Folha de S. Paulo
Obra-prima de Scott Fitzgerald dá pistas para
entender o caminho dos EUA até o buraco
"O Grande Gatsby" completou cem
anos outro dia —10 de abril para ser exato— e continua como se tivesse chegado
às livrarias nesta semana, estalando de contemporaneidade. Um tipo de mágica
que só os verdadeiros clássicos, por resistirem ao tempo, oferecem.
A obra de F. Scott Fitzgerald torna-se uma experiência inédita a cada releitura. O relato da obsessão de Jay Gatsby, gângster disposto a reverter o passado por amor à namorada da juventude, Daisy Buchanan —cuja voz "soava como dinheiro"—, hoje pode dar algumas pistas para compreender a tragédia em curso que é o governo Trump.
O "Gatsby" consegue a proeza de
contar uma história "out of time". O curioso é que, segundo o
escritor Rodrigo Fresán —que aproveitou a data redonda para publicar o ensaio
"El Pequeño Gatsby: Apuntes para la Teoría de una Gran Novela"—, a
palavra tempo aparece 87 vezes no romance e há nele mais de 400 referências
temporais. Sabemos exatamente em que momento do dia ou da noite as ações se
desenrolam. Sobretudo sabemos a quem elas afetam: os ricos, que depois acabam
ferrando os pobres mortais.
Tom Buchanan, o vilão corpulento e agressivo
com quem Daisy está casada, foi comparado a John Kennedy e Bill Clinton.
Mas ele é, assim como o próprio Gatsby, um modelo fiel de Donald Trump.
O Make America Great Again é uma cópia pálida e cafona das festas suntuosas que
o gângster do livro oferece numa tentativa inútil de recompor o passado
perdido.
A época retratada no "Gatsby"
antecede o crash da Bolsa de Nova York, em 1929. Agora, sob Trump, os EUA
aceleram em direção ao desastre. Segundo a revista The Economist, cometem
"o erro econômico mais profundo, prejudicial e desnecessário da era
moderna".
Não se ouve outra coisa no boteco da esquina:
há risco de inflação, recessão e colapso nas cadeias de produção globais. Os
plutocratas da tecnologia que se aliaram a Trump e a classe alta dos EUA são os
primeiros a sentir o baque. Se tivessem lido Scott Fitzgerald, não tomariam o
tombo.
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