terça-feira, 2 de julho de 2024

Andrea Jubé - PT e MDB: na eleição, a ocasião faz a aliança

Valor Econômico

Presidente não vai para o confronto para não se indispor com o aliado

Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou, recentemente, a eleição para a Prefeitura de São Paulo a “uma verdadeira guerra”, usou um tom acima em relação ao que pretende adotar com o MDB, um de seus principais aliados, na campanha eleitoral. Porque se o MDB - que comanda três ministérios no governo federal - é adversário do PT em palcos relevantes como São Paulo e Porto Alegre (RS), as duas siglas caminharão juntas em outras capitais e grandes municípios no pleito de outubro.

A aliança entre PT e MDB é tão antiga, que remonta aos anos 80, quando Lula e Ulysses Guimarães compartilhavam segredos entre os comícios das “Diretas Já”, e o atual presidente da sigla, Baleia Rossi, ainda estava concluindo o ensino fundamental.

Em 1984, Lula revelou a Ulysses - até hoje, o principal símbolo do MDB - o fogo amigo em curso contra ele. Os emedebistas de São Paulo armavam a traição ao “Senhor Diretas”, articulando apoio a Tancredo Neves para a Presidência da República, com o PT na aliança. Lula disse a Ulysses que os paulistas referiram-se a ele como o “Winston Churchill” do MDB, que dera o que tinha de dar.

Segundo o relato do episódio, que consta de “A história de Mora” (livro de memórias sobre Ulysses do jornalista Jorge Bastos Moreno), o emedebista histórico viu-se acuado e rendeu-se, tornando-se coordenador da campanha de Tancredo.

Mais de 30 anos depois, deu-se o rompimento dessa aliança - drástico, porém, temporário. Em 2015, o então vice-presidente Michel Temer, presidente licenciado do MDB, articulou, com outros partidos aliados, o impeachment da presidente Dilma Rousseff, que havia perdido apoio no Congresso e não tinha mais condições de governar.

Quase dez anos depois, o principal símbolo da nova fase da aliança PT-MDB é a presença da ex-senadora Simone Tebet no ministério lulista. Candidata derrotada a presidente pelo MDB em 2022, ela declarou apoio a Lula no segundo turno, e hoje comanda o Ministério do Planejamento, em boa sintonia com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

É nesse contexto que, no sábado (29), em dois eventos com Guilherme Boulos (Psol) e com a ex-prefeita Marta Suplicy (PT), Lula discursou um tom abaixo. Pela manhã, em ato na Zona Leste, despejou elogios a Marta (que será vice de Boulos), lembrando que como a prefeita, ela criou os CEUs [Centros Educacionais Unificados], o transporte integrado, e “cuidou muito dos mais pobres”.

Pesquisas internas da campanha do Psol revelaram que a maioria dos eleitores, sobretudo da periferia, ainda desconhecem que Boulos tem apoio de Lula, e Marta ocupará a vaga de vice.

Os ataques mais incisivos ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) caberão a Boulos e Marta. Em contraponto, Nunes segue com alta avaliação entre eleitores de baixa renda - público-alvo de Boulos -, justamente, porque manteve várias políticas públicas voltadas ao segmento, inclusive aquelas criadas pelas administrações do PT.

O embate será acirrado, mas não fratricida. Lula não vai para o confronto para não se indispor com o MDB. De igual forma, Nunes não quer briga com Lula, que tem aprovação na capital muito superior à de Jair Bolsonaro (PL), que subirá no palanque emedebista.

Em paralelo, mesmo no Estado de São Paulo, o MDB apoiará candidatos a prefeito do PT em três das quatro cidades governadas pelo aliado. O palco principal será Araraquara, onde o prefeito Edinho Silva - nome de expressão nacional do PT - costurou a aliança para que o MDB apoie sua candidata à sucessão.

No Nordeste, o MDB vai apoiar os candidatos do PT às prefeituras de três capitais: o deputado Fábio Novo, em Teresina (PI), a deputada Natália Bonavides em Natal (RN) e o deputado Evandro Leitão em Fortaleza (CE).

Na mesma região, o PT apoiará os candidatos do MDB às prefeituras de duas capitais: o vice-governador Geraldo Júnior, ligado ao ex-ministro Geddel Vieira Lima, em Salvador (BA), e o deputado Rafael Brito em Maceió (AL).

Na segunda-feira, aliás, Lula elogiou o emedebista “Geraldinho” em ato político em Salvador.

Em Rio Branco, no Acre, onde o bolsonarismo é hegemônico, o PT apoiará o candidato do MDB, Marcus Alexandre, à prefeitura da capital. A curiosidade é que Alexandre foi prefeito do município de 2013 a 2018 quando era filiado ao PT, mas depois deixou a legenda. No ano passado, ingressou no MDB, e agora terá o antigo partido ao seu lado.

Em contrapartida, um cenário que evoca a tensão da disputa paulista entre as duas legendas é Porto Alegre (RS), onde o prefeito Sebastião Melo, do MDB, buscará a reeleição, com o PL de Bolsonaro na vaga de vice. Em outra frente, o PT lançou a pré-candidatura da deputada Maria do Rosário, um nome conhecido do eleitor da capital, e de perfil combativo.

Porto Alegre foi um dos mais de 400 municípios afetados pelas enchentes de maio, que prejudicaram 2,3 milhões de pessoas, deixando cerca de 6,5 mil desabrigadas. A capital é a cidade com mais abrigos e maior público atendido.

No domingo (30), uma pesquisa do Datafolha animou o MDB ao mostrar que a população gaúcha vê os governos federal, estadual e municipal como igualmente responsáveis pela tragédia ambiental. A maioria, no entanto, culpa os prefeitos: 85% dos entrevistados veem os municípios como responsáveis, 83% indicam o governo estadual, e 80% a gestão federal.

 

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