Valor Econômico
Presidente não vai para o confronto para não
se indispor com o aliado
Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
comparou, recentemente, a eleição para a Prefeitura de São Paulo a “uma
verdadeira guerra”, usou um tom acima em relação ao que pretende adotar com o
MDB, um de seus principais aliados, na campanha eleitoral. Porque se o MDB -
que comanda três ministérios no governo federal - é adversário do PT em palcos
relevantes como São Paulo e Porto Alegre (RS), as duas siglas caminharão juntas
em outras capitais e grandes municípios no pleito de outubro.
A aliança entre PT e MDB é tão antiga, que
remonta aos anos 80, quando Lula e Ulysses Guimarães compartilhavam segredos
entre os comícios das “Diretas Já”, e o atual presidente da sigla, Baleia
Rossi, ainda estava concluindo o ensino fundamental.
Em 1984, Lula revelou a Ulysses - até hoje, o
principal símbolo do MDB - o fogo amigo em curso contra ele. Os emedebistas de
São Paulo armavam a traição ao “Senhor Diretas”, articulando apoio a Tancredo
Neves para a Presidência da República, com o PT na aliança. Lula disse a
Ulysses que os paulistas referiram-se a ele como o “Winston Churchill” do MDB,
que dera o que tinha de dar.
Segundo o relato do episódio, que consta de “A história de Mora” (livro de memórias sobre Ulysses do jornalista Jorge Bastos Moreno), o emedebista histórico viu-se acuado e rendeu-se, tornando-se coordenador da campanha de Tancredo.
Mais de 30 anos depois, deu-se o rompimento
dessa aliança - drástico, porém, temporário. Em 2015, o então vice-presidente
Michel Temer, presidente licenciado do MDB, articulou, com outros partidos
aliados, o impeachment da presidente Dilma Rousseff, que havia perdido apoio no
Congresso e não tinha mais condições de governar.
Quase dez anos depois, o principal símbolo da
nova fase da aliança PT-MDB é a presença da ex-senadora Simone Tebet no
ministério lulista. Candidata derrotada a presidente pelo MDB em 2022, ela
declarou apoio a Lula no segundo turno, e hoje comanda o Ministério do
Planejamento, em boa sintonia com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
É nesse contexto que, no sábado (29), em dois
eventos com Guilherme Boulos (Psol) e com a ex-prefeita Marta Suplicy (PT),
Lula discursou um tom abaixo. Pela manhã, em ato na Zona Leste, despejou
elogios a Marta (que será vice de Boulos), lembrando que como a prefeita, ela
criou os CEUs [Centros Educacionais Unificados], o transporte integrado, e
“cuidou muito dos mais pobres”.
Pesquisas internas da campanha do Psol
revelaram que a maioria dos eleitores, sobretudo da periferia, ainda
desconhecem que Boulos tem apoio de Lula, e Marta ocupará a vaga de vice.
Os ataques mais incisivos ao prefeito Ricardo
Nunes (MDB) caberão a Boulos e Marta. Em contraponto, Nunes segue com alta
avaliação entre eleitores de baixa renda - público-alvo de Boulos -,
justamente, porque manteve várias políticas públicas voltadas ao segmento,
inclusive aquelas criadas pelas administrações do PT.
O embate será acirrado, mas não fratricida.
Lula não vai para o confronto para não se indispor com o MDB. De igual forma,
Nunes não quer briga com Lula, que tem aprovação na capital muito superior à de
Jair Bolsonaro (PL), que subirá no palanque emedebista.
Em paralelo, mesmo no Estado de São Paulo, o
MDB apoiará candidatos a prefeito do PT em três das quatro cidades governadas
pelo aliado. O palco principal será Araraquara, onde o prefeito Edinho Silva -
nome de expressão nacional do PT - costurou a aliança para que o MDB apoie sua
candidata à sucessão.
No Nordeste, o MDB vai apoiar os candidatos
do PT às prefeituras de três capitais: o deputado Fábio Novo, em Teresina (PI),
a deputada Natália Bonavides em Natal (RN) e o deputado Evandro Leitão em
Fortaleza (CE).
Na mesma região, o PT apoiará os candidatos
do MDB às prefeituras de duas capitais: o vice-governador Geraldo Júnior,
ligado ao ex-ministro Geddel Vieira Lima, em Salvador (BA), e o deputado Rafael
Brito em Maceió (AL).
Na segunda-feira, aliás, Lula elogiou o
emedebista “Geraldinho” em ato político em Salvador.
Em Rio Branco, no Acre, onde o bolsonarismo é
hegemônico, o PT apoiará o candidato do MDB, Marcus Alexandre, à prefeitura da
capital. A curiosidade é que Alexandre foi prefeito do município de 2013 a 2018
quando era filiado ao PT, mas depois deixou a legenda. No ano passado,
ingressou no MDB, e agora terá o antigo partido ao seu lado.
Em contrapartida, um cenário que evoca a
tensão da disputa paulista entre as duas legendas é Porto Alegre (RS), onde o
prefeito Sebastião Melo, do MDB, buscará a reeleição, com o PL de Bolsonaro na
vaga de vice. Em outra frente, o PT lançou a pré-candidatura da deputada Maria
do Rosário, um nome conhecido do eleitor da capital, e de perfil combativo.
Porto Alegre foi um dos mais de 400
municípios afetados pelas enchentes de maio, que prejudicaram 2,3 milhões de
pessoas, deixando cerca de 6,5 mil desabrigadas. A capital é a cidade com mais
abrigos e maior público atendido.
No domingo (30), uma pesquisa do Datafolha
animou o MDB ao mostrar que a população gaúcha vê os governos federal, estadual
e municipal como igualmente responsáveis pela tragédia ambiental. A maioria, no
entanto, culpa os prefeitos: 85% dos entrevistados veem os municípios como
responsáveis, 83% indicam o governo estadual, e 80% a gestão federal.
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