Folha de S. Paulo
Influenciadores vigaristas ostentam riqueza e
unem-se ao crime em tempos de incêndios, bets e violência eleitoral
O cenário é desolador. O fogaréu que se
alastrou pelo país já seria suficiente para causar desespero e apreensões, do
despreparo do governo para enfrentar a catástrofe à intenção dolosa que se
verificou na origem dos incêndios, passando pelos imensos danos ambientais e
prejuízos à saúde pública em
tempos de crise
climática.
Temos mais, porém. Para onde se olhe nas
mídias e redes sociais, a cena brasileira das últimas semanas tem sido
sufocante.
Um cortejo de gente esquisita desfila pelo noticiário com sua ostentação boçal, carrões, iates e aviões. Famosos "somos ricos" em férias gregas, influenciadores vigaristas e subcelebridades variadas, com roupas caras e harmonizações faciais de dar susto em criancinha, são alguns espécimes dessa fauna. Imersos em atmosfera de banditismo "posso tudo", exemplares dessa turma se envolvem com falcatruas, não raro no terreno da jogatina que corre solta no Brasil.
As famigeradas bets estão
dominando o jogo. Rapidamente se tornaram responsáveis por gastos de bilhões de
reais das famílias brasileiras, muitas remediadas ou pobres.
No período de janeiro a agosto, como já
mostrou esta Folha, o Banco Central identificou
que se gastou mensalmente em apostas via Pix uma
volumosa quantia entre R$ 18 bilhões e R$ 21 bilhões. Mantido esse
padrão até o fim do ano, as empresas de apostas terão recebido dos brasileiros
o valor bruto de R$ 216 bilhões –lembrando que o Bolsa Família custa
ao país cerca de R$ 168 bilhões anuais.
Filiados ao programa, aliás, gastaram R$ 3
bilhões em apostas no mês de agosto, cerca de 20% do valor que o governo
destinou no mesmo mês para os benefícios. Onde estamos? Onde isso vai parar?
Como regulamentar essa sandice –ou será que cassino também é liberdade de
expressão e não deve ser regulamentado?
Não bastasse tanta bizarrice, eis que em ano
eleitoral volta-se a falar de tema antigo, mas algumas vezes empurrado para
debaixo do tapete, que é a presença crescente do crime organizado nas
instituições, nos Poderes e na política.
Investigações sobre o envolvimento do PCC com
empresas de transporte em São Paulo ou
com o PRTB,
partido do desvairado candidato a prefeito Pablo Marçal,
estão aí nas reportagens, campanhas e debates.
Nada de novo para quem vive no país do
assassinato de Marielle
Franco e tem acompanhado nas últimas décadas a escalada das
facções, que se estende de Sul a Norte, ocupa a Amazônia e
atravessa fronteiras.
Estamos assistindo à consolidação de nossa
máfia tropical como player político incrustado nos negócios e no Estado.
Entrelaçadas com essas realidades sombrias,
assistimos às novas manifestações da extrema direita. É o caso espalhafatoso e
notório do já citado Marçal, com seu individualismo ultraliberal, seu
evangelismo pela prosperidade, suas ambições desmedidas e sua vocação para
instaurar o caos.
As baixarias políticas na campanha paulistana
podem ter seus antecedentes históricos, mas não há dúvida de que alguma coisa
diferente, se é que essa é a melhor palavra, está emergindo do pântano da
direita extremista e pretende disputar espaço com o bolsonarismo.
Sim, o quadro não é dos mais animadores.
Esperemos que possa em breve desanuviar. Este mês de setembro, convenhamos, não
vai deixar saudade.
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