Folha de S. Paulo
Ministro disse verdades sobre pseudo
parlamentarismo e irresponsabilidade da PEC das desonerações
Foram certeiras e contundentes as declarações
do ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, em
entrevista concedida a Mônica Bergamo nesta Folha. Para reincidir nos
anglicismos triunfantes, diria que não poderia concordar mais.
Falo isso com tranquilidade. Não ganho meu
croissant com café com leite fazendo press release ou passando pano no
governo Lula ou
no Supremo. As considerações do ministro acertaram no mérito, tanto em aspectos
tópicos, caso da famigerada PEC, quanto em questões de fundo, como o arranjo
roto desse pseudo parlamentarismo que vem se desenhando de modo insidioso no
sistema presidencialista brasileiro.
No primeiro aspecto, que diz respeito à fragilidade constitucional da emenda, a Advocacia-Geral da União parece, em seu pleito, prenhe de razão –lembrando aqui uma velha expressão citada na letra de "Jorge Maravilha", canção de Chico Buarque, dedicada ao general Ernesto Geisel.
Artigo da Carta, bem como a Lei de
Responsabilidade Fiscal vedam a criação de despesas por Poderes da República
sem a exposição do impacto orçamentário e a indicação das fontes de recursos
que as sustentem.
Seria cômico se não fosse cínico o
argumento tirado do bolso do colete pelo presidente do Senado, sobre as
justificativas se embasarem na aprovação de medidas fiscais pregressas, que
aumentaram a arrecadação. Com sua estampa de bom sujeito, a dissimular a
personalidade rancorosa e revanchista do Pacheco-bomba, o excelentíssimo
congressista já em iminente ocaso de seu mandato à frente da Casa tem
patrocinado projetos nefastos.
Além do alongamento a fundo perdido de
benesses tributárias a prefeituras e setores estruturados do mercado, é fiador
do sinistro projeto de criminalizar usuários de drogas e do plano de revirar
todo o sistema eleitoral em vigor para acabar com a reeleição.
Esta última proposta, embora
a considere equivocada, inoportuna e esquiva em suas supostas boas
intenções, comporta discussão. Já a primeira não passa de
um retrocesso em todos os sentidos imagináveis, a nos tentar impingir
uma norma constitucional trevosa, reacionária e estúpida.
Está correto Haddad ao discorrer e alertar
para as incongruências do entronamento de um tipo de ativismo congressual que,
na realidade, projeta um parlamentarismo bananeiro e de araque, fomentado,
ressalte-se, pelo ciclo golpista Temer-Bolsonaro.
Como disse o titular da Fazenda –ex-ministro
da Educação e ex-prefeito de São Paulo–, se der errado não é o Parlamento a ser
posto à prova, dissolvido ou levado a formar uma nova coalizão, como acontece
no sistema consagrado em países europeus. É o Executivo a ser punido.
Louvável, ainda, a firme renovação do
compromisso de buscar um ajuste fiscal o mais possível decente, que não recaia
como de costume só sobre as costas dos brasileiros de baixa renda e dos mal e
mal remediados. Em
escala global, a taxação de bilionários e a iniquidade tributária são temas de
conversas correntes entre gente séria.
Sim, as palavras de Haddad e o recurso ao STF
podem ter gerado e gerar ainda mais calor na "crise entre os Poderes"
e ter chateado
a ala política e inquietado gregos e kantianos. Mas tem momentos em
que alguém precisa dizer verdades. E o ministro as disse.
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