dá para deixar de observar o padrão, que é inequívoco. Depois que especialistas chegam a um razoável consenso técnico sobre a necessidade de uma reforma estrutural, o Parlamento passa uma ou mais décadas só flertando com ela. Quando os legisladores finalmente se decidem a aprová-la, sarapintam-na com tantas salvaguardas e exceções que, se não a desfiguram, reduzem muito de sua potência. Foi assim com as várias reformas da Previdência; está sendo assim com a Tributária.
Em algum grau, isso é inevitável em
democracias, que se valem de negociações políticas e soluções de compromisso
para aplainar resistências. Só ditaduras conseguem impor reformas como saem das
pranchetas dos técnicos. O problema do Brasil é que sempre deixamos os ajustes
dolorosos para a última hora e temos uma preocupante tendência de perenizar os
privilégios que lobbies conseguem inscrever nos ordenamentos jurídicos.
A Zona Franca
de Manaus, originalmente concebida para durar 30 anos, até 1997, já
foi prorrogada sucessivas vezes. Existirá pelo menos até 2073. Militares
gozam de benesses previdenciárias com as quais trabalhadores
celetistas nem podem sonhar. Igrejas têm
imunidade tributária fixada na Constituição e que não cessa de
ser ampliada por leis e decisões judiciais.
Há uma explicação matemática para isso. O
pequeno grupo beneficiado por uma regalia recebe vantagem tão formidável que
move mundos e fundos para obtê-la. A esmagadora maioria que é prejudicada pela
medida sofre uma perda tão marginal que não se mobiliza para obstá-la. O
problema é que as perdas se somam. Para compensar as várias exceções
tributárias, o Brasil terá
uma das maiores alíquotas de IVA do mundo.
E o diabo é que o órgão que deveria empenhar-se na defesa dos interesses
difusos dos cidadãos, o Parlamento, é também o mais sensível aos lobbies.
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