CartaCapital
Hipnotizados pelos modelos, os economistas
não entendem a natureza do dinheiro, que realiza e nega suas finalidades
Segundo a Wikipedia, Mandrake é um
ilusionista que se vale de uma improvável técnica de hipnose instantânea,
aplicada com os olhos e gestos das mãos, com poderes de telepatia.
Ultrapassando as proezas que nos
impressionavam nos gibis da infância e adolescência, o Mandrake das Finanças
tira da cartola derivativos, não coelhos, a realização máxima do capital
fictício!
Os economistas, hipnotizados pelos modelos
dinâmicos estocásticos de equilíbrio geral, iludem a plateia com a brincadeira
de virar estátua e, como num truque de mágica, imobilizam os preços, o tempo e
a moeda! Usando a matemática como hipnose coletiva, repetem todo o santo dia o
cântico da eficiência dos mercados financeiros para reafirmar a crença
inabalável nas forças virtuosas da economia de mercado capitalista: o
Equilíbrio.
Nessa empreitada, os Mandrakes manipulam a mãe de todos os truques: a ilusão da moeda neutra, confirmada pelo show de tirar da cartola notas de verdinhas! Moeda só existe quando vejo e toco, certo? Se não existem, não são moedas!
Mandrake prossegue com os truques e pergunta
ao público: quantos coelhos ainda vão sair da cartola? Um, dois, três… Eis que
saem dólar futuro, DI futuro e outros truques do ilusionismo, como hedge, swap.
Alguém grita, mas não vejo, não toco… o mágico responde: basta acreditar que
existem!
Quem ilude quem, Mandrake ou os economistas?
“As obrigações de pagamento decorrentes de
swaps/forwards cambiais e swaps cambiais são impressionantes. Considerando
todas as moedas, os saldos no fim de junho de 2022 atingiram 97 trilhões de
dólares, acima dos 67 trilhões em 2016 (Gráfico 1.A). Isso correspondeu ao PIB
global em 2021 (96 trilhões) e foi três vezes o comércio global (29 trilhões).
E excedeu tanto o investimento externo global em portfólio (81 trilhões) quanto
os créditos bancários internacionais (40 trilhões) no fim de 2021.” (Claudio
Borio, BIS)
Talvez seja conveniente designar a
concentração das posições “compradas” na moeda de Tio Sam no mercado futuro de
câmbio em Terra Brasilis como “fuga para dentro”. Correm para o dólar, operando
em reais. É a grande mágica, posso proteger minha riqueza financeira em dólar,
sem comprar uma réstia da moeda americana. Mandrake!
Cinco contratos de dólar futuro é o mínimo
exigido pela Bolsa de Futuros, cada um tem um valor de 50 mil dólares.
O economista não entendeu, mas é dólar, as
verdinhas?
– Não, prezado cliente, é uma promessa futura
de dólar, você compra ou vende apenas o direito do preço futuro do dólar, mas
em reais. Num prazo determinado, você escolhe, a cada fim de mês, vence o
contrato, durante o prazo de vigência há um fluxo diário de débito e crédito em
reais conforme a variação do real em relação ao dólar diariamente. Posso
vender, comprar, mudar de posição a hora que eu bem entender! Afinal, nossos
estáticos economistas ainda vivem a ilusão de que isso tem sempre conexão com o
fluxo no dólar spot (as verdes). Mandrake, mágica, esses coelhos são infinitos!
Nossos economistas não entendem de
derivativos, não sabem para que servem, acham que não têm importância na
determinação de preços de commodities, moedas e taxas de juro. Já tentamos
explicar, como hoje, mas não entendem! Os modelos que usam,não têm o dinheiro
em sua roupagem mais abstrata, nem mercado futuro, acredita? Mandrake.
Explicamos várias vezes, que o volume mundial
negociado de derivativos é em torno de oito a dez vezes maior que o PIB
mundial. E que o preço da soja pode subir ou cair independentemente da demanda
do mercado, basta a turma aqui no restaurante decidir “vamos apostar na soja…”,
os economistas retrucam, mas isso é irracional. Respondemos que é a realidade,
o futuro comanda o presente. Eles ficam crédulos, ficam falando dos livros de
financeirização, anomalia do sistema, estão fora do menu principal. Que o que importa
é ganhar dinheiro… Eles continuam achando que é truque de Mandrake, ilusão.
No livro Avenças e Desavenças da Economia,
cuidamos dos truques de Mandrake. O repertório de ilusões despertou a senhora
“Financeirização”, que passou a circular com ares de grã-fina elegante nos
bailes em que se exibem as celebridades do nosso tempo. A dama Financeirização
está sempre acompanhada de seu fiel companheiro, o Senhor Neoliberalismo, e
da comadre inquieta, Dona Globalização.
O neoliberalismo condenou os Estados
nacionais e seus cidadãos à pena da austeridade perpétua
A trinca dança ao som dos acordes e batuques
da orchestra “Capitalismo Contemporâneo”. Os críticos dividem-se entre
simpáticos e detratores, uns e outros exibindo laivos de moralismo que turbam a
avaliação do desempenho dos dançarinos.
É mister reconhecer que muitos observadores
dos rodopios um tanto abruptos da Senhora Financeirização tiveram a ventura de
viver ou estudar os passos suaves e elegantes das dançarinas do Bem-Estar, que
por 30 anos ofereceram seus talentos à fruição de mulheres e homens de seu
tempo.
Até o fim dos anos 1970, dizem, a orchestra
Capitalismo tocava os acordes do desenvolvimento econômico e a turma deslizava
nas pistas do bem-estar social e do pleno emprego, esse último abrigado,
sobretudo, nas casamatas do fordismo industrial. Nas beiradas da pista estavam
os vigilantes da Repressão Financeira, dispostos a impedir escorregões
provocados por passos abusivos.
Ao acompanhar os passos de Madame
Financeirização e do Senhor Neoliberalismo, Dona Globalização encurralou as
alternativas de desenvolvimento nacional, obrigando governos a orientar suas
políticas econômicas em resposta aos agouros e trepidações dos fluxos de
capitais. O crescente poder de Madame Financeirização sobre as decisões de
investimento e alocação da riqueza alterou radicalmente o comportamento da
Grande Empresa, que ficou refém das expectativas de valorização patrimonial sob
o comando de bancos, fundos de pensão, fundos de investimento e tutti quanti.
Finalmente, o Senhor Neoliberalismo capturou os Estados Nacionais, condenando
as sociedades e seus cidadãos às penas e obrigações da austeridade perpétua.
Os jeitos, trejeitos e maus jeitos da Senhora
Financeirização nos incitam a investigar sua genética e assim evitar
considerações apressadas ao seu modo de ser.
Os truques de Mandrake realizam a “natureza
peculiar do dinheiro”, como Marx explica em suas investigações:
“…evidencia-se de novo na separação do negócio de dinheiro do comércio propriamente dito. Vemos, portanto, como é imanente ao dinheiro realizar suas finalidades à medida que simultaneamente as nega; se autonomizar em relação às mercadorias; de meio, devir, fim; realizar o valor de troca das mercadorias ao se separar dele; facilitar a troca ao cindi-la; superar as dificuldades da troca imediata de mercadorias ao generalizá-las; autonomizar a troca em relação aos produtores na mesma medida em que os produtores devêm dependentes da troca”.
Publicado na edição n° 1332 de CartaCapital, em 16 de outubro de 2024.
2 comentários:
Excelente, brilhante! "O futuro comanda o presente", isto é, as apostas econômicas no futuro e os papagaios do mercado na mídia decidem como vivemos hoje e o que os governos devem/podem fazer. Ou seja, "tá tudo dominado". Parabéns aos autores, e ao blog por divulgar o trabalho deles.
Beluzzo é um tremendo Farsante da Politica e Filho de Putin. Logo, ao quadrado. Apoiou Lula e Dilmá e seu mundo é Campinas. Não vale nada. MAM
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