Folha de S. Paulo
Novas tecnologias elevam produtividade mas
geram questões sobre desemprego estrutural
O Dia Internacional do Trabalhador é um
emblema das lutas históricas por melhores condições de trabalho, dignidade e
justiça social: a jornada de trabalho de oito horas, o direito à organização
sindical e a valorização do trabalho humano.
Inspirada pela greve iniciada em 1º de maio
de 1886 em Chicago, a celebração continua atual e necessária. Nos últimos 30
anos, o poder de barganha dos trabalhadores foi debelado pela globalização,
pela precarização e pela automação.
As novas tecnologias (uberização, automação e robotização) aumentam a eficiência produtiva, mas levantam questões sociais e éticas relativas ao desemprego estrutural, à neutralidade racial e de gênero dos algoritmos e à desigualdade de renda. A popularidade da proposta de renda básica universal no Vale do Silício é sintoma deste temor.
Com efeito, a queda da participação dos
salários na renda da economia é fenômeno global e de longo prazo, como mostram
estudos da OIT e do FMI. Nos países desenvolvidos, a OCDE registrou recente supressão de salários em várias
indústrias, ocupações e níveis de qualificação. No Brasil, os salários
somam menos de 40% da renda total, refletindo a desindustrialização
precoce, a baixa sindicalização, a desregulamentação e a alta taxa de
informalidade no mercado de trabalho: 39% da nossa força de trabalho se encontra em empregos
precários e de baixa qualificação.
Insensível a esses fatos, o "banqueiro
central dos pobres", Roberto Campos Neto (RCN), anunciou, em
entrevista à CNN em 1º de maio de 2024, que a economia brasileira vive um
surpreendente "pleno emprego", mesmo com 7,9% da força de trabalho
desempregada e com taxa de subutilização da mão de obra em 18%.
Traduzindo: para ele, uma renda média mensal
de R$ 3.100 é uma exuberância incompatível com a estabilidade macroeconômica.
Se a renda do trabalho continuar subindo, o Banco Central (BC) será forçado a
elevar a Selic para
moderar as demandas salariais —por meio de maior desemprego— e, claro, defender
o retorno do capital financeiro improdutivo, com a desculpa do controle da
inflação, a qual está caindo sistematicamente.
Na mesma data, os porta-vozes do rentismo
defenderam a desvinculação irrestrita dos benefícios sociais com relação ao
salário mínimo (SM), alegando que cada R$ 1 a mais aumenta o gasto público em
R$ 388 milhões.
Em números: a elevação nominal de 6,4% do
salário mínimo entre 2024 e 2025 implica elevação do gasto primário em R$ 35
bilhões. O BC pode compensar esse aumento reduzindo em mero 1 ponto percentual
a Selic, poupando R$ 44 bilhões em serviços de juros da
dívida pública; mas este é um debate interditado.
A desvinculação focalizada de privilégios com
relação ao SM é uma discussão bem-vinda; porém, o silêncio sobre os juros da
dívida e a obscena injustiça tributária contrastam com a estridência das
críticas aos direitos sociais e ao esforço de reindustrialização.
O ataque
coordenado ao BNDES é
outro sintoma deste mal-estar do rentismo. Seu modelo
de estimação de empregos mostra que, em 2024, os projetos apoiados
pelo banco podem adicionar 1,5 milhão de empregos.
A combinação de queda da Selic com a atuação
do BNDES e os estímulos ao investimento industrial pelo MDIC ajudam a explicar
a criação
de 720 mil novas vagas de emprego apenas no primeiro trimestre de
2024. O crescimento da economia previsto para este ano já passa de 2%. Esta
"agenda errada" do governo provocou, no mesmo 1º de maio, a melhoria
da perspectiva da nota de crédito do Brasil pela agência Moody’s. A
agência não comprou o pânico
fiscal e gerou muito mau-humor na Faria Lima.
A promoção de emprego e salário dignos e o
acesso à seguridade social apenas ameaçam quem teme a tributação progressiva da
renda e do patrimônio como pilar central do equilíbrio fiscal. A eutanásia do
rentismo é, portanto, condição para o desenvolvimento.
A luta continua!
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